Opinião: Entre o discurso e a prática

Qualquer pessoa razoavelmente informada a respeito dos problemas nacionais sabe o que é necessário fazer para tirar o Brasil do marasmo, resolver as questões seculares que atormentam a todos. Na leitura diária dos jornais trata-se, neste quesito, sempre das mesmas coisas: infra-estrutura (transportes, saneamento, eletricidade), educação, criminalidade, corrupção, impunidade e saúde.

Semana passada, esteve em visita ao país o secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson. Falando para uma platéia de empresários em Nova Lima (MG), o figurão disse o que todos estão cansados de saber que precisa ser feito para resolver os problemas nacionais, e numa atitude pretensiosa, afirmou que estaria disposto a “encorajar” as reformas necessárias. Certamente a leitora e o leitor, escolados de tanto ouvir o discurso de nossos políticos, enxergam aí a óbvia declaração vazia, só para constar.

Modificar para melhor as instituições brasileiras significa lutar contra interesses corporativos, cartoriais, lobbies poderosos; combater arcaísmos como o conceito de “direitos adquiridos”; equilibrar a relação entre os políticos e a sociedade, hoje totalmente desfavorável a esta, e quase infinitas outras ações. É até um truísmo dizer que mudar este País é tarefa para várias gerações.

Reformas mesmo, só na direção oposta: agindo em benefício próprio, os deputados estaduais de Minas Gerais travam uma batalha na Assembléia Legislativa por causa do veto ao projeto de lei que impediria os membros do Ministério Público de processá-los. Na Câmara, o deputado Paulo Renato de Souza (PSDB-SP), em lugar de se aliar com o movimento contra a impunidade e a corrupção, propõe a criação de um novo tribunal, só para julgar autoridades com prerrogativa de foro. Com custo estimado em R$100 milhões anuais, a criação desta nova corte vai na contramão da imprescindível e inadiável redução do tamanho do Estado; é a velha saída de jogar a conta para o contribuinte. Atualmente, deputados não podem sequer ser investigados sem autorização da Justiça.

O Partido dos Trabalhadores, quando na oposição, boicotou iniciativas para conferir mais sobriedade ao Estado Brasileiro, e agora, quando o governo Lula resolve melhorar o desempenho de certas áreas da administração federal com um projeto de lei autorizando a criação de fundações públicas de direito privado, é acusado pela atual oposição (PSDB, DEM) de incoerência pelo fato de outrora ter sido contra tais medidas. Como se rever conceitos, evoluir e mudar de idéia fosse pecado.

Na linha do secretário americano, o ministro da Fazenda Guido Mantega disse, em audiência na Câmara, que “a questão tributária atrapalha os investimentos” - e não só estes –, fato mais do que sabido, e acrescentou que o governo está trabalhando numa proposta de reforma tributária. Que reforma é esta se o Executivo federal briga com unhas e dentes pela prorrogação da malsinada Contribuição “Provisória” sobre Movimentações Financeiras (CPMF)?

As pessoas discutem política, muitas vezes de forma apaixonada, quando a massa dos que compõem este universo é um tanto uniforme. No tocante a ações em benefício próprio não há grandes diferenças entre, por exemplo, PT e PSDB. Se o primeiro tenta – e consegue – impedir investigações no Congresso Nacional, o pessoal do PSDB faz o mesmo na Assembléia Legislativa de São Paulo, obstando a CPI da máfia da CDHU.

Como poder político não é algo exclusivo dos que detêm mandato popular, e grupos empresariais, cada vez maiores e mais concentrados, sindicatos e associações o têm de sobra, utilizam-no, é claro, em benefício próprio. O cidadão comum não tem acesso a um parlamentar ou ministro, o representante sindical ou de um conglomerado tem. Eis por que as coisas não mudam.

Luiz Leitão

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