Palestinando: Arte e resistência pelas crianças e vítimas da guerra na Palestina

Palestinando: Arte e resistência pelas crianças e vítimas da guerra na Palestina

 

Nesta entrevista especial ao Pravda Ru, Amyra El Khalili conversa com a ativista social e política Lúcia Skromov sobre o projeto de arte-educação coletivo e interativo Palestinando.

 

Em 11 de abril, a ONU condenou veementemente a campanha militar de Israel em Gaza, alertando para mortes e deslocamentos generalizados de civis, especialmente mulheres e crianças. Segundo Ravina Shamdasani, porta-voz da ONU, entre 18 de março e 9 de abril de 2025, o Escritório de Direitos Humanos da ONU registrou 224 ataques israelenses contra prédios residenciais e campos de deslocados na Faixa de Gaza. Em 36 desses ataques, todas as vítimas fatais eram mulheres e crianças, indicando uma grave situação humanitária.

 

Lúcia Skromov, ativista social e política, ex-presa política durante a ditadura brasileira (1964-1985), refugiada nos anos de chumbo, é professora formada em Psicologia e Letras com carreira em Comunicação e Semiótica. Nesta entrevista, ela explica a concepção e o impacto do projeto Palestinando.

 

Segundo Lúcia, "o nome Palestinando nasce como um neologismo para expressar um movimento contínuo e coletivo de ações que buscam mostrar aos palestinos que eles não estão sós".

 

O "Grupo Pelas Crianças e Vítimas da Guerra na Palestina" atua junto a indivíduos e grupos independentes para denunciar a violência sistemática causada pelo sionismo. Imagens de crianças destroçadas, fraturadas, mutiladas e assassinadas impunemente circulam com a cumplicidade e o silêncio da comunidade internacional, e lamentavelmente ainda depois de 16 meses de genocídio muitos se calam diante desta barbárie, o que reforça a urgência deste trabalho.

 

Lúcia Skromov testemunha que, em contextos onde a tortura e a agressão são estratégias para silenciar e reprimir as ações de resistência, a arte e a palavra com sua capacidade de comunicação universal falam mais alto e tocam fundo em corações e mentes, transcendendo discursos políticos e palanques midiáticos.

 

Entrevista:

 

PRAVDA: O que é o mural Palestinando? O que inspirou você a produzir essa obra?

 

Lúcia Skromov: Eu sempre fiz murais para apoiar lutas revolucionárias, como as de Cuba, Vietnã, Nicarágua, Haiti e pela Reforma Agrária no mundo que dela precisa. Desde cedo desenvolvi a concepção de trabalho coletivo ao perceber que uma mão sozinha não bate palmas. Daí, o meu método de trabalhar em mão dupla. À diferença de outros, os meus murais são apenas desenhados por mim e o público é chamado para preenchê-lo. É, pois, um trabalho que envolve todos os que dele se cercam.

O Palestinando é fruto da vontade de espalhar a compreensão da Causa Palestina. É uma tentativa de atrair a atenção do indivíduo ou do coletivo que não tem acesso a explicações claras e coerentes sobre a razão dessa tragédia que perdura por mais de um século. A intenção é atingir o ser humano, homens e mulheres, simples e comuns e fazê-los perceber que o que lhes foi e é passado nada mais é que um acúmulo de mentiras por uma mídia comprometida com o sionismo, que tenta acobertar uma barbárie que, à diferença dos atos nazistas, é cometida a céu aberto. Busco mostrar também o avesso do Estado Sionista, revelando que há mais criminosos por metro quadrado em "Israel" do que em qualquer complexo criminal do Brasil.

 

PRAVDA: Como participar e interagir com o mural Palestinando?

 

Lúcia Skromov: O mural possui uma natureza itinerante, portanto, é preciso segui-lo por onde anda. Ora está nos atos de rua em defesa da Palestina, dependurado em árvores ou em postes de iluminação, ora está em eventos para os quais é convidado, e ora se convida para se apresentar. Esses lugares costumam ser bares, restaurantes, centros culturais que apoiam a Causa, escolas onde professores são simpáticos à Resistência e até o usam para situar a história e lugar geopolítico da Palestina. Também ele está sendo convidado por associações de diversas naturezas (feministas, anticapitalistas e antirracistas), ocupações, sindicatos e coletivos.

 

O mural costuma estar disponível em dias de comemorações e de projeção de filmes no bar-restaurante Al Janiah em São Paulo, o anfitrião do Mural. Basta acompanhar a programação no instagram* desse bar-restaurante e centro cultural para se inteirar de sua presença e/ou levar também o mural para suas atividades com uma agenda pré estabelecida em parceria com o Projeto Palestinando.

 

PRAVDA: Como está a recepção e reação do público ao mural Palestinando?

 

Lúcia Skromov: A recepção é inegavelmente cordial e acompanhada de grande curiosidade para, em seguida, dar lugar a uma reação curiosa que, no geral, pode ser qualificada como admiração ou espanto. Diante do Mapa Mundi, abre-se um processo de detalhamento de todas as fases que constituem o mural, com os continentes e suas nações a serem reconhecidas por seus símbolos, como bandeiras, brasões e vestimentas.

 

Evidentemente, o perfil do público muda conforme o local e, com ele, mudam as reações, que terão nuances diferentes entre si. Uns se identificam com países que possuem figuras notórias, as quais admiram; outros, mais com as nações de sua ascendência. Como o Brasil é multirracial, abre-se um leque de escolhas. Durante o processo de preenchimento, ocorrem comportamentos curiosos: há os que não querem largar o pincel, pois não se contentam com pintar só um pouco para dar lugar a outros, e outros tantos têm que ser dissuadidos, porque querem deixar a sua ‘marca’ fazendo seu próprio desenho no mural. Até o momento, a maioria dos que foram chamados a participar aceitaram. A minoria queixou-se de falta de tempo, pressa, mas não descartaria em outra ocasião.

 

PRAVDA: Qual é a missão do Mural Palestinando e para onde será enviado?

 

Lúcia Skromov: O nome do mural representa a sua missão. A origem do nome Palestinando está ligada à idealização de um projeto de ações, daí, a criação do neologismo verbal que, flexionado no gerúndio, quer significar um movimento contínuo de ações a serem construídas para que os palestinos concluam que “Não estão sós”. O "Grupo Pelas Crianças e Vítimas da Guerra na Palestina" se une com indivíduos e grupos independentes para dar corpo à apresentação de Coral, de performances, danças, de músicas, poemas e mesmo dramatizações e o mural é parte dessa lida. Cada um que é convidado a se integrar nesse projeto acaba palestinando, o que vem a significar que se torna sujeito da ação de palestinar ou agir pela e para a Palestina. Todos são fotogrados em ação e assinam um livro de registro, cujo nome é Kitab alfath ( كتاب الفتح), que será encaminhado à Gaza, quando do término do mural e, quem sabe, da missão a que se propôs.

 

PRAVDA: Como as crianças e adolescentes reagem ao interagir com o mural?

 

Lúcia Skromov: As crianças e jovens, independentemente de classe, são mais diretos no ato da escolha do desenho a ser preenchido. Optam por colorir a figura que lhes chamou a atenção ou pelo tamanho ou pela beleza. Nas escolas, o jovem prefere escolher os barquinhos que navegam livremente pelos mares e oceanos. As crianças e os jovens palestinam por natureza: são ágeis.

 

PRAVDA: Qual é o papel da comunicação e da arte na resistência palestina, na sua experiência?

 

Lúcia Skromov: A comunicação em toda a sua extensão e durante todo o seu processar se dá de forma a sempre levar o indivíduo a pensar, mesmo se estiver baseada na manipulação – que se dá quando as informações são usadas para reescrever o passado com o objetivo de apagá-lo na busca de controle do futuro. Já nas lutas transformadoras por um mundo igualitário, onde caibam todos, as informações correm o risco de sofrer impedimentos e restrições. Há exemplos históricos que mostram que qualquer narrador pode ser morto por força de sua narrativa.

 

Para evitar as catástrofes, o recurso mais usado para driblar ataques e oferecer informação é a arte. A arte como recurso de comunicação é privilegiada em toda a sua expressão.

 

Não há como ignorar que o estágio do signo que mais desperta sensações (feelings) é o ícone e qualquer expressão artística está repleta de signos icônicos a serem desvendados e decodificados, a ponto de fazer o indivíduo compreender profundamente as suas e as emoções de outros. Para além da racionalidade e de conceitos intelectuais, a arte faz o indivíduo perceber de forma intuitiva o que não foi dito, o que está implícito nas situações cotidianas.

 

Nesses momentos, o relacionamento do indivíduo com o mundo e os acontecimentos ao seu redor se altera e é repensado através da sensibilidade que nele foi despertada. Uma vez despertada, há uma interação entre as experiências acumuladas e os sentimentos que as envolvem que irão alargar a visão dos fatos e gerar um entendimento daquilo que está sendo vivenciado. O resultado produzido é a descoberta do significado, que faz com que o ser sensível tome partido ou rejeite de imediato o que considera acerto ou erro.

 

No caso da Resistência Palestina, a arte continua tendo um papel basilar, uma vez que, na cultura árabe, a escrita por si só, já uma obra de arte e os grupos, braços armados ou não, utilizam-na nas cores que elegeram para sua identificação e que caracterizam sua filosofia política. São ícones, em última instância, que transmitem informações, permitindo a comunicação entre as partes que se querem envolvidas.

 

Como semioticista, utilizei do método dialético na composição do Mural Palestinando. O grande público se depara com bandeiras da Palestina e bandeiras nacionais dos países entrelaçadas com as da Palestinas em todos os continentes. Os olhos tropeçam nas cores da Palestina. Mesmo quando são utilizadas outras cores, na somatória, destacam-se as simbologias da Palestina. No mural, a profusão de cores contempladas pela nação palestina faz com que ela exista aos olhos do mundo. As cores da bandeira palestina se tornaram tão visíveis ao mundo, que o Zé da Esquina sabe reconhecê-la e, se convidado a participar do mural, em aceitando, consegue pintar de olhos fechados o seu formato descomplicado.

 

O método dialético concorreu para que indivíduos abraçassem a luta dos palestinos. Adentraram o mural, sentiram-se parte dessa luta ao pintarem um pedacinho daquele mundo e criaram uma cumplicidade inegável. Todos foram elevados ao máximo de sua capacidade de percepção, para uma maior compreensão do que vem a ser a Causa Palestina. Com o mundo todo se dirigindo à Gaza, contra o genocídio, o mural destacou a Palestina e decretou a morte visual do Estado Sionista.

 

* Para acompanhar a programação e interagir com o mural Palestinando, siga o bar-restaurante e centro cultural Al Janiah no Instagram: https://www.instagram.com/aljaniah_oficial/

 

Amyra El Khalili é professora economista palestino-brasileira e editora das redes Movimento Mulheres pela Paz na Palestina e Aliança RECOs – Aliança de Redes de Cooperação Comunitária desde o Sul Global.

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Author`s name Amyra El Khalili

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