A mulher é parte do gênero humano, que como mamífero é um ser biologicamente dimórfico, cuja característica essencial é ser social. A divisão sexual do trabalho se origina da natureza. A política, no entanto, tem como condição a existência de uma divisão social do trabalho e a existência do Estado. A divisão sexual do trabalho passa a ser subsumida pela divisão social do trabalho e a mulher que colaborava como homem na reprodução social, passa a ser explorada e oprimida.
Isso se passa quando os cultos da fertilidade e da mãe terra são substituídos pelo domínio das divindades masculinas e celestiais. É como ser oprimido e explorado que a mulher faz política, do lugar a que foi relegada e com os meios que lhe é próprio, como ser dotado de sensibilidade especifica, como ser mulher enfim.
Nas formas sociais escravistas o poder se organizava a partir do homem que defendia o espaço comunitário, como guerreiro, agricultor, varão, em torno do qual se formava uma família grande, que nem sempre considerava os laços de sangue efetivos. A mulher não participava nos assuntos da comunidade, seu lugar era o lar e o mundo das sombras. Assim, a forma de resistir à marginalização da vida pública era a perfídia ou a capacidade de influenciar o homem de poder. Não era muito diferente a condição feminina na época feudal e mesmo em lugares, como o Brasil, nos quais as condições escravistas e feudais foram reinventadas, o lugar da mulher permanece nessa situação, sempre justificada pela ideologia religiosa, que a rebeldia contra a opressão criava justificativas pra a punição, como a identificação com a bruxaria.
O surgimento do capitalismo, a menos de três séculos, gerou uma mudança na condição feminina, possivelmente para pior. A mulher, assim como seus filhos, passou a ser propriedade privada do homem, cerne do poder na família nuclear e fiador da permanência da propriedade privada por meio da herança. Essa situação passou a valer tanto na família dos proprietários como dos proletários, pois esses, apesar de não terem posses, contavam com os filhos e com sua força de trabalho.
O capitalismo criou também a necessidade da representação política dos homens proprietários. Exatamente por serem proprietários somente homens participavam da representação política, somente os homens viviam a esfera pública e as mulheres eram apenas uma parte da esfera privada do homem, da esfera da sua propriedade privada. A secular luta da mulher pelo direito de sufrágio e de participação na esfera da representação política foi o enorme esforço para participar no mundo dos homens, no mundo da cidadania capitalista.
Mas o próprio capitalismo precisou da mulher fora do mundo privativo do homem, pois houve a necessidade da força de trabalho da mulher e da mulher como consumidora de mercadorias. Essa necessidade do capitalismo deu novo ímpeto a luta das mulheres por direitos universais e específicos e, portanto, pela participação maior na vida pública e política, esfera masculina por excelência.
Qual a conclusão dessa sintética exposição? Muito simples: a libertação da mulher só pode ocorre no processo de emancipação do gênero humano como um todo de todas as formas de alienação, que tem seu fundamento na exploração do trabalho, mas se expressam como política, representação, esfera pública. A mulher pode até vir a conseguir espaços significativos na esfera pública e da representação política, mas não é esse o caminho da sua emancipação, que só pode ser alcançada com o fim das relações de apropriação privada da riqueza social, com o fim do capitalismo.
Marcos Del Roio
Prof. de Ciências Políticas da UNESP - FFC
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