Economia e política: Faces opostas do governo Temer
Ao contemplarmos o desempenho atual da economia brasileira é preciso tomar em conta algumas perspectivas que estão na raiz de tal comportamento, perspectivas estas que não se confundem e devem suas origens a causas distintas.
Iraci del Nero da Costa *
Ao contemplarmos o desempenho atual da economia brasileira é preciso tomar em conta algumas perspectivas que estão na raiz de tal comportamento, perspectivas estas que não se confundem e devem suas origens a causas distintas. Assim, a queda da inflação, positiva por si só, decorre, em grande parte, do retraimento da demanda motivada pela elevada taxa de desemprego e pelas ações restritivas adotadas pelas famílias que se viram largamente endividadas e demonstraram receio de serem atingidas pelo desemprego. A tais elementos deve-se acrescentar o ótimo comportamento de nossa produção agrícola que tem alcançado expressivos acréscimos na oferta de vários produtos de largo consumo doméstico.
Estes fatos, aliados à recessão observada nos últimos anos, estão na base do correto corte da taxa de juros adotado pelo Comitê de Política Monetária, subordinado ao Banco Central do Brasil e responsável pelo estabelecimento de nossa taxa básica de juros. Esta é uma das deliberações corretas implementadas pelos órgãos governamentais responsáveis pela condução de vários componentes da economia do país. Como avançado, estamos a vivenciar a conjugação de eventos cuja origem é diversa mas que têm convergido para a esperada superação de nossos entraves econômicos.
Destarte, a consequência palpável dessas ocorrências consubstancia-se no efetivo arrefecimento da recessão e na concreta perspectiva de recuperação, ainda que modesta, de nossa economia nos próximos meses.
Estas verificações de feições concretas têm sido complementadas por propostas governamentais - efetivamente positivas e cujos conteúdos referem-se à política econômica - encaminhadas ao Poder Legislativo. Dentre elas cumpre ressaltar o Ajuste Fiscal, a necessária e dolorosa Reforma da Previdência e a imprescindível Reforma Trabalhista. Ademais, o Governo Federal pretende regulamentar a venda de terra para estrangeiros e alterar normas no setor do petróleo. A tais projetos podemos acrescentar providências que já estão em curso, dentre elas ressaltam a chamada "liberação do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço)" - ou seja, todo trabalhador que pediu demissão ou teve seu contrato de trabalho finalizado por justa causa até 31/12/2015 tem o direito ao saque das contas inativas de FGTS - e a resolução concernente à retomada da "repatriação de recursos", vale dizer: pessoas (exclusive políticos e seus parentes) ou empresas que tiverem dinheiro não declarado no exterior poderão efetuar sua repatriação mediante pagamento de imposto e de multa com desconto resolvendo desta forma suas pendências com o fisco.
Ainda no campo econômico cabe uma relevante ressalva, pois o presidente ocupou-se com aumentos de honorários a determinados segmentos de servidores que ocupam cargos públicos num momento em que se deve esperar uma estrita restrição dos gastos federais.
Já no contexto especificamente político nos deparamos com um panorama absolutamente distinto daquele vigorante na esfera econômica acima reportada.
Assim, contrastando com os aludidos avanços reais da vida econômica nacional observamos três gravíssimos erros estritamente políticos perpetrados pelo governo do presidente Michel Temer. Se não vejamos.
1. O Governo Federal não tem conseguido, nem se empenhado, em esclarecer a massa populacional sobre suas propostas de reformas encaminhadas ao Poder Legislativo.
Caberia ao presidente da República, sem rebuços, dirigir-se diretamente à população a fim de relatar de maneira clara o conteúdo de cada uma das aludidas reformas ressaltando suas eventuais mazelas a alguns e suas potenciais virtudes quando considerado o futuro de nossa vida econômica e o conjunto global da população brasileira.
Sem serem devidamente informados os populares, com razão, sentir-se-ão enganados pelo governo e profundamente golpeados em seus desejos e interesses.
2. Michel Temer, como muitos de seus execráveis antecessores, verga-se aos ditames de Partidos Políticos de todas cores e aos interesses, por via de regra escusos, de políticos cujos laços com a população e suas necessidades prementes e sempre repassadas para segundo plano inexistem; agindo dessa forma o presidente pretende ver aprovadas suas propostas encaminhadas ao Poder Legislativo. A esta altura é imperioso termos presente que muitos políticos preocupam-se com a continuidade das investigações e decisões da Operação Lava Jato e ficariam satisfeitos se tal operação fosse barrada.
Aqui, mais uma vez, verifica-se a ausência de um apelo dirigido diretamente ao eleitorado no sentido de pressionar partidos e políticos de sorte a obrigar tais elementos de nossa vida política a aprovarem, sem a busca de recompensas, as normas legais necessárias ao pleno desenvolvimento nacional e ao atendimento das carências de nossa população.
3. Cumpre, por fim, lembrar as nomeações de ministros e demais auxiliares governamentais bem como a recente indicação de um nome para compor o Supremo Tribunal Federal (STF).
Como visto, o comportamento do presidente é orientado para escolhas as quais, em geral, deparam-se com restrições que impõem demissões ou ferem os desígnios explicitados pelo próprio presidente. Nesta área o exemplo maior está na indicação de um de seus ministros para ocupar uma cadeira do STF; como sabido, rompeu-se aqui com as próprias palavras do presidente ao caracterizar como seria sua escolha e desobedeceu-se as opiniões do indicado explicitadas em sua tese de doutoramento; constatação esta que desde logo o desqualificam para o alto cargo que deseja ocupar mesmo que para tanto seja obrigado a desprender-se de suas postulações anteriores.
Enfim, nos defrontamos com uma Presidência da República responsável pela adoção de diretrizes salutares e promissoras no plano econômico, mas totalmente desregrada e desmoralizada quanto se trata, estritamente, da vida política nacional. Essa contradição - um verdadeiro conflito entre duas posturas totalmente contrastantes -, a nosso juízo, acarretará, na medida em que demorarem a amadurecer as soluções implementadas no âmbito econômico, uma profunda repulsa e oposição popular ao atual presidente da República.
* Professor Livre-docente aposentado da Universidade de São Paulo.
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