Milton Lourenço (*)
Com o avanço competitivo da China no mercado global, Estados Unidos (EUA) e União Europeia (UE) decidiram deixar para trás algumas divergências históricas e discutem um tratado que tem por objetivo principal eliminar barreiras para a circulação de bens e serviços entre os dois blocos. Não é preciso ser especialista em comércio exterior para concluir que, para o Brasil, esse acordo acena com perspectivas sombrias, pois, se quiser colocar seus produtos nesses dois blocos, terá de se adequar a padrões que, com certeza, não favorecerão a competitividade de nossos produtos.
E como juntos EUA e UE representam, praticamente, a metade do produto mundial bruto, isso equivale a ficar de fora da maior zona de comércio do planeta ou se adaptar às normas e imposições que serão estabelecidas para aquelas nações que não gozarão de nenhuma preferência. Ou seja: é adaptar-se ou morrer.
Seja como for, a verdade é que o Brasil, nos últimos anos, não soube construir parcerias sólidas e duradouras com mercados de peso no mundo. Há dez anos, o governo brasileiro trabalhou decisivamente para levar a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) ao fracasso no modelo proposto pelo ex-presidente George W. Bush e ainda comemorou o fato como se fosse um grande feito. Resultado: enquanto a China tratou de esquecer divergências ideológicas para vender àquele país cada vez mais, o comércio exterior brasileiro com os EUA foi reduzido a menos da metade do que era na década de 1990.
O que sobrou? Sobrou apenas o Mercosul, um bloco que está longe dos horizontes idealizados há 22 anos, quando da assinatura do Tratado de Assunção. Hoje, o Mercosul aparece em franca decadência, pois, se em 1998 absorveu 17,4% das exportações brasileiras, hoje absorve menos de 10%. E a tendência é de um retrocesso ainda maior.
O comércio entre os países do Mercosul representa cerca de 12% das exportações totais dessas nações, o que é uma média muito baixa, se comparada com a registrada na UE, de 65%, e no Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta), de 70%. É que a Argentina, por exemplo, passou a trocar o Brasil pela China e outros parceiros que julgou mais interessantes. E continuou a impor barreiras à entrada de produtos estrangeiros, em especial brasileiros, sempre que razões de política interna recomendavam a medida. Quer dizer: se união aduaneira implica responsabilidades e direitos recíprocos, entre os quais a livre circulação de mercadorias, o Mercosul já perdeu sua essência há muito tempo.
O Mercosul, porém, serviu, ao menos como pretexto, para impedir que o Brasil, ao contrário de Chile e México, assinasse isoladamente acordos de livre comércio com outros países e blocos. O resultado é que, nos últimos tempos, o País assinou apenas três acordos de preferências tarifárias com mercados pouco expressivos: Índia, Israel e Palestina. Já as negociações do Mercosul com a UE, depois de muitas rodadas, voltaram à estaca zero, depois que as concessões oferecidas foram consideradas insuficientes por ambos os lados. Afinal, como oferecer concessões aos europeus se não há livre comércio nem entre Brasil e Argentina?
De tudo isso, o que se conclui é que o Brasil precisa urgentemente repensar o lugar que quer no concerto das nações, sob o risco de ser atropelado pelas transformações que estão acontecendo em vários lugares do planeta.
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(*) Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC). E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br
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