José Dirceu: As calúnias de Veja

A revista Veja desta semana publica mais uma de suas matérias caluniosas e ofensivas à minha honra e à minha imagem. Para dar ao leitor a impressão de que a matéria é verdadeira, mistura fatos reais com mentiras. Sonega informações, como as que eu mesmo dei em entrevista à revista na quinta-feira, desqualifica minha vida profissional, imiscui-se em minha vida familiar e privada. O objetivo é claro: combater-me politicamente, destruir minha vida profissional, desconstruir minha história, prejudicar minha vida pessoal. A revista quer manter sua campanha contra mim e mostrar que tinha razão em me transformar do dia para a noite em bandido e chefe de quadrilha.


Para a revista, não basta eu ter sido cassado injustamente e acusado sem provas. Não basta eu ter perdido o mandato e ficado inelegível. Veja não se conforma por eu ter retomado minha atividade política e ter construído uma vida profissional para assegurar o sustento de meus filhos e o meu. Sempre trabalhei na vida. Como disse à revista, que não publicou minhas respostas e negativas diante de mentiras, fui office-boy, almoxarife, arquivista, atendente, auxiliar de contabilidade, coordenador de escritório, assessor jurídico, assessor parlamentar. Na década de 70 tive uma alfaiataria, uma loja de confecções e uma pequena fábrica de confecções. Nunca deixei de trabalhar e de me sustentar, inclusive em Cuba, onde vivi exilado.


Hoje tenho um escritório de advocacia. Há vinte anos sou advogado, com muito orgulho. Em 1980, quando voltei da clandestinidade, matriculei-me na PUC de São Paulo e, trabalhando e estudando, terminei meu curso de Direito, tendo prestado o Exame da Ordem dos Advogados do Brasil em 1985.


Sou também consultor de empresas, como tantos profissionais sérios e respeitados no país. Afinal, me qualifiquei para isso. Disciplinado, ao longo da minha vida profissional e política, estudei muito, li muito, conversei muito, viajei bastante. Conheço bem a realidade do Brasil e seus problemas, assim como sou um estudioso da América Latina, de seus países e relações. Em muitos deles, construí relações políticas e profissionais. Portanto, é natural que seja convidado a dar palestras e consultorias. Mas cita indiscriminadamente empresas e empresários a quem não dei e não dou consultoria, como se fossem meus clientes.


Além de me combater no campo político e de defender minha injusta cassação, Veja quer inviabilizar minhas atividades profissionais legítimas e legais. Há pouco tempo, a revista publicou matéria de duas páginas para impedir uma palestra minha no Banco Credit Suisse. Falou de problemas desse banco com a justiça só para intimidar empresas que me convidavam para dar palestras - o que conseguiu, pois as empresas têm medo de sofrerem acusações na revista caso me contratem, e todos sabem que, para Veja, acusações não precisam ser baseadas na verdade.
Veja não se conforma porque, apesar de tudo que fez comigo, eu reconstruí minha vida profissional e retomei minha vida política, recebendo o reconhecimento de pessoas que não aceitam as injustiças. Veja calunia e ofende porque é impossível apagar meus quarenta anos de vida pública e o fato de que nada foi provado contra mim até hoje.


Veja e outras publicações escondem de seus leitores que houve a retratação em juízo do irmão de Celso Daniel, que não fui citado judicialmente no caso Waldomiro Diniz, que nada provaram contra mim em nenhuma investigação, apesar da quebra de meus sigilos telefônico, fiscal e bancário.
Veja também esconde que em toda minha vida nunca fui processado por qualquer crime, a não ser - o que me honra - na época da ditadura militar, quando fui preso, banido do país e tive a nacionalidade brasileira cassada, sendo obrigado por duas vezes a entrar clandestinamente na minha pátria.


Segundo a matéria, freqüento o restaurante Massimo. Poderia freqüentá-lo, mas é mentira. A ultima vez em que estive lá, das poucas que fui e como convidado, foi há anos, com Marco Aurélio Garcia, para uma conversa com Elio Gaspari. Veja quer insinuar que levo um nível de vida elevado, diz que tenho ganhos pessoais de 150 mil reais, querendo enganar deliberadamente seus leitores, ao confundir faturamento com rendimento. Meus escritórios de advocacia e de consultoria podem até faturar isso, mas têm que cobrir suas despesas, como os salários dos funcionários, aluguel, impostos, etc. Logo, meu pró-labore e minha participação nos lucros não serão nunca maior do que 15% desse valor.


Mas fica a idéia caluniosa que estou me enriquecendo ilicitamente, fazendo lobby. Para isso a matéria fala, sem publicar o que contei ao repórter, de um almoço meu com Guilherme Lacerda, meu amigo e companheiro há mais de 25 anos, e um empresário do setor de transporte ferroviário. Disse ao repórter que não trabalho para concessionárias de serviços públicos, mas ele desconheceu e publicou o contrário.


A matéria invade criminosamente minha privacidade, com mentiras, falsidades e querendo induzir o leitor a fazer juízos contrários a mim. Faz, por exemplo, uma referência sobre minha vida clandestina no Paraná de forma a levar o leitor à idéia de que enganei minha esposa ao não revelar a ela minha real identidade. Na verdade, eu protegi sua vida e, ainda hoje, a tenho como amiga e conselheira. Com ela tenho uma relação afetiva e humana, apesar dos mais de 25 anos de separação. Tanto que passei o final do ano em sua companhia, de nosso filho, minha filha e nossa neta.


Mas o objetivo da revista é atingir minha imagem e destruir o que tenho de mais sagrado, minha vida e minha luta, mostrar-me como um monstro que trai sua própria mulher.


Veja mente sobre vários fatos e insiste na mentira mesmo quando ouve a verdade de entrevistados. Desconhece o que é dito para fortalecer suas versões interesseiras. Há muito tempo o que se diz nos meios jornalísticos é que se os fatos não confirmam as teses dos editores de Veja, azar dos fatos.


É inominável o que Veja fez com minha vida privada e não tenho palavras para descrever minha indignação e revolta, mas acredito que fica o alerta para o perigo que representa esta revista para a democracia e para a liberdade de imprensa, por ela violadas semanalmente ao não reconhecer e a negar os direitos individuais daqueles que procura atacar e destruir.


O desrespeito de Veja pelos princípios democráticos, pela liberdade de imprensa e pela ética do jornalismo é tão forte que a revista sequer dá aos agredidos e ofendidos o direito de resposta. Não publica suas cartas ou corta trechos arbitrariamente, suprimindo o que não convêm a seus propósitos.


Para mim só há o caminho da justiça, ao qual já recorri - tenho uma audiência no dia 19 num processo que movo contra um de seus jornalistas - - e ao qual recorrerei quantas vezes for necessário.


Por fim, Veja fala de minha anistia, sobre os apoios que tenho no PT e, pasmem, sobre uma candidatura minha à Presidência da República em 2010. É verdade que tenho o apoio e o apreço da imensa maioria dos petistas em todo nosso Brasil. Também é verdade que a campanha em apoio à minha anistia ainda não começou, mas não pelas razões elencadas por Veja; simplesmente, porque ainda não é hora de deflagrá-la. E não será Veja que determinará esse momento e muito menos minhas decisões políticas e dos que me apóiam em todo país.


A absurda referência a uma pretensa intenção minha de disputar a Presidência da República desmascara e desmoraliza toda a matéria da Veja.


A matéria caluniosa e desrespeitosa com a minha honra e a de todos os citados mostra o caráter policial e repressivo que assumiu esse tipo de jornalismo pretensamente investigativo, mas que, na verdade, é instrumento de posições político-ideológicas e de interesses econômicos. Não fui julgado, sequer fui processado, mas a revista Veja já me condena. Citando Ivan Lessa, diz que o Brasil esquece tudo a cada quinze anos. Ou seja, já fui condenado pela Veja e, agora, aposto no esquecimento.


Não é o meu caso. Quero ser julgado pelos tribunais, não quero impunidade ou prescrição. Já disse e repito: tenho direito a lutar pela anistia, fui cassado sem provas e, depois de quase dois anos, nada foi provado contra mim. Ao contrário, a cada investigação sou inocentado.


Quero justiça, e rápida. Não aceito prescrição ou impunidade, vou ser absolvido e recuperar meus direitos.

José Dirceu

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey