Vice-Presidente da COFECON discursa na abertura do Congresso da Ange 2006
Precisamos continuar apoiando todos os Programas de Pós-Graduação em Economia no País, responsáveis que são por importantes pesquisas realizadas, e que fortalecem a graduação, ao mesmo tempo em que contribuem para com a sociedade brasileira.
"Precisamos continuar apoiando todos os Programas de Pós-Graduação em Economia no País, responsáveis que são por importantes pesquisas realizadas, e que fortalecem a graduação, ao mesmo tempo em que contribuem para com a sociedade brasileira.
E, nesse aspecto, cabe destacar a preocupação manifestada pela nossa categoria com a Amazônia, o Meio-Ambiente, a Infra-Estrutura, a Saúde, a Educação, a Habitação, o Emprego e a Cidadania, na Carta dos Economistas da Amazônia e no Projeto Brasil .", destacou o vice-presidente do Conselho Federal de Economia, durante discurso de Abertura do XXI Congresso da ANGE na Universidade Católica de Petrópolis (foto).
A Dimensão Territorial do Desenvolvimento
Na Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OCDE) foi criada uma "divisão de desenvolvimento territorial", em 1994, cujo primeiro trabalho consistiu numa nova delimitação das fronteiras entre rural e urbano e na elaboração de indicadores que permitam compreender as disparidades entre diferentes situações territoriais. "Uma visão territorial do desenvolvimento pode revelar potenciais que, até hoje, o meio rural não revelou à sociedade. Um território representa uma trama de relações com raízes históricas, configurações políticas e identidades que desempenham um papel ainda pouco conhecido no próprio desenvolvimento econômico", afirma em seu artigo o economista Ricardo Abramoy, chefe do Departamento de Economia da USP.
A idéia central é que o território, mais que simples base física para as relações entre indivíduos e empresas, possui um tecido social, uma organização complexa feita por laços que vão muito além de seus atributos naturais e dos custos de transportes e de comunicações. Um território representa uma trama de relações com raízes históricas, configurações políticas e identidades que desempenham um papel ainda pouco conhecido no próprio desenvolvimento econômico . A economia tem prestado bastante atenção aos aspectos temporais (ciclos econômicos) e setoriais (complexos agroindustriais, por exemplo) do desenvolvimento, mas é recente o interesse por sua dimensão territorial ou espacial (von Meyer, 1998).
A dimensão territorial do desenvolvimento vem despertando cada vez mais o interesse dos cientistas sociais. Na Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OCDE) foi criada em 1994 uma "divisão de desenvolvimento territorial" cujo primeiro trabalho consistiu numa nova delimitação das fronteiras entre rural e urbano e na elaboração de indicadores que permitam compreender as disparidades entre diferentes situações territoriais (OCDE, 1994). Vem da Itália o programa de pesquisa mais influente com relação à dimensão territorial do desenvolvimento. Com efeito, já no final dos anos 1970 economistas italianos chamam a atenção para a noção marshalliana de distrito industrial - que ficou, para os economistas, no esquecimento, durante décadas - e discutem a competitividade das empresas e os processos de inovação à luz de conceitos como "redes", "meios inovadores" e "efeitos de proximidades" (Pecqueur, 1995:2). Arnaldo Bagnasco e Carlo Triglia publicam em 1988 um estudo cujo título diz muito sobre a ambição deste programa: "A construção social do mercado: o desafio da terceira Itália". Os mercados - o mesmo se aplica aos territórios - não são entidades dadas de uma vez por todas por qualquer tipo de mão mágica ou de dotação natural. Eles são o resultado de formas específicas de interação social, da capacidade dos indivíduos, das empresas e das organizações locais em promover ligações dinâmicas, capazes de valorizar seus conhecimentos, suas tradições e a confiança que foram capazes, historicamente, de construir (7).
"Industrialização difusa" e "Terceira Itália": estes termos já extrapolam seu país de origem e representam um conjunto variado de experiências de desenvolvimento que se caracterizam por três traços básicos.
Existência, num certo território, de um conjunto diversificado - mas ao mesmo tempo com um forte grau de interação - de empresas de porte familiar, isto é, onde a gestão, a propriedade e o essencial do trabalho vêm da família.
Ambiente de inovações e de troca de informações entre indivíduos e empresas, onde a colaboração é, no mínimo tão importante quanto a própria concorrência.
Integração entre empresas e indivíduos urbanos e rurais: na Itália em particular a tradição de agricultura familiar formou uma base de conhecimentos e de iniciativas fundamental para a formação de um espírito empresarial que explica a modalidade de industrialização hoje marcante em quase 40% do território italiano e que atinge várias outras regiões do mundo (8).
Existe um componente territorial nos processos de criação de novos recursos que a expressão "meios inovadores" sintetiza. "A empresa não é um agente inovador isolado. Ela éparte do meio que a faz agir. O passado dos territórios, sua organização, seus comportamentos coletivos, o consenso que os estrutura são componentes maiores da inovação. Portanto, os comportamentos inovadores não são nacionais, mas dependem de variáveis definidas no plano local ou regional" (Maillot, 1996:256). O que caracteriza os "meios inovadores" não é sua dotação em atributos naturais ou de localização, mas, antes de tudo, a densidade de seu tecido institucional, seu "capital de relações" (Maillot, 1996:257).
Outro exemplo do caráter territorial da inovação tecnológica vem do Vale do Silício na Costa Oeste norte-americana que "desmistifica a idéia de que para a inovação tecnológica na era da informação a localização é sem importância" (Castells, 1996:58). O importante, no processo que fez do Vale do Silício o mais profícuo centro mundial de criação de novas tecnologias foram os "contatos em primeira mão com as novidades" e a "existência de uma comunidade de indústrias na qual as idéias poderiam circular e as pessoas poderiam conversar de modo totalmente contrário ao espírito da competição - ao menos na forma com que ela é entendida na economia convencional de mercado" (Piore, 1998).
Neste sentido, é importante assinalar que "...os sistemas produtivos mais dinâmicos - os que se caracterizam pelas inovações - não emergem de uma racionalidade universal abstrata, mas de racionalidades endógenas e diferenciadas de atores coletivos ligados uns aos outros por suas próprias convenções (9) cuja base é freqüentemente local" (Storper, 1996:117).
Pode parecer estranho evocar processos tão distantes de inovação para se refletir sobre o desenvolvimento rural. O que interessa nestes casos não são os resultados concretos atingidos, mas o processo pelo qual a intensificação das relações sociais localizadas permitiram construir em torno da valorização de certos territórios uma "comunidade de valores e de intenções" (10). O que será produzido e valorizado em cada situação não se pode dizer de antemão, é claro. O importante é que um ambiente de cooperação entre empresas - no sentido da troca de informações, da preocupação comum com a formação dos trabalhadores, com a implantação dos serviços indispensáveis ao seu funcionamento e com a qualidade de vida numa certa região - é uma das bases essenciais para o processo de desenvolvimento.
Hoje existem várias regiões que procuram organizar estas formas cooperativas - que não se opõem evidentemente à concorrência, mas, ao contrário, fornecem um quadro onde os mercados podem funcionar de maneira mais adequada. No Oeste de Santa Catarina, 20 municípios integram o Fórum de Desenvolvimento Regional Integrado, do qual participam ativamente diversas organizações não-governamentais locais. No Sudoeste do Paraná, igualmente, o projeto Nova Itália também tem agregado um conjunto variado de forças voltadas à criação de sinergia entre suas inúmeras organizações de base.
Estas experiências - cujo estudo crítico torna-se urgente em virtude de seu potencial e de sua rápida expansão - têm contribuído para o surgimento da noção de "sistema econômico local" que não significa autarcia ou isolamento, mas, ao contrário abertura de novas oportunidades com base no aperfeiçoamento do tecido institucional de cada região.
Uma visão territorial do desenvolvimento pode revelar potenciais que, até hoje, o meio rural não revelou à sociedade. Visto como a base física da produção agrícola, seu destino dificilmente escapa à tragédia do esvaziamento social, econômico, político e cultural. Quando, entretanto, o meio rural é encarado, não como a simples sustentação geográfica de um setor (a agricultura), mas como base de um conjunto diversificado de atividades e de mercados potenciais, seus horizontes podem ser ampliados. Os fatores específicos em que se apoia - a baixa densidade demográfica, a maior ou menor distância de grandes centros urbanos e a relação com a natureza - não são suficientes para explicar o atraso em que se encontra a maior parte da população que aí vive.
Mais importantes que estes fatores "naturais", são as instituições que não cessam de transmitir aos atores locais a idéia de que o mais curto caminho para a emancipação da pobreza é migrar. Construir novas instituições propícias ao desenvolvimento rural consiste, antes de tudo em fortalecer o capital social dos territórios, muito mais do que em promover o crescimento desta ou daquela atividade econômica. O próprio crescimento urbano recente aumenta a demanda por novos produtos e novos serviços vindos do meio rural. O desafio consiste em dotar as populações vivendo nas áreas rurais das prerrogativas necessárias a que sejam elas os protagonistas centrais da construção dos novos territórios.
Para saber mais sobre o tema:
ABRAMOVAY, Ricardo (2000) - "Funções e medidas da ruralidade no desenvolvimento contemporâneo" - Texto para Discussão n° 702 - IPEA - Rio de Janeiro.
ABRAMOVAY, Ricardo e VEIGA, José Eli (1999) - "Novas instituições para o desenvolvimento rural: o caso do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) - in GUEDES, Vicente G. F. e SILVEIRA, Miguel Ângelo - A agricultura familiar como base do desenvolvimento rural sustentável - EMBRAPA/CNPMA - Jaguariúna - SP.
ABRAMOVAY, Ricardo; BALDISSERA, Ivan Tadeu.; CORTINA, Nelson; FERRARI, Dilvan; SILVESTRO, Milton e TESTA, Vilson Marcos (1998) - Juventude e agricultura familiar: desafios dos novos padrões sucessórios - Chapecó, Brasília - Convênio FAO-INCRA/CPPP-EPAGRI - Edições UNESCO.
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*Chefe do Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (desde agosto de 2004) e Membro efetivo do Conselho Científico do Centre International de Recherches pour l'Agriculture et le Développement - CIRAD (1999-2002 e 2003-2006).
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