Depois da sua adesão ao PSD e a uma perspectiva anti-comunista, Zita Seabra tornou-se uma 'bête noir' para os comunistas portugueses, quer os ditos ortodoxos, quer os ditos renovadores. Mas foi por sua iniciativa, enquanto deputada do PSD que, na passada quinta-feira, a Assembleia da República prestou uma pequena homenagem a Veiga de Oliveira, com um voto de pesar pela sua morte aprovado por unanimidade.
Álvaro Veiga de Oliveira abandonou o ideário comunista, filiou-se no PS e apoiou a candidatura presidencial de Cavaco Silva. Discorde-se, lamente-se, condene-se tais posições políticas. Porém, olhando para toda a vida de Veiga de Oliveira, o que sobressai de mais marcante é sem dúvida o seu corajoso combate na resistência ao fascismo (preso pela PIDE, "durante quinze dias a fio sofreu, sem uma palavra, a tortura do sono enquanto era espancado quase até à morte") e a sua qualificada contribuição para a construção de um regime de liberdade e democracia. E isso fê-lo Veiga de Oliveira enquanto militante comunista. Faz honrosa parte da história e do património do movimento comunista português.
Quinze anos depois do desmoronamento da União Soviética e da pervertida tentativa de construção do socialismo que ali teve lugar, não é admissível que continue a prática estalinista de apagar das fotografias e da história aqueles que a dada altura deixaram de fazer parte do 'partido' - ou mesmo da área comunista. Há ainda que dizer algo sobre as críticas e interrogações que Veiga de Oliveira colocou na fase final da sua militância comunista. Tiveram certamente uma componente de desistência, de abandono de princípios essenciais, de renúncia a um ideal de liberdade igualitária que faz cada vez mais sentido neste mundo actual em que vivemos, marcado por um sério desequilíbrio na luta de classes a favor do grande capital, com crescentes desigualdades e injustiças sociais, guerras e misérias. Mas tiveram também uma componente de coerência e de inteligência face a concepções e práticas erradas que falharam, que mancharam o nome e a credibilidade do ideal comunista. Tais críticas e interrogações deveriam ter recebido uma outra consideração, uma outra atenção, uma outra capacidade de diálogo.
Foi lamentável que nenhum deputado de esquerda tivesse tido a iniciativa de apresentar na Assembleia da República esse pequeno gesto de justiça que foi o voto de pesar pela morte de Álvaro Veiga de Oliveira. Valerá o que vale tal voto, mas é uma forma de reconhecimento, de preservação de memória. E Veiga de Oliveira bem o merece - particularmente no seio da esquerda e entre os comunistas.
Luis de Carvalho
PRAVDA.Ru
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