O Brasil e a livre-concorrência
Milton Lourenço (*)
SÃO PAULO - Tido como uma das nações comercialmente mais fechadas, o Brasil precisa abrir o seu mercado e assinar o maior número possível de acordos de livre-comércio com outros países e blocos porque só dessa maneira conseguirá aumentar a sua participação no comércio internacional, hoje limitada a apenas 1,2% de tudo o que se compra e vende no planeta. O problema, porém, é saber como fazer essa abertura: de supetão, iniciando-se um novo ciclo de redução de tarifas de importação, como se deu ao início da década de 1990, ao tempo do governo Collor, ou de maneira lenta, segura e g radual, para se repetir aqui um axioma famoso na época do regime militar (1964-1985)?
Sabe-se que a equipe que trabalha para organizar o governo que assume a partir de 1º de janeiro de 2019 vem preparando um plano para formatar essa abertura, mas não se conhece detalhes desse estudo. O que se sabe é que existe um estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, encaminhado para a análise pela equipe que procura organizar o futuro governo, que prevê, de imediato, com a abertura comercial, desemprego para cerca de 3 milhões de trabalhadores, que viriam a se somar ao atual contingente de cerca de 13 milhões. Obviamente, esse cenário é alarmante, pois pode levar o País a uma situação de caos social de que já se sente os primeiros sinais.
Com a livre-entrada de produtos estrangeiros no mercado nacional, segundo aquele estudo, prevê-se o fechamento de fábricas, principalmente nos segmentos de couro, vestuário, automóveis, sistemas automotivos e bens de capital, setores que são muitos protegidos por alíquotas altas e benefícios fiscais. Como se sabe, muitos desses setores estão protegidos por imposto de importação de até 35%, que é a alíquota máxima permitida pela Organização Mundial do Comércio (OMC).
Sem essa proteção governamental, esses setores, fatalmente, fechariam as portas por não disporem de preços competitivos para os seus produtos. Com isso, é provável que os desempregados venham a migrar para a informalidade ou para o setor de serviços, o que exigiria por parte do governo um esforço maior para a requalificação profissional dos atingidos. Mas não se pode deixar de reconhecer que uma situação delicada como essa tende a aumentar os níveis de violência social.
É claro que essa é uma situação de difícil solução, mas não se pode deixar de pensar que outros países, que abriram seus mercados, também passaram por essas dificuldades, mas hoje estão entre aquelas nações que mais vendem e compram no mundo. Basta citar como exemplo países como Coréia do Sul, Taiwan, Indonésia e Chile.
Seja como for, não se pode aceitar que a liberalização do mercado seja feita em ritmo acelerado. Até porque a culpa pela falta de competitividade do produto brasileiro não pode ser atribuída aos empresários, mas em grande parte ao chamado custo Brasil - infraestrutura precária, burocracia aduaneira em excesso, carga tributária alta, câmbio defasado -, responsável por 30% do custo de produção nacional.
A abertura comercial também não pode ser feita de maneira unilateral porque só beneficiaria os concorrentes e os riscos seriam enormes, ainda que a longo prazo possam surgir os benefícios da medida. Portanto, só poderá vir por meio de acordos que venham a ser bem negociados, tendo-se o cuidado de se preservar os setores mais sensíveis. Quer dizer, a abertura é necessária, mas é preciso estabelecer limites, pois o excesso de medicamentos também pode levar o paciente à morte.
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(*) Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC). E-mail: [email protected]. Site: www.fiorde.com.br
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