Hora de acordar: Ouro e dólar

Adriano Benayon – 21.09.2009

Ouro e dólar

Faz tempo que advertimos: manter-se atado ao “sistema financeiro internacional” custará caro a todos os povos, e tanto mais caro quanto maior, em cada país, seu entrosamento com esse “sistema” e quanto mais tempo isso dure.

No artigo Derivatives Collapse and the China Gold and Silver Markets - publicado por Global Research, 10.09.2009 – Bob Chapman mostra que o império anglo-norte-americano amarrou dentro de estreita armadilha os países detentores de créditos em dólares, exercendo sobre eles pressão político-militar e/ou enganando e cooptando seus dirigentes políticos.

Entre outros, chineses, japoneses, alemães e árabes. A China, um dos poucos países com poder para retaliar e exigir compensações, foi induzida a não só acumular dólares em quantidade estarrecedora, mas também a fazer apostas erradas nos mercados financeiros, adquirindo títulos - com a obrigação de, no futuro, entregar ouro e prata - derivados de contratos detidos por bancos estrangeiros.

Dada a tendência, cada vez mais clara, à valorização dos metais preciosos, os logrados que ficaram com esses derivativos sofrerão enormes prejuízos, pois, para entregar esses metais, terão de comprá-los a preços mais elevados. Esses contratos, chamados forward, são, na maioria, negociados fora das Bolsas e exigem o cumprimento da obrigação ao final do prazo estabelecido.

Como outros, os chineses demoraram a perceber a dimensão da enrascada em que caíram ao comprar títulos denominados em dólares. Eles vêm, nos últimos meses, procurando vendê-los e comprar ouro e metais preciosos. Além disso, o governo da China está aconselhando seus cidadãos a fazer o mesmo. Ademais, proibiu as exportações de prata.

Ainda mais preocupante para os concentradores anglo-americanos, controladores das finanças mundiais: diante da escalada nos preços dos metais preciosos, o governo chinês fez saber que cogita renegar contratos forward, por força dos quais teria de entregar quantidades volumosas de ouro e prata.

Um dos objetivos dos anglo-americanos ao induzir os chineses e outros a adquirir esses derivativos foi obrigar os detentores de títulos dos EUA a não despejá-los no mercado, pois, se assim o fizerem, farão elevar o preço dos metais preciosos, sofrendo, em conseqüência, vultosos prejuízos.

Em setembro, o ouro voltou a ultrapassar US$ 1.000,00 por onça, apesar das jogadas e pressões dos concentradores financeiros anglo-americanos, coadjuvados por seus satélites europeus, para manter baixo o preço. Nesse contexto, os bancos centrais têm-se desfeito, nos últimos anos, de suas reservas em ouro, o que beneficia adicionalmente os oligarcas, que o têm podido adquirir a preço baixo.

É interessante notar que esses oligarcas, sobre tudo os britânicos, são os maiores detentores do ouro existente no mundo, tanto em cofres de bancos, como em minas de todos os continentes.

Podem-se esperar, portanto, grandes embates no jogo de poder mundial no último trimestre do ano, quando deve ficar desmoralizada a farsa de que a “crise” está terminando.

Novas bolhas vão espocar, como as mencionadas em meus artigos recentes. Só nos EUA, até agora, o Estado gastou com elas US$ 23 trilhões. As emissões monetárias para cobrir os novos rombos certamente farão intensificar a descrença dos fundos soberanos chineses e de outros países em preservar o valor de suas vultosas carteiras de títulos norte-americanos.

Depressão, desemprego e guerra

Com a confirmação, em breve, de que o colapso financeiro mundial e a depressão se aprofundarão, o cenário de confrontação se tornará mais explícito, levando a conflitos armados e/ou a soluções de compromisso entre países dotados de poder real, ou seja, militar - inclusive nuclear -, industrial e tecnológico.

O desemprego, em proporções jamais vistas, acarretará lutas sociais às quais os governos títeres da oligarquia reagirão por meio de repressão e, em parte, de investimentos econômicos e sociais.

Estes, porém, são inviáveis se forem mantidas as atuais moedas e não se cancelar os títulos tóxicos e liquidar os bancos que os detêm. Isso porque a dimensão dos déficits públicos é incontrolável, mesmo sem grandes iniciativas sociais. Mais que isso, elevar, em favor destas, as emissões de moeda, que já são estratosféricas, desencadeará a hiperinflação. A saída clássica, para as poderosas dinastias, é a guerra de grandes proporções.

De qualquer forma, o povo norte-americano é participativo, e os protestos e manifestações já contam com dezenas de milhões de pessoas, embora os grupos estejam, em geral, desorientados e ideologicamente divididos.

O desemprego, altíssimo e crescente, também na Europa, aumentou em mais de 10 milhões nos EUA, nestes dois anos, incluindo os que decidem parar de buscar trabalho, e a cifra segue crescendo a ritmo mensal entre 600.000 e 1 milhão.

A taxa oficial, grandemente manipulada, de quase 10%, mais que dobrou desde 2007. O desemprego que inclui os trabalhadores a título precário e os de tempo reduzido, está perto de 21% da força de trabalho.

A Flórida tornou-se o 19º estado a recorrer a crédito para pagar benefícios sociais. Na Califórnia, onde estão sem emprego 40% das pessoas em idade de trabalhar, o governo, em estado falimentar, cortará, este mês, 140.000 beneficiários.

Brasil

Tenho repetido que os efeitos no Brasil já são graves e que não passa de paliativo a tentativa de elevar os gastos sociais e os investimentos, via BNDES, inclusive elevando, para isso, a dívida pública.

O jogo de poder mundial, sempre pesado, vai sê-lo ainda mais, e para o Brasil é preferível que se prolongue o conflito países com poder real a que eles se entendam.

Para países destituídos de poder, a chance de mudar de rumo depende da desordem no sistema imperial, infinitamente melhor que a ordem mundial pretendida pela oligarquia. São condições favoráveis à organização da sociedade brasileira para se dotar de instituições capazes de a levar a evoluir: 1) o impacto da depressão; 2) o choque causado pela transformação em caos do sistema financeiro internacional; 3) a confrontação entre as potências.

Urge, em suma, para o Brasil, encontrar o rumo da independência, saindo da subserviência em que afunda desde 1954, com o Estado financiando e subsidiando as transnacionais. Elas se tornaram a classe dominante no País, têm tido acesso gratuito às suas fabulosas riquezas naturais e feito esmagar as atividades industriais e tecnológicas dos brasileiros.

* - Adriano Benayon é Doutor em Economia. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”, editora Escrituras. [email protected]

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