Europa de olho no Brasil

Milton Lourenço (*)

SÃO PAULO – Quem participou da última Intermodal South America 2009, realizada em abril, em São Paulo, pôde constatar que, se a crise econômico-financeira mundial afetou muitos mercados, o Brasil não está incluído entre as economias mais atingidas. Pelo menos é o que indica a forte presença de representantes de portos da União Europeia naquela feira, todos de olho no potencial de um país que, embora seja responsável por apenas 1% do mercado global, dispõe de grande capacidade de produção de insumos que podem vir a ser industrializados pelos europeus. Sem contar que, com um mercado de 200 milhões de habitantes – embora uma parte significativa ainda esteja excluída do mercado de consumo –, pode absorver mercadorias de alto valor agregado produzidas no âmbito da UE.

Ao contrário da UE, os EUA só estiveram representados na Intermodal por Houston – o que, pensando bem, não é pouco porque este porto está ligado a 80% do território norte-americano –, ao passo que África, Ásia e Oceania nem enviaram representações, apesar de todos os esforços do Ministério da Indústria, Desenvolvimento e Comércio Exterior (MDIC), nos últimos anos, para diversificar mercados, especialmente em direção ao continente africano.

Já os portos europeus estiveram presentes com estandes, procurando se mostrar cada qual ao exportador brasileiro como a principal porta de entrada na Europa, uma área comum de aproximadamente 500 milhões de habitantes, todos incluídos no mercado de consumo. Entre os muitos terminais europeus presentes, estiveram disputando cargas brasileiras portos da Holanda, França, Alemanha, Bélgica, Espanha e Portugal, que procuram atuar como hub ports, ou seja, centros de distribuição de mercadorias para todo o continente.

Por outro lado, os terminais portuários brasileiros também deram uma demonstração de que não apostam numa crise muito duradora, pois todos fizeram questão de mostrar que continuam a investir em infra-estrutura, certos de que, quando o momento de retração passar, vai faturar quem estiver mais bem preparado e pronto para a retomada da economia mundial.

O Porto de Santos, por exemplo, ao contrário do que previsões mais pessimistas indicavam, movimentou 18,9 milhões de toneladas durante o primeiro quadrimestre do ano, o que representou um crescimento de 4,89% em relação ao mesmo período de 2008, segundo dados do MDIC. Essa evolução deu-se principalmente em razão do incremento das exportações que registraram um crescimento de 21,58% em comparação com o mesmo período do ano passado, resultado de 14,78 milhões de toneladas embarcadas contra 12,16 milhões em 2008.

Os reflexos da crise se fizeram sentir mesmo nas importações que registraram uma queda de 25,46%. No quadrimestre, entraram pelo Porto de Santos apenas 4,98 milhões de toneladas de cargas, enquanto no ano passado, no mesmo período, foram importadas 6,68 milhões de toneladas. Por isso, a corrente de comércio registrou um decréscimo de 15,95% no período, ou seja, US$ 22,12 bilhões contra US$ 26,32 bilhões, o que significa uma diferença de US$ 4,2 bilhões.

Os dados mostram ainda que houve uma redução no valor agregado das mercadorias movimentadas pelo complexo portuário santista, o que deixa claro que o País passou a ser visto mais como fornecedor de matéria-prima. De olho nos insumos brasileiros, os europeus começam a mostrar interesse também pelo aperfeiçoamento de nossos portos, o que significa que a participação internacional pode acelerar de vez o reaparelhamento portuário. Já houve licitação de três portos, com investimentos internacionais em consórcio com empresas nacionais, de acordo com a nova legislação brasileira.

Esse despertar do interesse europeu – especialmente de holandeses e franceses – pelo Brasil é muito bem-vindo, especialmente se isso se reverter também em investimentos em nossos portos. Um estudo da empresa santista VKS Partex, apresentado durante a Intermodal, mostrou que, se a China continuar a crescer a taxas superiores a 6% ao ano, o Brasil terá de construir 81 berços de atracação, dos quais 37 reservados a contêineres, até 2020. Por essa época, Santos estará com uma movimentação similar à do Porto de Roterdã de hoje. Sem parcerias internacionais, alcançar esse objetivo será muito mais difícil. Por isso, é preciso aproveitar bem o interesse que o Brasil voltou a despertar diante do olhar europeu.

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(*) Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Centro de Logística de Exportação (Celex), de São Paulo-SP. E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br

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