Madrugada na pequena cidade de Katy, no Texas, em um rancho das proximidades uma família dorme tranquilamente até que Bob é despertado por um barulho. Leva apenas alguns segundos para saber que o som vem da frente de sua casa acompanhado do ronco de um motor de um carro parado na estrada próxima.
Cautelosamente pega sua espingarda, abre a janela do segundo andar e confirma que estão tentando roubar sua caminhonete. Dispara um tiro então no gramado. Os criminosos, óbvio, saem em carreira sem mesmo verificarem de onde veio o disparo.
*Bene Barbosa
Bob então liga 911 e aguarda a chegada do Xerife, que alguns minutos depois encosta sua viatura no local. Esclarecido o fato o Xerife com o seu forte sotaque texano sentencia: se não houver um corpo não precisa me chamar. Não, esse não é um caso fictício e sim de um amigo meu, brasileiro, que mora há muitos anos nos EUA, também não se trata de um caso isolado como demostrarei abaixo, mas é sim um dos milhões de casos onde uma reação armada não vai parar nas estatísticas oficiais.
E é por conta desse tipo de casos - onde ninguém morre, repito! - que circulou na imprensa americana e repercutiu na imprensa brasileira a seguinte manchete: "Armas raramente são usadas para auto-defesa (SIC) nos EUA" que em seu texto traz a informação que: "Em uma análise de dados do FBI e outros números do governo federal, a organização sem fins lucrativos Violence Policy Center disse que os americanos são muito mais propensos a se machucar ou machucar outras pessoas ao manusear uma arma letal. Em 2012, informou o grupo, apenas 259 "homicídios justificáveis" envolvendo civis foram relatados, comparado a 8.342 homicídios criminosos cometidos com arma de fogo".
Pois bem, vamos aos fatos. Inicialmente, é necessário esclarecer que a Violence Policy Center é uma ONG americana que tem em seu objetivo proibir a posse e o porte de armas nos EUA. Portanto, devemos sempre olhar com cuidado tais análises. Segundo, - aí está a desonestidade do texto! - eles usam apenas as mortes de criminosos por cidadãos armados agindo em legítima defesa e propositadamente deixam de lado todos os casos onde não houve o evento morte. E em terceiro, e não menos importante, é que falsamente eles pressupõem que as pessoas legalmente armadas, que agem em legítima defesa são as mesmas que possuem armas ilegais e cometem assassinatos e não há maior mentira que essa!
Uma das únicas pesquisas comprovadamente sérias a este respeito foi realizada pela equipe do Dr. Gary Kleck, criminologista da Universidade Estadual da Flórida, que descobriu que armas são usadas em legitima defesa aproximadamente 2,5 milhões de vezes por ano nos EUA. Essa e outras conclusões estão no livro "Armed Resistance to Crime: The Prevalence and Nature of Self-Defense with a Gun".
Realmente, é difícil entender o pensamento desse pessoal que acha ruim que quase 150 milhões de americanos legalmente armados se defendam, quando necessário, tão pouco, enquanto criminosos matam milhares de pessoas usando armas ilegais e outros instrumentos.
Tentam eles, de todas as formas, negar algo que até a ONU já aceitou em seu Relatório Global de Homicídios, versão 2011, página 44, que afirma: "Adicionalmente, sob uma perspectiva global, a enorme diferença entre as estimativas de proprietários de armas de fogo (centenas de milhões, de acordo com estimativas da Small Arms Survey, 2007) e o número anual de homicídios (centenas de milhares) indica que a maioria das armas dos cidadãos não é desviada e é possuída para propósitos legítimos".
A verdade continua a mesma seja no Brasil, seja nos Estados Unidos ou na Cochinchina: Desarmar o cidadão não é a solução.
*Bene Barbosa é especialista em Segurança Pública, presidente da ONG Movimento Viva Brasil e autor do livro "Mentiram para mim sobre o desarmamento".