Porto de Santos: a questão ferroviária

SÃO PAULO - Quem viaja pelo interior de São Paulo e Estados vizinhos sempre se depara com estações de trens abandonadas ou que se transformaram, nos últimos tempos, em centros culturais ou de convivência por pressão da comunidade. São um exemplo do fracasso do poder público que, na década de 1960 e seguintes, no afã de incentivar a instalação das indústrias automotivas no País, optou por sacrificar a rede ferroviária, ao estimular priorariamente a construção de rodovias, embora uma opção não significasse necessariamente o desaparecimento da outra.  

Milton Lourenço (*)

É o que mostra a experiência vivida por outros países de dimensões continentais, como o Canadá, onde hoje as redes ferroviária e rodoviária cortam o país de Norte a Sul e do oceano Atlântico ao Pacífico, passando ainda pelo Ártico, transportando cargas e passageiros.  No Brasil, porém, não foi isso o que se deu, talvez em função da falta de visão dos gestores públicos ou da endêmica corrupção que, muitas vezes, tem manipulado as decisões governamentais.

Assim, hoje o que resta é tentar recuperar o tempo perdido. É o caso da utilização de ferrovias para o transporte de cargas do interior do País para o porto de Santos e vice-versa, que nos últimos anos vem aumentando de maneira significativa. Para provar isso, basta lembrar que, no começo deste século, menos de um milhão de toneladas de cargas passavam pelos trilhos até chegar ao cais santista, mas que hoje esse número supera o de 30 milhões de toneladas.

Isso só foi possível a partir da privatização das linhas férreas, com a distribuição do modal para várias concessionárias. Atualmente, pouco mais de 75 quilômetros de trilhos atendem a 30 terminais instalados na margem direita do complexo portuário santista. Mas, ainda assim, a rede se mostra insuficiente para atender à demanda e à expectativa de crescimento para os próximos anos. Afinal, anualmente, a movimentação cresce cerca de 2,5 milhões de toneladas.

Esse crescimento tem criado muitos conflitos entre o tráfego ferroviário e rodoviário na área retroportuária, como prova a existência de 35 passagens de nível tanto no setor atendido pela concessionária Rumo no cais do porto como na área de concessão da MRS no município vizinho de Cubatão. Eliminar esses conflitos e, especialmente, aquele que se dá diariamente na região do Valongo, nas proximidades do antigo Armazém 1, é tarefa fundamental e urgente para acabar com os enormes congestionamentos que se registram no local e que, muitas vezes, chegam a parar o trânsito na Via Anchieta, até o alto da Serra do Mar.

 Sabe-se que há um plano de investimento privado por parte da Rumo e da MRS que prevê a construção de um retropátio à entrada do porto, que funcionaria como local de espera para os vagões fora de operação ou em manutenção, além de outros retropátios e desvios, duplicação de trechos e remodelação de antigos pátios de manobras bem como a instalação de passarelas para pedestres. A par disso, dá-se também a padronização da frota de vagões e a modernização das locomotivas, que contribuem para a agilização do servi&cc edil;o de carga e descarga.

Seja como for, a verdade é que está chegando o momento em que não haverá alternativa para o porto que não seja aumentar o transporte ferroviário. Para isso, no entanto, será necessário refazer o modelo de operação dos armadores.

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(*) Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC). E-mail: fiorde@fiorde.com.br. Site: www.fiorde.com.br

 


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Timothy Bancroft-Hinchey