Voltar às aulas agora?

Neste mês, o mundo passou da marca de 1 milhão de mortes em decorrência da infecção pelo novo coronavirus. A primeira metade destas mortes aconteceu em seis meses, enquanto a outra em apenas três meses.

Por Floriano Pesaro, Sociólogo

Ainda: as últimas cem mil perdas humanas ocorreram em apenas doze dias. São números que se traduzem numa lamentável realidade, embora alguns teimam em negá-la. Fato é que a pandemia e seus efeitos sobre nossas vidas continuam por mais cansados que estejamos. Em especial, esse efeito tem sido cruel com as crianças que abruptamente foram retiradas de seus vínculos escolares, mas até que ponto podemos considerar o retorno às aulas com a Sars-Cov-2 ainda circulando sem uma vacina?

Sociologicamente, essa é uma discussão que envolve, mais uma vez, o individual e o coletivo, binômio que tem sido recorrente nas grandes discussões nacionais nos últimos anos. Ora, se é direito do responsável pela criança zelar pela sua segurança e de sua família, ele não deveria ser obrigado a enviá-la para um ambiente com alto risco de contaminação por uma doença que ainda não tem nem remédio e nem vacina. Por outro lado, o Governo, de modo geral, deve zelar pela permanência dos estudantes no ensino regular salvaguardando, em consequência, uma série de direitos das crianças, como a segurança e a alimentação saudável.

Em recente pesquisa do Instituto Datafolha, 75% dos paulistanos entrevistados disseram apoiar o fechamento das escolas, pelo menos, até novembro deste ano. A janela de tempo que deixa dezembro como possibilidade se explica pela expectativa de que a vacinação para o grupo de risco da Covid-19 se inicie, ao menos no estado de São Paulo, neste mês - segundo o Governo estadual.

É verdade que, para a opinião pública, bares e restaurantes abertos juntamente de praias lotadas aos feriados compõem um cenário de difícil explicação para quem advoga pela manutenção do fechamento das escolas. Afinal, o vírus não faria distinção de ambiente para infectar uma criança.

Contudo, despido de paixões partidárias e ideológicas, podemos inferir que não é passível de comparação a reabertura de atividades comerciais com a ida de 2,8 milhões de estudantes aos bancos escolares, considerando apenas a cidade de São Paulo. São milhões de estudantes que, sem o discernimento de um adulto, possuem mais chances de se contaminarem e, ainda pior, levarem o vírus para dentro de suas casas, onde podem infectar pessoas dos grupos de risco.

Por outro lado, crianças e adolescentes estão há meses alijados do convívio social e da aprendizagem adequada, de modo que os efeitos desse isolamento ainda são desconhecidos. Especialistas alertam que essa quebra abrupta e prolongada da vivência escolar pode produzir estresse tóxico, ansiedade e, até depressão nos estudantes, em especial os mais jovens, que não conseguem entender a complexidade da pandemia.

Esse risco no desenvolvimento das crianças se agrava quando abordamos os recortes da vulnerabilidade social, onde ir à escola pode significar a garantia da alimentação adequada e da segurança física e mental da criança.

Por isso, compartilho da posição do Vereador Daniel Annenberg de que esse não é um assunto simples e de fácil resolução, onde os impactos vão desde a saúde financeira das escolas privadas e de todo o ecossistema de serviços e funcionários até o impacto na aprendizagem, na psique, na alimentação e na segurança dos estudantes. Concordo, ainda com Annenberg, quando diz que não podemos, portanto, furtarmo-nos desse debate.

É preciso, sempre guiados pela tecnicidade desapaixonada da ciência e dos técnicos da Saúde, que estabeleçamos protocolos para garantir a volta segura às aulas, de modo a equilibrar a segurança sanitária com a garantia dos direitos dos estudantes que, no limite de suas ausências, podem nos levar a perder toda uma geração para a evasão escolar."

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Timothy Bancroft-Hinchey