Mulheres indígenas fortalecem associativismo para gerar renda

Mulheres indígenas fortalecem associativismo para gerar renda

Juliana Radler

No Alto Rio Negro, associação de mulheres busca se fortalecer para comercializar a cerâmica milenar produzida pelas comunidades da região

Uma das mais antigas associações de mulheres indígenas no Brasil, a Associação de Mulheres Indígenas da Região de Taracuá (Amirt) orgulha-se da sua história de luta e resistência na Terra Indígena Alto Rio Negro, na região do Baixo Uaupés, em São Gabriel da Cachoeira (AM). Superando dificuldades, a associação fundada em 1987 está buscando profissionalizar sua gestão para comercializar a milenar arte cerâmica das mulheres do distrito de Taracuá e comunidades vizinhas. Veja mais aqui.

Realizada entre os dias 29 de setembro e primeiro de outubro, a V Assembleia Ordinária da Amirt ocorreu na Escola Estadual Indígena Sagrado Coração, em Taracuá. Cerca de 90 sócias, sócios, professores, estudantes e lideranças indígenas ligados a Amirt participaram da Assembleia convocada pela sua diretoria, presidida por Suzana Menezes Miguel, da etnia Pira-Tapuya.

Algumas das ceramistas fundadoras e primeiras diretoras da assoicação estiveram presentes na Assembleia, como Clara Mota Massa (Desana), Enezilda Vasconcelos (Tariana) e Maria Salete Barbosa (Tariana). Elas lembraram como foi difícil reerguer a Amirt em 2004, quando a Associação - então chamada Associação das Mulheres Indígenas de Taracuá, Rio Uaupés e Tiquié (Amitrut) - praticamente foi extinta. "Era difícil porque os maridos tinham ciúme. Aí arrumamos um advogado para falar sobre igualdade de gênero para nós. A gente convocou uma grande assembleia e começamos a defender nossos direitos e conhecer as leis", lembra Enezilda.

Hoje, as fundadoras acreditam no potencial da Associação para geração de renda local e buscam parcerias para fortalecer seu trabalho voltado à produção da cerâmica indígena da região. "Importante para a gente hoje é buscar parcerias boas e compromissadas com a AMIRT. Queremos arrumar compradores para a nossa cerâmica, conseguir reformar nossa sede própria e comercializar produtos das roças, como a farinha, banana e ananás", conta Clara, ceramista há 25 anos.

Aprovar mudanças em seu estatuto e criar o regimento interno para uso do barco da Associação, Amireta, adquirido junto à Fundação Banco do Brasil, foram os principais objetivos da V Assembleia. O novo estatuto foi revisado pela advogada do Instituto Socioambiental (ISA), Juliana Batista, e aprovado durante as reuniões em Taracuá. O regimento interno do barco também foi elaborado e possibilitará que a AMIRT faça uma gestão profissional de seu barco, prestando serviços para as comunidades indígenas, assim como escoando sua cerâmica e produtos orgânicos das roças locais.

As mulheres de Taracuá sonham em ver sua associação com sede própria, onde possam ter uma pequena loja e mostruário da cerâmica. No distrito, onde hoje vivem aproximadamente 400 pessoas, circulam muitos profissionais que atuam na região, como educadores, médicos, enfermeiros, antropólogos e outros. Taracuá integra o chamado triângulo Tukano, composto também pelos distritos de Iauaretê, no Alto Uaupés, e Pari-Cachoeira, no Rio Tiquié, região estratégica no Noroeste Amazônico.

Sebastião Duarte, o Sabá, liderança tradicional Tukano de Taracuá, é filho de uma das mais destacadas ceramistas do distrito, Anita Lemos, já falecida. Dona Anita, do povo Arapaso, foi uma incentivadora da produção de cerâmica em Taracuá. Duarte esteve presente na Assembleia da AMIRT junto com sua esposa ceramista, Clara, e da filha, Larissa Duarte, que também integra a associação e faz parte da rede de Agentes Indígenas de Manejo (AIMAS). "É importante que os jovens tenham alternativa de renda para que fiquem na comunidade. Os que saem para estudar fora devem voltar para cá trazendo os conhecimentos que aprenderam para somar com os nossos saberes", conclui Duarte.

Oportunidades para jovens e mulheres

Os departamentos de Mulheres e da Juventude da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) também estiveram presentes à Assembleia. Lucas Matos, do povo Tariano, coordenador de juventude, ressaltou as oportunidades geradas pela Amirt aos jovens. "Precisamos participar dos trabalhos das associações e dos projetos comunitários para aproveitar as chances que temos de aprender mais, conhecer novas pessoas e nos destacar". Já Janete Alves, Desana, parabenizou os esforços feitos pelas ceramistas da região de Taracuá no sentido de comercializar sua cerâmica na Wariró (loja de artesanato indígena do Rio Negro da Foirn localizada na sede de São Gabriel da Cachoeira) e para outros clientes, como a Galeria Amazônica, em Manaus. "Apoiamos as atividades da Amirt e sabemos do grande potencial que a associação possui para se desenvolver", disse Janete.

As diretoras da Amirt vem participando das formações dadas pela Foirn em parceria com o ISA no sentido de fortalecer a autonomia das associações de base, como a primeira formação sobre o novo Marco Regulatório da Sociedade Civil (MROSC - lei 13.019 - 2014). A legislação trata do estabelecimento do regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil. Através dessas formações, a diretoria recebeu também consultoria jurídica para atualização de seu estatuto. Esse projeto de fortalecimento da autonomia dos povos indígenas do rio Negro na implementação de políticas públicas através do Novo Marco Regulatório da Sociedade Civil é apoiado pela União Europeia (UE).

https://www.socioambiental.org/pt-br/blog/blog-do-rio-negro/mulheres-indigenas-fortalecem-associativismo-para-gerar-renda

 


Author`s name
Timothy Bancroft-Hinchey