As comemorações dos 100 anos da Revolução Russa seriam um bom motivo para repetir a velha pergunta - o comunismo está morto?
Para a maioria dos intelectuais que se dizem democratas e até mesmo de esquerda, a ideia de um retorno à sociedade sem classes, sonhada por Marx e tentada ser posta em prática por Lenin e Trotski, é uma utopia e sua morte foi decretada por dois grandes eventos, a queda do Muro de Berlim e o fim da União Soviética.
Infelizmente para eles, a busca de uma sociedade igualitária parece fazer parte do melhores sonhos dos homens e os fracassos do passado não desanimam as pessoas em reconstruir antigos caminhos, evitando os desvios e os erros já cometidos.
A luta de classes está de volta. O espectro de Marx reaparece para mostrar que a "ideia do comunismo" e sua utopia igualitária não morreram, apesar dos desvios e dos estragos feitos a elas pelo "socialismo real" e pelos totalitarismos que dele resultaram.
Dessa vez, não são políticos, mas sim filósofos que se dispõem a colocar novamente em discussão a possibilidade de se reconstruir o sonho de uma sociedade sem classes. Entre eles, as vozes mais destacadas são Alain Badiou (A Ideia do Comunismo), Slavoj Zikek (Em Defesa das Causas Perdidas), Jacques Rancieri (O Ódio à Democracia); István Meszaros (Socialismo ou Barbárie no Século XXI), Jean-Jacques Marie e Pierre Broué, entre outros.
Uma coleção de artigos sobre o tema Comunismo, organizados por Alain Badiou, foi lançada em Londres, reunindo trabalhos de quinze filósofos das mais diversas nacionalidades.
Na apresentação, Badiou declarou que, tanto ele quando Zizek, tinham certeza de que "repor em circulação esse velho vocábulo magnífico, não deixar os partidários do capitalismo liberal globalizado imporem um balanço pessoal de sua utilização, relançar a discussão sobre as etapas e os desvios inevitáveis da emancipação histórica da humanidade toda, era uma tarefa necessária para o que hoje se mostra dramaticamente ausente: uma independência total de pensamento diante do consenso ocidental "democrático" que apenas organiza universalmente sua própria e deletéria continuação desprovida de sentido".
O filósofo Jacques Rancière escreveu: "A "crise" atual é de fato o freio da utopia capitalista que reinou sozinha durante os 20 anos que se seguiram à queda do império soviético: a utopia da autorregulação do mercado e da possibilidade de reorganizar o conjunto das instituições e das relações sociais, de reorganizar todas as formas de vida humana segundo a lógica do livre mercado".
Apresentadas em ordem alfabética, as conferências de Alain Badiou, Judith Balso, Bruno Bosteels, Susan Buck-Morss, Terry Eagleton, Peter Hallward, Michael Hardt, Minqi Li, Jean-Luc Nancy, Toni Negri, Jacques Rancière, Alessandro Russo, Alberto Toscano, Gianni Vattimo, Wang Hui e Slavoj Zizek abordam diferentes aspectos do pensamento comunista.
Pena que os intelectuais da esquerda brasileira se contentem com discussões que envolvem mais um improvável aprimoramento do capitalismo brasileiro, do que a sua substituição por outro sistema mais humano e justo.
Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS