Locarno: o cotidiano e o desejo de liberdade

Locarno: o cotidiano e o desejo de liberdade

Um dos favoritos ao Leopardo de melhor filme e filme alemão Liberdade (Freiheit), a história de uma mulher, Nora, casada e com filhos que, de repente, faz aquilo com que muitas pessoas, mesmo com família,  sonham mas sem coragem de realizar - sai de casa, desaparece e até muda de identidade.

Nora tipifica tantas pessoas, inclusive homens, frustradas com o cotidiano decorrente de suas opções de vida familiar ou profissional e, de repente, sem preparação decide romper. Uma minoria, mas igual a umas dezenas de milhares de pessoas, desaparecem por ano na Europa, uma parte movida por um desejo voluntário de dar um novo rumo à vida, tentar um novo começo ou simplesmente evitar repetir o mesmo esquema de vida de onde saiu.

Nora decide não regressar para casa, em Berlim, depois de ter dormido no ônibus e deixado de descer na sua parada habitual, ao retornar de uma visita a uma exposição de quadros de Caravaggio num museu de Viena.  Vai parar na capital da Eslováquia, Bratislava, onde esconde sua identidade, dizendo-se holandesa, e consegue um emprego num hotel, embora na Alemanha fosse esposa de advogado, com situação social de classe média alta.

Em Bratislava, com sua nova identidade, se torna amiga de um casal com filhos e, numa festa de aniversário com essa família, percebe estar recompondo o mesmo quadro existencial vivido na Alemanha. Decide partir, não se sabe para onde. Ao  longe aparece iluminado um prédio, como reproduzindo a Torre de Babel de Brueghel. Seria uma alusão à dificuldade de muitos de viver dentro dos limites dos padrões da sociedade que, de certa forma, frustram o desejo de liberdade latente de cada um? A ânsia de uma liberdade mais plena, sem o repetir do cotidiano?

Liberdade (Freiheit), do realizador Jan Speckenbach, é um dos favoritos ao Leopardo.

Rui Martins está em Locarno, convidado pelo Festival Internacional de Cinema.

 


Author`s name
Timothy Bancroft-Hinchey