Quem viu o filme, O Discurso do Rei (The King Speech), está autorizado a pensar que o Príncipe Albert, o Duque de York, se tornou o Rei Jorge VI (Colin Firth) porque seu irmão mais velho, o Príncipe de Gales, o Rei Eduardo VIII (Guy Pearce) se apaixonara por uma divorciada americana, Wallis Simpson (Eve Best) e renunciou ao trono por este amor e que o único problema do novo rei era sua gagueira, providencialmente curado pelo fonoaudiólogo Lionel Logue (Geoffrey Rush).
Há muito tempo já se sabia que a história não se desenrolou seguindo esse roteiro.
Basicamente, o que ocorreu foi uma queda de braço entre Eduardo VIII e seus ministros a respeito de como tratar a Alemanha Nazista de Hitler. O rei era a favor de uma convivência pacífica e até mesmo muito amigável com Hitler e o governo inglês, primeiro com Stanley Baldwin e mais tarde com Winston Churchill, entendia que não havia lugar na Europa para duas potências como o Reino Unido e a Alemanha.
Eduardo VIII, que assumira o trono com a morte do pai, o Rei Jorge V, em 20 de janeiro de 1936, renunciou ao trono em 11 de dezembro do mesmo ano para casar com Wallis Simpson.
No ano seguinte, já apenas como Duque de Windsor, ele e Wallis Simpson estiveram em Berlim, onde foram recebidos por Hitler. Anos mais tarde, ele diria que se tivesse continuado como rei, teria evitado a guerra com a Alemanha.
Sabe-se que durante todo o período da guerra, o casal esteve continuamente sob a vigilância de americanos em ingleses durante o tempo em que viveram na França, na Espanha e Portugal.
Já como Primeiro Ministro, o grande temor de Churchill era que os alemães pudessem seqüestrar Eduardo VIII e tentar fazê-lo novamente rei dos britânicos, o que parece ter sido também um desejo de Hitler.
Em 1957, foram divulgados telegramas entre o Ministro do Exterior da Alemanha nazista, Joachim von Ribbentrop e seus embaixadores na Espanha e Portugal, durante a guerra pedindo que Eduardo VIII fosse informado dessa decisão.
Essa semana, documentos liberados pelos Arquivos Nacionais Britânicos, revelam que Churchill agiu junto aos governos da França e Estados Unidos, logo após o final da guerra (1945) no sentido de que esses telegramas não fossem revelados nos 20 anos seguintes, preocupado que estava que as revelações das relações do antigo rei com os nazistas pudessem abalar o prestígio da família real britânica.
Num deles, transcrito agora pelo jornal The Independent, Ribbentrop informa aos seus embaixadores que "o Duque precisa ser informado que a Alemanha deseja a paz com o povo britânico e de que a facção que apóia Churchill é um obstáculo a essa paz" e garante que "a Alemanha está determinada a forçar à Inglaterra a aceitar a paz através do uso de todos os métodos e que se isso acontecer estará pronto para atender todos os desejos do Duque, especialmente o seu regresso ao trono, com a Duquesa ao seu lado"
Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS