Ó o ciúmes e a inveja dão boas histórias ( pelo menos no teatro)
Tenho uma amiga no facebook, da qual sei apenas o nome, que todas as noites me manda uma mensagem, desejando felicidades e votos de confiança no ser humano.
Logo eu, que cultivo com carinho invejas e ciúmes.
Essa semana, ao lembrar uma experiência maravilhosa da juventude, ao assistir no Teatro São Pedro, Entre 4 Paredes (Huis Clos) do Sartre, com Tônia Carrero e Paulo Autran, direção de Adolfo Celi e também o Otelo, o Mouro de Veneza, me dei conta que são esses sentimentos perversos, a inveja e o ciúmes, únicos capazes de gerar momentos de grande prazer, quando transformados em livros, filmes ou peças de teatro.
Os personagens de Entre Quatro Paredes se atormentam o tempo todo vivendo o único inferno possível, aquele que os outros criam para nós e que nós criamos para os outros.
Em 1976, no Rio de Janeiro, assisti outra peça, que também se estrutura em cima desses sentimentos ditos malignos. Falo de Vestido de Noiva, com Camila Amado (Alaíde) e Normal Benguel(a cafetina Madame Clessy). Ziembiski, que havia dirigida a primeira versão da peça de Nelson Rodrigues, em 1943, considerada uma revolução no teatro brasileiro, assinava também essa nova versão.
Alaíde é a personagem "vestida de noiva" no plano da fantasia, enquanto que no plano real está entre a vida e morte, vítima do que poderia ser um acidente de trânsito ou uma tentativa de assassinato.
Quase todas as grandes atrizes do teatro brasileiro já viveram seu papel: Maria Sampaio, na versão original, Cacilda Becker, Maria Della Costa, Yona Magalhães, Camila Amado e Malu Mader, entre outras, certamente motivadas pela oportunidade de exteriorizar sentimentos tão poderosos como o ciúmes e a inveja, ou ser vítima deles.
Temos aqui, nessa peça de Nelson Rodrigues, novamente, os sentimentos mais fortes do ser humano, aqueles considerados os menos pobres, concentrados em Alaíde, da traída pelo marido e pela irmã.
Comparo esses sentimentos com outros, considerados politicamente corretos e vejo que estes últimos só encontram espaço nas colunas de "fofocas" sobre celebridades.
Assim leio (porque leio de tudo), que Alexandre Pato se separou de Fiorela; Vanessa Giacomo de Daniel Oliveira; Cauã Reymond de Grazi Masaferro;Marcelo Novaes de Letícia Spiller e Cláudia Raia de Edson Celulari e não só não demonstram ciúmes, como, caso exemplar de Vanessa, ela pagou a lua de mel de Daniel com a sua nova namorada, a Sophie Charlotte, possivelmente na França, dado o nome da moça.
Certamente, está faltando um Nelson Rodrigues para denunciar que todas essas histórias de fadas devem ser apenas fachadas e que por trás delas, o velho e bom ciúmes, sempre suspeitando de traições femininas, deve estar presente.
Nelson não confiava em nenhuma mulher e o marido devia estar sempre prevenido, até mesmo com o ginecologista da mulher: "É até deprimente pensar que, nos dias de hoje, até o ginecologista é uma ameaça. Para o bem dos homens, declaro que todo ginecologista devia ser casto. O ginecologista devia andar com batina, sandálias e coroinha na cabeça. Como um São Francisco de Assis, com luva de borracha e um passarinho em cada ombro".
Nelson, um observador atento, tinha um conselho prático para os que suspeitam de que já estejam ostentando belas guampas.
"Se pretender seguir a esposa, aposte na sexta-feira. Sexta-feira é o dia em que a virtude prevarica. E ainda mais importante: Desconfie da esposa amável, da esposa gentil, cordial. A virtude é triste, azeda e neurastênica.
Marino Boeira é jornalista,formado em História pela UFRGS