Sobre jornais e jornalistas

O Dr. Franklin Cunha está sempre lamentando que a esquerda não disponha de um grande jornal impresso para disputar com a direita os corações e as mente da nossa classe média, tradicionalmente alienada.

Quando lembro que agora dispomos, pelo menos, do Sul 21 e outros sites jornalisticamente independentes, ele concorda, mas não deixa de lamentar.

- Só os grandes jornais impressos têm influência política e muitas vezes são eles que pautam à mídia virtual e às redes sociais.

Pensando bem, eu concordo com ele e acrescento.

- Aqui no Sul é ainda muito pior.

O Correio do Povo, há muito que perdeu a força que já teve no passado e em suas páginas, o que se pode ler, as vezes, é apenas um comentário mais critico e inteligente do Juremir Machado.

Sobra a Zero Hora, o veículo líder de um grande grupo de comunicação, mas que historicamente sempre se colocou em posições conservadoras e muitas vezes, através dos seus editores e jornalistas, defende posições reacionárias e contra os interesses mais legítimos da população.

Não é sem razão isso, se lembrarmos que o jornal nasceu do corpo da antiga Última Hora, quando esta foi praticamente extinta durante o golpe de 1964, e desde o seu início se transformou em porta voz do movimento militar.

Hoje, Zero Hora fica inclusive distante de outros jornais do centro do País, tão conservadores como ela, mas que guardam ainda, um certo respeito pela tão enaltecida, mas pouco praticada, diversidade de opiniões.

A Folha de São Paulo deu guarida, em sua página de debates, a uma carta do ex-deputado Eduardo Cunha.

Não se discute as qualidades éticas e morais de Cunha, mas obviamente ele é um personagem que teve grande influência na vida política do País há até pouco tempo e é importante saber o que ele pensa do juiz Moro e das razões para a sua prisão.

Quando Cunha era o principal agente, com o beneplácito da Justiça, para o trabalho sujo de desestabilização do Governo Dilma, ele merecia as manchetes e até elogios da imprensa. Quando sua tarefa foi concluída, o jogaram na lata do lixo.

Todos nós sabemos que, praticamente, todos os grandes jornais do Brasil apoiaram o golpe militar de 64, mas em algum momento, alguns deles tiveram a coragem de enfrentar os desmandos dos militares.

A Folha, que agora publica uma carta do Eduardo Cunha e tem entre seus editores e cronistas, talvez o maior importante jornalista político do País, Janio de Freitas, durante a ditadura chegou a emprestar suas caminhonetas, destinadas à distribuição de jornais, para carregar presos políticos.

O Estadão, o ultra conservador jornal paulista, que sempre se colocou contra os governos progressistas do Brasil, bancou o perseguido político Flávio Tavares como seu correspondente em Buenos Aires e publicava poemas do Camões e receitas de bolo nas páginas do jornal que a ditadura censurava.

O Jornal do Brasil, na época talvez o mais influente veículo da mídia brasileira, apoiou decididamente o golpe de 64, mas quando a censura se tornou cada vez mais rígida, assumiu posições críticas. Ficou na história do jornalismo, a página da previsão do tempo do JB, no dia seguinte à edição do AI5, para ludibriar a censura.

Previsão do tempo:
Tempo negro.
Temperatura sufocante.
O ar está irrespirável.
O país está sendo varrido por fortes ventos.
Máx.: 38º, em Brasília. Mín.:5º, nas Laranjeiras.

Mas, de todos os jornais brasileiros, o caso mais notável de mudança de linha editorial, foi do Correio da Manhã, do Rio

Ficaram famosos seus editoriais, com as manchetes CHEGA e BASTA, nas vésperas do golpe de 64, pedindo explicitamente a derrubada do governo de João Goulart, o que não impediu que o jornal se transformasse logo a seguir no maior crítico do regime, principalmente pelos textos dos seus jornalistas, editorialistas e colaboradores, como Carlos Heitor Cony, Hermano Alves, Otto Maria Carpeaux e até o poeta Carlos Drummond de Andrade.

Nada disso, você vai encontrar nos arquivos dos nossos grandes jornais gaúchos.

As criticas, quando surgiam, eram apenas nas mídias alternativas, incapazes de chegar ao grande público que precisaria ser esclarecido, fato que, como não cansa de constatar o Dr. Franklin Cunha, permanece até hoje.

Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS

 


Author`s name
Timothy Bancroft-Hinchey