Tudo se passa como se as artes tivessem esgotado suas possibilidades existenciais restando, tão só, a repetição monótona, a falta de imaginação e a busca sem sentido de uma "grandiosidade" puramente física ou a perpetração de invencionices rocambolescas as quais visam a conquistar os malfadados e execráveis "quinze minutos de fama"
Iraci del Nero da Costa *
A arquitetura, a meu juízo a única arte que não regrediu ou estagnou neste início do século XXI, chegou mesmo a incorporar elementos da pintura cubista; tal evento a tornou, em alguns casos, um tanto exagerada ultrapassando os limites de uma visão inteiramente equilibrada, este fato, por vezes, ofendeu sensibilidades mais apegadas a formas consideradas plenamente harmoniosas.
Não obstante, como avançado, os arquitetos propuseram inovações formais capazes de ultrapassar a eventual limitação acima apontada e garantiram o efetivo avanço de sua arte revelando um espírito inventivo e criativo não observado nas demais expressões artísticas todas elas prisioneiras de um passado o qual se vê repisado na atualidade chegando mesmo, em vários casos, a perderem-se numa regressão estética grosseira e de inegável mau gosto.
Tudo se passa como se as artes tivessem esgotado suas possibilidades existenciais restando, tão só, a repetição monótona, a falta de imaginação e a busca sem sentido de uma "grandiosidade" puramente física ou a perpetração de invencionices rocambolescas as quais visam a conquistar os malfadados e execráveis "quinze minutos de fama" com base numa "engenhosidade" calcada no grotesco.
A canção popular canta a superfluidade pura e simples ou uma historieta anedótica mal costurada sem qualquer consistência pessoal ou social.
As esculturas querem-se de grande porte ou passageiras buscando, tão somente, o gigantismo e a efemeridade que possam "comover" o observador deixando-o boquiaberto. Destarte, a "mensagem artística" não alcança o intelecto, mas restringe-se à mera aparência.
A música erudita, em grande parte, estagnou e persegue com insistência a produção de uma sonoridade que mais fere do que envolve e enriquece a sensibilidade do ouvinte.
Ainda com respeito à música erudita cumpre lembrar os arranjos mal elaborados que fogem dos autores e se aproximam do vulgar. Não obstante tais críticas, deve-se ter presente que autores preocupados em colher as tradições regionais de seus países têm revelado um encantamento inovador e altamente sedutor. Vale dizer, o novo, ainda muito restrito, é oferecido pela cultura secular dos mais diversos povos e nações.
Ferir sem maiores preocupações estéticas parece ser o objetivo visado pelos atuais autores vinculados à pintura e às artes plásticas em geral: o primordial é a ofensa, a comoção pelo inusitado mesmo se ele apresentar-se de modo rudimentar e desencantado. A utilização de elementos visuais e táteis vergam-se, assim, a técnicas mal elaboradas e, em muitíssimos casos, apenas agressivas. A meu ver, deste vasto conjunto de artistas menores devem ser excluídos não só os arquitetos em geral, mas também um grande número de artistas voltados para a fotografia; embora possamos reconhecer o caráter híbrido da fotografia, não resta dúvida que as pessoas dedicadas a esta arte visual produzem resultados de grande valia artística e intelectual enriquecendo, assim, o mundo das ideias.
A cinematografia dos países situados no assim dito mundo periférico, a qual encontra-se em larga medida em seu nascedouro, não parece estar tão combalida e atrofiada artisticamente quanto a produção cinematográfica dos EUA e dos países centrais da Europa com larga tradição na área (sobretudo França, Itália e Suécia). A indústria cinematográfica parece presa ao século findo e busca, na falta de novas perspectivas, apegar-se ao mundo televisivo e/ou reviver os sucessos do passado.
A literatura enxovalhou-se, apequenou-se assustadoramente e tem produzido figuras grotescas que se pensam autores de alto coturno. As biografias e autobiografias avolumaram-se demonstrando o quanto se procura a fama quimérica; a autoajuda tomou as mais variadas formas o mesmo acontecendo com a construção de mundos surreais habitados por seres fantasmagóricos. Ademais, muitos e muitos pseudo autores procuram mesclar a realidade do passado com suas fantasias apoucadas; neste caso, numa evidente demonstração de falta de imaginação e criatividade, tomaram personagens reais e as mergulharam no caos de situações imaginárias. Enfim, não ficamos no século XX, pois avançamos rumo ao nada ao qual já nos havia condenado a poesia que grassa nestes tempos modernos.
Dada a intensa concorrência proporcionada pelas séries (algumas de qualidade) e novelas (em regra bem encenadas, mas nem sempre bem concatenadas) divulgadas pela indústria televisiva parece-me altamente louvável a quantidade e a qualidade dos espetáculos dirigidos pelos mais variados grupos teatrais diretamente ao público interessado em representações refinadas. Não obstante isso, a produção de novos e superiormente elaborados textos teatrais ainda não atingiu o nível desejado pelos apreciadores com nível elevado de entendimento dessa arte.
Enfim, afora os poucos casos apontados nestas breves notas, encontramo-nos num período de estagnação das artes em geral, momento este o qual, certamente, ver-se-á superado ao longo do tempo, pois, como sabido, não foram poucas, no desfiar da história, as épocas de transição ou de retomada de fôlego.
* Professor Universitário aposentado.