Adilson Roberto Gonçalves
Parecem desconexos, mas há uma ligação importante entre inteligência artificial e regulação da internet, ou, ao menos, de parte da disseminação de informação falsa.
São totalmente pertinentes as preocupações mostradas em vários artigos e editoriais com os riscos da inteligência artificial. Nos tempos do Orkut, o resumo de minha tese foi divulgado em um grupo como sendo de outra autoria e imediatamente alguém identificou e denunciou, pois eu não havia visto. Eram tempos ainda incipientes de uso de buscadores e compiladores de texto. Por trás da inteligência artificial está a naturalização do golpe e da artimanha, em que a criatividade é abandonada.
Artimanhas também amplamente usadas pelas plataformas digitais. Pela forte propaganda contrária que o Google está fazendo em todos os espaços que possui, físicos e virtuais, parece que o Projeto de Lei das Fake News está no rumo certo. Vamos ver a capacidade da empresa de “convencer” deputados para alterar o projeto e atender seus interesses. Tomando um exemplo particular, pensei que era propaganda do Google, mas era a coluna de Lygia Maria na Folha de S. Paulo (Regulação sem censura, 8/5). A falsa simetria que ela faz entre censura e combate a fake news impede que se dê razão para a necessária regulação e definição de limites que o Projeto de Lei em pauta ainda não evidenciou por completo. A colunista poderia também deixar claro quanto estaria perdendo com eventual desmonetização de suas redes sociais.
Respeito, assim, as opiniões dos que apregou ser a tecnologia um descaminho, mas não há como concordar integralmente com tais argumentos. A tecnologia per se é que propiciou desde a possibilidade de ler o artigo em meu celular até o algoritmo bem desenvolvido que permite fazer pesquisas em arquivos digitais à busca da informação complementar, tanto a pública quanto a publicada. Ter controle, conhecimento e alertas não implica simplesmente recusar ou desprezar a tecnologia. A História mostra que tal caminho foi sempre equivocado. Gutemberg teve seus desafetos quando inventou os tipos móveis e deu início ao que entendemos por impressão hoje, mas aquela tecnologia, ainda que questionada por muitos pelos malefícios que traria, passou a ser lugar-comum na chamada civilização moderna. Nossa resiliência de adaptação deverá ser maior do que nossa incapacidade de compreensão de tais fenômenos.
Adilson Roberto Gonçalves, pesquisador da Unesp, membro da Academia Campineira de Letras e Artes, da Academia de Letras de Lorena, do Instituto de Estudos Valeparaibanos e do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas.