Nos EUA, os veículos mais conhecidos da imprensa-empresa alternativa, sites de notícias como Truthout, Common Dreams, e Huffington Post são absolutamente vedados para escritores nativos de povos subjugados. No que tenha a ver com o Haiti, essa colonização da mente é rampante.
Falaê, Haiti! E viva Cuba!
"Colonizar as mentes" (1/2)
21/9/2012, Dady Chery, Haiti (in Counterpunch, orig. NewsJunkiePost)
Entreouvido na Vila Vudu:
TUDO é importante nesse artigo. O mais importante, nos parece, é VER que nem toda a tal dita 'mídia alternativa' presta. Assim como há (i) uma 'pautação' feita pelo comando fascistizante das grandes empresas-imprensas (no Brasil, é o Grupo GAFE, Globo-Abril-FSP,Estadão), há também uma (ii) 'pautação' feita pelas patrulhas 'ético'-liberais-blog-jornalísticas metidas a progressistas. Essas duas pautações são daninhas.
É preciso deixar falar, digamos, sempre, as 'vítimas'. Sempre muito mais que pressupostos 'professores'-'salvadores' liberais ONG-idiotas de direita - quando não são perfeitos safados fascistas -, autoapresentados como progressistas.
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Ver também:
28/9/2012, "Colonizar as mentes" (2/2)
http://newsjunkiepost.com/2012/09/28/colonialism-of-the-mind-part-ii/ [em tradução]
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"Os intelectuais sempre foram cortesãos. Sempre viveram no palácio."
Pier Paolo Pasolini (1922-1975)
Jornalistas ocidentais estão, cada dia mais, roubando a voz dos nativos de povos subjugados, enquanto os engambelam e negam-lhes acesso à imprensa-empresa.
Nos EUA, os veículos mais conhecidos da imprensa-empresa alternativa, sites de notícias como Truthout, Common Dreams, e Huffington Post são absolutamente vedados para escritores nativos de povos subjugados. No que tenha a ver com o Haiti, essa colonização da mente é rampante.
Inspecione a imprensa-empresa alternativa nos EUA à procura de notícias sobre o Haiti. Você encontrará artigos assinados por Beverly Bell, Mark Weisbrot, Robert Naiman, Jane Regan, Noam Chomsky, Stephen Lendman e outros, e não encontrará um único autor/colunista/escritor haitiano. Ocidentais têm tendências políticas próprias, reservam para eles o direito de comandar o mundo; e o direito de dar lições aos nativos ignorantes é parte do direito de comandar o mundo.
A atual guerra contra o Haiti é guerra econômica e de propaganda que exige uso 'frouxo' do dinheiro de ajuda 'humanitária', para minar a cultura e a agricultura do Haiti.
Essa guerra não seria possível sem campanha simultânea de desinformação, para persuadir o público nos EUA, no Canadá e na Europa de que o dinheiro deles ajuda muitíssimo o povo do Haiti. Essa, precisamente, é a tarefa dos altos sacerdotes do jornalismo.
Os altos sacerdotes do jornalismo-empresa promovem a agenda neoliberal e encapsulam, mascaram, travestem a desinformação que lhes cumpre distribuir, sob a forma de linguagem aparentemente racional e ponderada e que parece muito progressista.
Sobre um tema depois do outro, norte-americanos que falam 'pelo Haiti' espertamente repetem e repetem os "tópicos para noticiário" [orig. talking points] que são pensados e redigidos para viabilizar políticas neocolonialistas. O trabalho desses profissionais ditos 'alternativos' e 'independentes' é muito mais insidioso que o da grande imprensa-empresa dominante, porque a grande imprensa-empresa dominante é limitada à editorialização das mentiras.
Nas mãos dos colonizadores de mentes, a desinformação é como um pirulito envenenado com cianureto: uma balinha letal revestida com açúcar esquerdista, quase todo ele recolhido de publicações pouco conhecidas onde escrevem escritores desconhecidos.
A culpa é da tempestade tropical Isaac
Considere por exemplo o artigo publicado em Truthout sob o título de "Capitalismo de Desastre em New Orleans e no Haiti", no qual Beverly Bell, que dirige várias organizações não governamentais (ONGs) e integra o corpo de acionistas editores de Truthout promoveu dois daqueles "tópicos para noticiário" sobre o Haiti:
1. Deve-se esperar ressurgência massiva do cólera, por causa da tempestade tropical Isaac.
2. Deve-se esperar fome intensa, por causa da Isaac.
Antes do artigo dela, os mesmos tópicos haviam sido intensivamente repetidos por Michel Martelly, pela ONU e pelo governo dos EUA, com o objetivo de atrair novas levas de dinheiro de ajuda. O primeiro tópico é infundado; o segundo, é absolutamente falso. Mais razoável é assumir que as vastas quantidades de água potável de chuva, que a tempestade trouxe, poderiam ajudar a prevenir, em vez de promover, qualquer 'ressurgência massiva' do cólera. Quanto à produção agrícola do Haiti, caiu 20% em 2011 e espera-se que desabe em 2012 [o artigo é de 2012], por causa das políticas da USAID, e praticamente sem nenhuma ajuda de qualquer desastre natural.
Os dois "tópicos para noticiário" - repetidos no artigo de Bell - são, na verdade, a razão de ser do artigo: foi escrito para repetir aqueles "tópicos" e implantá-los na chamada 'opinião pública'. O resto é 'decoração', metáforas de história, cultura e política copiadas do ensaio "New-Orleans & Port-au-Prince: Dois contos de dois fracassos do governo" [orig. "New-Orleans & Port-au-Prince: Two Tales Of Government Failures"] publicado dois anos antes por Gilbert Mercier no News Junkie Post.
Convido o leitor a comparar os dois artigos, para aprender a reconhecer a estratégia pela qual são introduzidos os itens de desinformação, no quadro de um texto que parece correto e progressista.
O mesmo tópico para noticiário - sem qualquer fundamento científico - que liga o cólera e a tempestade tropical Isaac aparece repetido também por Mark Weisbrot em "Tempestade Tropical Isaac avança para o Haiti e fará aumentar o número de casos de cólera quando lá chegar" [orig. "Tropical Storm Isaac Heads for Haiti, Likely to Leave a Spike in Cholera in its Wake"]. O Sr. Weisbrot é conhecido 'especialista' em Haiti e América Latina e co-diretor da ONG "Centro para Pesquisa Econômica e Política" [orig. Center for Economic and Policy Research (CEPR)].
"Uma doença da pobreza": os haitianos como sujos, sem higiene
As 'previsões' acima, sobre a tempestade tropical Isaac, não foram a primeira campanha para atribuir a responsabilidade pelo surto de cólera a qualquer coisa, desde que não fosse a fonte real.
Quando o cólera apareceu pela primeira vez no Haiti, em outubro de 2010, a doença, que com certeza era bem conhecida das autoridades norte-americanas e da ONU, porque começou entre tropas da ONU, a doença foi imediatamente atribuída às terríveis condições de falta de higiene em que viviam os haitianos mais pobres; e, assim sendo, previa-se que se convertesse em epidemia, sobretudo nos campos de desabrigados.
Dia 18/11/2010, a CNN escreveu:
"Carência de água potável, combinada com falta de higiene nas mãos e na preparação dos alimentos, torna as 1,3 milhão de pessoas que ainda vivem nos campos particularmente vulneráveis, segundo recente estudo publicado pelo Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CPCD) dos EUA (...).
"O CPCD disse que a cepa da bactéria do cólera responsável é "impossível de distinguir" de outra encontrada em outras partes do planeta, inclusive no sul da Ásia, mas os pesquisadores não têm ideia de como chegou ao Haiti."
Cerca de um mês depois, Beverly Bell incorporou-se e já 'noticiava' os mesmos "tópicos":
"A semana passada trouxe condições perfeitas para um pico no número de doentes de cólera - que os Parceiros para a Saúde [ONG, orig. Partners in Health] chamam de "uma doença da pobreza" que impacta os que não recebem água potável segura (...). Porque os encarregados da higiene e limpeza não conseguiam chegar aos campos, os vasos sanitários e o lixo acumulou-se a extremos terríveis (...). As chuvas esporádicas durante a semana passada, além do mais, fizeram alastrar-se a água e os esgotos contaminados, vetores perfeitos para a doença."
Esse entusiasmo no serviço de culpar os pobres por suas degraças veio engalanado em linguajar apaixonado, que parecia defender os pobres e lastimar suas condições de vida. Na verdade, todas previsões sobre o cólera não tinham qualquer fundamento.
O local no qual o cólera alastrou-se mais ampla e mais violentamente, não foi os campos de desabrigados em Port-au-Prince - onde vivem os mais pobres de todos os pobres do Haiti - mas uma região limpíssima, ultra limpa, rural, que foi contaminada pelos esgotos de uma base da ONU onde viviam soldados do Nepal.
Jamais houve qualquer fundamento para a predição de que o cólera tornar-se-ia epidêmico no Haiti, e ainda não há qualquer base para prever se a epidemia aumentará ou se continuará indefinidamente.
Em abril de 2012, Dr. Renaud Piarroux argumentou que o cólera no Haiti poderia estar erradicado em apenas poucos meses, como Cuba mostrou que é possível.
Na província de Granma, os médicos cubanos conseguiram deter epidemia de cólera em apenas 60 dias, com medidas apropriadas de educação e treinamento para a população, vigilância epidemiológica, atenção adequada aos doentes e fornecimento de água potável desinfetada. ******