Nota da Pastoral da Ecologia da arquidiocese de São Paulo sobre a gestão dos resíduos domésticos na cidade.
No tempo de Cristo o lixo ja era considerado um problema que piora a qualidade de vida das pessoas. No Evangelho escrito por Mateus (Mt 3, 12 e 18, 8-9) ele fala de um lugar chamado "Geena" onde há um fogo eterno que consome tudo aquilo não pode ser purificado. Esse lugar, é detectado historicamente como o deposito de lixo da cidade de Jerusalém para onde todos os seus habitantes levavam a sua carga de lixo. E, para que esse depósito não ficasse tão grande a ponto de colocar em risco a saúde das pessoas, misturava-se pequenas quantidades de enxofre ao lixo e depois se ateava fogo. Ocorre que, novas cargas de lixo chegavam ao local antes que o fogo consumisse totalmente a carga anterior e o depósito de lixo tornou-se assim um lugar de fogo eterno onde se queimava tudo aquilo que não prestava mais. Esse foi o fato que alimentou a mais forte idéia do inferno como um lugar de fogo eterno onde se queima impiedosamente todas as almas impuras.
O lixo é um dos maiores problemas que afligem a humanidade. Nos grandes centros urbanos como São Paulo milhares de toneladas de lixo são confinadas diariamente em aterros sanitários, lixões, margens de córregos, estradas, terrenos baldios, becos e fundos de quintais. Ele polui a terra onde é diretamente depositado e a torna inutilizável por centenas de anos (grande parte da cidade está construída sobre terrenos contaminados); o chorume que escorre do lixo se infiltra pela terra e contamina os córregos, lagos, represas quanto e lençóis freáticos subterrâneos (há indícios de que o Aquífero Guarany, maior reservatório subterrâneo de água do mundo e que está parcialmente localizado embaixo da cidade de São Paulo, já esteja recebendo contaminantes oriundos do lixo); finalmente, por meio de suas reações químicas que produzem gases tóxicos e cancerígenos como o metano e o arsênio, o lixo também contamina o ar que as pessoas respiram. A Organização Mundial da Saúde - OMS, reconheceu em relatório recente que o ar que se respira nas grandes cidades provoca câncer e doenças respiratórias letais. O simples fato de morar perto de um aterro sanitário aumenta em 20% as chances de uma pessoa contrair câncer.
A cidade de São Paulo produz aproximadamente 20 mil toneladas de lixo residencial por dia que passam pelo sistema oficial de pesagem. Para a maioria das pessoas esse é um problema invisível, elas pensam que o problema não existe porque acreditam que a prefeitura dá uma destinação correta ao lixo que é recolhido da calçada, mas não é bem assim. Para começo de conversa existe muito lixo que não é recolhido pelas concessionárias e acabam emporcalhando as vias públicas e contaminando os mananciais. A parte que a prefeitura recolhe é transportada e depositada, sem nenhuma forma de tratamento, em um aterro sanitário que, como a própria palavra diz, é um grande buraco onde a prefeitura esconde o lixo e joga terra em cima. Para construir um desses aterros a prefeitura destruiu em 2010 uma área de mais de um milhão de metros quadrados de mata atlântica na APA Cabeceiras do Aricanduva que a população local preferia ver transformada em um parque ecológico. Em menos de três anos o aterro já está se esgotando, a prefeitura nem realizou as obras de compensação do aterro construído e já quer construir outro. Se a cidade não mudar a politica de aterros, em um futuro próximo a cidade precisará jogar lixo na Mata do Carmo, na Serra da Cantareira, na APA Capivari Monos, no Parque do Estado e em qualquer lugar que tenha um restinho de natureza.
Fieis à nossa missão de jardineiros de Deus (Gn 2, 15) não podemos nos conformar com soluções velhas que beneficiam apenas os eternos empresários do lixo, por isso elaboramos, junto com os movimentos populares e assessoria independente da prefeitura e de suas concessionárias, uma proposta de gestão de resíduos em que o lixo recolhido deve ser tratado: separado; reciclado; convertido em energia; combustíveis; adubos; fertilizantes; e uma infinidade de matérias primas e produtos com alto valor agregado. Para o aterro deve ser destinado apenas aquela parte dos resíduos que ainda não pode se reciclada (menos de 10% do total). Para implantar esse novo sistema será necessário quebrar o monopólio dos aterros sanitários e permitir que diferentes tecnologias de tratamento de resíduos, inclusive de sua parte orgânica, também possam participar das licitações.
A cidade não pode ficar refém dos aterros sanitários, a luta contra o lixo requer um esforço muito grande e deve contar com a colaboração de todas as tecnologias e alternativas disponíveis para a minimização de seus impactos negativos. O novo sistema não requer a destruição de uma nova área a cada 5 anos para confinar o lixo; deverá incentivar as cooperativas de catadores; criará milhares de novos empregos; transformará uma atividade dispendiosa para a prefeitura em uma atividade lucrativa e reduzirá a demanda pela extração de novas matérias primas da natureza.
São Paulo não precisa de mais aterros sanitários. Precisa é garantir o direito constitucional de um ambiente saudável para a sua população.
Pastoral da Ecologia da Arquidiocese de São Paulo