Os êxitos da diplomacia russa no Médio Oriente
Thierry Meyssan
As mudanças políticas que transformam o Médio Oriente desde há dois meses são a resultante não do esmagamento dos protagonistas, mas da evolução dos pontos de vista iraniano, turco e emiradense. Lá onde o poderio militar norte-americano falhou, a subtileza diplomática triunfou. Recusando pronunciar-se sobre os crimes de uns e de outros, Moscovo consegue lentamente pacificar a região.
Nos últimos cinco anos, a Rússia multiplicou as iniciativas para restabelecer o Direito Internacional no Médio Oriente. Ela apoiou-se em especial no Irão e na Turquia, dos quais não partilha, no entanto, a maneira de pensar. Os primeiros resultados deste paciente exercício diplomático redesenham as linhas de partilha no meio de vários conflitos.
Novas relações de força e um novo equilíbrio instalam-se discretamente no vale do Nilo, no Levante e na península Arábica. Pelo contrário, a situação bloqueia-se no Golfo Pérsico. Esta enorme e coordenada mudança toca diferentes conflitos aparentemente sem relação entre eles. É o fruto da paciente e discreta diplomacia russa [1] e, em certos dossiês, da relativa boa vontade dos EUA.
Ao contrário dos Estados Unidos, a Rússia não procura impor a sua visão do mundo. Ela parte, pelo contrário, da cultura dos seus interlocutores que, com o seu contacto, por pequenos passos modifica.
Recuo dos jiadistas e dos mercenários curdos na Síria
Tudo começou a 3 de Julho : um dos cinco fundadores do PKK, Cemil Bayik, publicava uma coluna de opinião no Washington Post apelando à Turquia para encetar negociações levantando o isolamento do seu prisioneiro mais célebre : Abdullah Öcalan [13], o que lhes permite manter uma linha política sempre coerente.
Neste dossiê, o Irão dá provas de uma grande tenacidade. Apesar da viragem clerical na eleição do Xeque Hassan Rohani, em 2013, o país reorienta-se para a política nacional do laico Mahmoud Ahmadinejad [14]. A sua instrumentalização das comunidades xiitas na Arábia Saudita, no Barém, no Iraque, no Líbano, na Síria, no Iémene poderá acabar por se tornar um simples apoio. Aqui ainda, foi graças às longas conversações de Astana que aquilo que é evidente para uns se acabou tornando também para os outros.
Conclusão
Com o tempo, os objectivos de cada protagonista se hierarquizam e as suas posições definem-se.
De acordo com a sua tradição, a diplomacia russa não busca, ao contrário dos Estados Unidos, redesenhar as fronteiras e as alianças. Ela tenta deslindar os objectivos contraditórios dos seus parceiros. Assim, ela ajudou o velho Império Otomano e o antigo Império Persa a afastarem-se da sua definição religiosa (os Irmãos Muçulmanos para o primeiro, o Xiismo para o segundo) e a regressar a uma definição nacional pós-imperial. Esta evolução é muitíssimo visível na Turquia, mas supõe uma mudança de chefias no Irão para ser realizada. Moscovo não busca «mudar os regimes», mas, apenas certos aspectos das mentalidades.
Thierry Meyssan
Tradução
Alva
[1] Ver os parágrafos 3, 4, 5 e 10 da « Déclaration conjointe de la Russie, de l'Iran et de la Turquie relative à la Syrie », Réseau Voltaire, 2 août 2019, e compará-los com as declarações das reuniões precedentes.
[2] "Now is the moment for peace between Kurds and the Turkish state. Let's not waste it", by Cemil Bayik, Washington Post (United States) , Voltaire Network, 3 July 2019.
[3] "A Turquia não se alinhará nem com a OTAN, nem com a OTSC", "A Turquia renuncia pela segunda vez ao Califado", Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 6 & 13 de Agosto de 2019.
[4] "Os projectos de Curdistão", Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 5 de Setembro de 2016.
[5] "Exclusivo : Os projectos secretos de Israel e da Arábia Saudita", Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 22 de Junho de 2015.
[6] "إيران والإمارات توقعان اتفاقا للتعاون الحدودي", RT, 01/08/19.
[7] "Missile fired by Yemen rebels kills dozens of soldiers in port city of Aden", Kareem Fahim & Ali Al-Mujahed, The Washington Post, August 1, 2019.
[8] "O derrube de Omar al-Bashir", Thierry Meyssan; "O Sudão passou para o controle saudita", "A Força de reacção rápida no Poder no Sudão", Tradução Alva, Rede Voltaire, 6, 23, 30 de Abril de 2019.
[9] "Face ao Irão, Londres defende as suas sobras do Império", Thierry Meyssan, Tradução Alva, Al-Watan (Síria) , Rede Voltaire, 26 de Julho de 2019.
[10] "A nova Grande Estratégia dos Estados Unidos", Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 26 de Março de 2019. "Advancing the U.S. Maximum Pressure Campaign On Iran" (Note: The graph was distributed with the text !), Voltaire Network, 22 April 2019.
[11] "Reino Unido / Irão: «Grace 1» e «British Heritage»", Tradução Alva, Rede Voltaire, 12 de Julho de 2019.
[12] « Déclaration conjointe des chefs d'État et de gouvernement de France, d'Allemagne et du Royaume-Uni à propos de l'Iran », Réseau Voltaire, 14 juillet 2019.
[13] "Russian comment on the seizure of the Panama-flagged tanker by Gibraltar authorities ", Voltaire Network, 5 July 2019.
[14] Como laico, nós pensamos que o muito místico Presidente Ahmadinejad queria separar as instituições religiosas e políticas e por fim à função platoniana do Guia da Revolução.
Thierry Meyssan
Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: Sous nos yeux. Du 11-Septembre à Donald Trump. Outra obras : L'Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y desinformación en los medios de comunicación(Monte Ávila Editores, 2008).
Fonte : "Os êxitos da diplomacia russa no Médio Oriente", Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 21 de Agosto de 2019, www.voltairenet.org/article207392.html