Entre os dois candidatos à presidência dos EUA, Donald Trump era o favorito na esmagadora maioria dos países da Europa, incluindo na Rússia. Tal pode ser explicado graças a uns quantos factores: os laços corruptos de Hillary Clinton e o seu estado de saúde, uma visão patriarcal dos sistemas políticos e as expectativas de querer algo novo por parte de um candidato de fora do sistema.
Leonid Savin
Se avaliarmos os candidatos presidenciais da perspectiva dos interesses nacionais da Federação Russa, há então uma série de linhas claras que indiciam que Donald Trump é preferível a Hillary Clinton para o posto de presidente dos EUA.
1. As afirmações da ex-secretária de Estado revelaram várias vezes que ela própria é uma feroz russófoba. Os russos não estão cientes das reais intenções de Trump, mas este não teve o cuidado de não fazer quaisquer comentários rudes ou pouco éticos acerca da Federação Russa, a sua liderança ou o povo russo. Consequentemente, é visto como uma figura mais benévola.
2. Trump representa o Partido Republicano, cujos representantes tradicionalmente se regem pela escola realista nas relações internacionais. Mesmo durante a presidência de George W. Bush, apesar da intervenção no Iraque, os EUA não foram além dos seus limites como sucedeu sob a Administração Obama, que representa o campo Democrata.
Vale a pena recordar que mesmo antes de Obama, os Democratas levaram a cabo de modo reincidente várias intervenções e bombardeamentos unilaterais na Somália (1993), no Haiti (1995), na Bósnia (1995), no Sudão e no Afeganistão (1998) e na Jugoslávia (1999). A noção da "responsabilidade de protecção" própria que tem sido utilizada para justificar as suas "intervenções humanitárias" surgiu sob os Democratas. O próprio George Bush Jr. limitou-se a aceitar o legado e os clichés Democratas das agressões liberais.
Uma vez que a Rússia também se rege pela escola realista, o diálogo entre os dois países será mais claro e mais compreensivo ao abrigo de uma presidência Trump. Tanto os EUA como a Rússia irão respeitar os interesses geopolíticos um do noutro na complexidade do ambiente global.
3. Sob a presidência de George W. Bush, em 2003 inicia-se a ocupação americana do Iraque, a qual deu lugar à guerra civil e ao terrorismo na região do Médio Oriente, incluindo o surgimento do EIIL.
A campanha contra o Iraque foi impulsionada pelos neo-conservadores que tinham infiltrado o Partido Republicano e que agora apoiam Hillary Clinton. Assim sendo, o perigo da paranóia neo-conservadora poderia ter-se repetido caso Clinton se tivesse tornado presidente.
4. Donald Trump aparenta ser um candidato confiante e disposto a reconhecer e a corrigir os seus erros. Quando, inesperadamente, foi convidado pelo presidente do México para visitar o seu país, este acedeu de imediato e concretizou a visita. Tal sucedeu apesar dos seus duros comentários prévios acerca dos migrantes mexicanos. É provável que Trump vislumbre os assuntos relacionados com a Rússia e a Eurásia de um modo que possa beneficiar as duas potências.
Clinton reagiu ao convite do presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, de modo vago e sem sentido, característicos do actual sistema político dos EUA como um todo.
Os líderes do sistema não têm uma compreensão clara das estratégias a adoptar no futuro e têm receio de dar quaisquer passos em frente. Tal parece bastante estranho não só para os observadores externos, mas também para os eleitores americanos que no passado já tiveram políticos confiantes para lhes servirem de exemplo.
5. A Rússia, que sofreu pesadas baixas nas duas guerras mundiais, sabe avaliar o custo das vidas humanas. Tal faz parte da cultura estratégica russa que se correlaciona directamente com políticas demográficas e as suas respectivas decisões políticas. Embora a influência do liberalismo destrutivo dos anos 90 permaneça na Rússia, as tradições familiares estão a reavivar-se com o auxílio do Estado, bem como das instituições públicas e religiosas.
Hillary Clinton é pró-escolha, i.e., pela legalização do aborto, inclusive nos casos que violam a Convenção dos Direitos das Crianças da ONU, enquanto Donald Trump se tem manifestado de modo claro como sendo pró-vida, i.e., favorável a restrições quanto ao aborto.
Claro, estas são só as principais características que manifestam que Trump é visto de um modo mais favorável para a Rússia. É frequente em política que em tempos incertos as personalidades imprevisíveis possam agir de modo completamente oposto. Contudo, mesmo uma breve análise como a que apresentamos nos pontos acima indicia nuances suficientemente importantes que serão cruciais nas relações entre a Rússia e os EUA.
De qualquer modo, a Rússia não pôde influenciar as decisões dos cidadãos americanos. Foram eles que escolheram o seu próximo presidente e o futuro do seu país para os próximos quatro anos.
Fonte: Katehon
Tradução: Flávio Gonçalves