Moscou (Prensa Latina) Na conformação de uma ordem mundial policêntrica e multipolar, Rússia, América Latina e Caribe avançaram em 2014 para maiores convergências no plano político e uma crescente complementariedade na esfera econômica.
Uma mensagem do presidente Vladimir Putin à XIII Cúpula da Aliança Bolivariana aos Povos de Nossa América-Tratado dos Povos (ALBA-TCP) refletiu em meados de dezembro essa comunidade de interesses.
Putin realçou no texto o merecido prestígio internacional ganhado por essa organização integracionista ao demonstrar, em 10 anos de existência, eficácia e boas perspectivas para a cooperação regional.
Realçou que seus participantes põem em prática o ideário de Simón Bolívar a respeito da integração dos países latinoamericanos e caribenhos sobre a base de coincidências históricas, étnicas, culturais e da proximidade de seus interesses políticos e econômicos.
Em referência aos assuntos internacionais, o líder russo expressou grande apreço pela linha construtiva dos estados da ALBA, e sublinhou que Moscou compartilha com eles a fidelidade aos princípios de uma ordem mundial justa e democrática sustentada nas normas do direito Internacional com a ONU em um papel central.
Com satisfação, destacou o caráter amistoso e de sócios nos laços bilaterais estabelecidos com os membros da aliança e reafirmou o interesse de continuar ampliando o diálogo e a interação prática, tanto sobre bases bilaterais como multilaterais.
"Estou seguro que isto corresponde com os interesses fundamentais de nossos povos e avança pelo caminho de assegurar a paz, a estabilidade na América Latina e no mundo inteiro", concluiu Putin.
Ao referir-se à ALBA como um ator de importância no mundo atual, o vice-diretor do Departamento da América Latina da chancelaria da Rússia, Alexander Khokholikov, qualificou de impressionante que em uma década o produto interno bruto destes países cresceu 25% no meio da crise econômica global.
"O agrupamento integracionista também tem demonstrado sua independência política, incluindo o apoio decisivo frente a tentativas de desestabilizar a ordem na região e frente aos acontecimentos internacionais", expressou o servidor público diplomático a Imprensa Latina.
Khokholikov qualificou como importante a declaração emitida por membros da ALBA em agosto de 2008 em relação a agressão da Georgia contra Tsinvalí, na Ossétia do Sul, e a operação militar humanitária de resposta levada a cabo pela Rússia.
"Igualmente, Cuba e Venezuela têm desempenhado um papel decisivo de apoio em nossas ações para conseguir uma solução política na Síria", acrescentou.
Queremos agradecer que em meio a uma pressão muito forte por parte de Estados Unidos e os países de Ocidente, os integrantes da ALBA têm recusado sempre as sanções que se tentam impor a Rússia, sublinhou o vice-diretor.
Khokholikov expressou um agradecimento especial a Bolívia, Cuba, Nicarágua e Venezuela, que em março de 2014 votaram na contramão de um projeto de resolução na Assembléia Geral de Nações Unidas (ONU) contra a Rússia por sua posição frente a crise criada na Ucrânia com a ruptura da ordem constitucional no último 22 de fevereiro.
No plano político, também autoridades governamentais e legislativas russas expressaram sua rejeição à guerra continuada contra Venezuela e seu presidente, Nicolás Maduro, mediante violência extremista interna e a difamação midiática internacional.
Quanto a Cuba, a Duma estatal (câmara baixa parlamentar russa) e a Chancelaria expressaram de maneira oficial e na ONU sua rejeição ao bloqueio econômico, comercial e financeiro dos Estados Unidos contra a ilha.
Demandaram, assim mesmo, a exclusão da maior das Antillas da lista de países que patrocinam o terrorismo, criada de maneira arbitrária por Washington para justificar sua represália a mais de meio século contra mais de 11 milhões de pessoas.
Ao mesmo tempo, as autoridades russas insistiram na demanda da libertação de Gerardo Hernández, Ramón Labañino e Antonio Guerreiro, os três antiterroristas que recentemente regressaram a Cuba.
Eles, junto a René González e Fernando González, conformavam o grupo conhecido mundialmente como os Cinco, que monitorava grupos extremistas nos estados unidos que preparavam ações violentas contra seu país.
René e Fernando retornaram anteriormente a Cuba, depois de completamente retiradas suas condenações.
O presidente Vladimir Putin acentuou entre 11 e 16 de julho de 2014 o interesse da Rússia pela America Latina e o Caribe ao completar nesta região a volta mais longa até o momento em seu terceiro mandato.
Fontes do Kremlin precisaram que só a viagens em avião o estadista dedicou 46 horas, e durante o périplo planificado inicialmente para Cuba, Argentina e Brasil, acrescentou a Nicarágua, no que constituiu a primeira visita de um chefe de Estado russo a Managua em 70 anos de relações diplomáticas.
Putin reuniu-se em Havana com o líder histórico da Revolução cubana, Fidel Castro, e com o presidente, Raúl Castro. Os dois mandatários assistiram à assinatura de uma dezena de acordos de relevância para a colaboração econômica entre as partes.
Ante a imprensa, o estadista cubano destacou a decisão de Moscou de anular 90% da dívida cubana com a antiga União Soviética, e o acordo de que se invista os outros 10% restante -uns três mil 500 milhões de dólares- em projetos sociais em Cuba.
Em Managua, com seu par Daniel Ortega, Putin constatou o excelente estado das relações políticas e analisou diversos projetos econômicos, entre eles a possível participação de empresas russas nas obras do canal interoceânico da Nicarágua.
Precedida por uma atmosfera contaminada pelas sanções econômicas dos Estados Unidos e seus aliados contra Rússia, devido a sua crítica posição frente ao golpe de estado de 22 de fevereiro na Ucrânia, ocorreu a escala em Buenos Aires.
Ao se encontrar com a presidenta Cristina Fernández, Putin enfatizou na importância estratégica deste país para Moscou, como um dos grandes produtores de alimentos do planeta e na possibilidade de avançar em projetos inovadores conjuntos para fomentar tecnologias e mercadorias de alto valor agregado.
Uma reunião com o mandatário uruguaio, José Mujica, sustentou Putin na Argentina antes de continuar viagem para Brasil, onde conversou com a chefa de Estado, Dilma Roussef, e posteriormente participou na cúpula do grupo Brics (Brasil, Rússia, Índia, Chinesa e África do Sul).
À margem dessa reunião multilateral, no Brasil o chefe do Kremlin e seus pares do Brics expuseram ante os 12 presidentes da União de Nações do Sul (Unasul) as possibilidades que oferece aos países em via de desenvolvimento o banco criado por este grupo emergente.
Em formato bilateral, assim mesmo, Putin dialogou no Brasil com os titulares da Bolívia, Chile, Colômbia, Peru, Uruguai e Venezuela.
Desde o ponto de vista econômico-comercial, fontes do Kremlin informaram que as negociações e acordos especificados ao longo da viagem do líder russo se relacionam com energética, transporte, defesa, indústria espacial e maquinaria pesada.
Estamos interessados em uma América Latina unida, forte, economicamente sustentável e politicamente independente, que se esteja convertendo em uma parte importante do mundo policêntrico e emergente, expressou Putin ao resumir o objetivo da sua viagem.
Ao abordar o tema em entrevista concedida em julho a Imprensa Latina, Putin enfatizou na importância que Moscou confere a ALBA-TCP, Unasul, o Mercado Comum do Sul (Mercosul), o Sistema de Integração Centroamericana (SICA), a Comunidade do Caribe (Caricom) e a Comunidade de Estados Latinoamericanos e Caribenhos (Celac).
Especificou o estadista que Moscou está interessado em criar alianças plenas, tecnológicas, de projetos e produção com os países da região e aproveitar ao máximo as possibilidades das economias complementares.
A respeito, sublinhou Putin as possibilidades que oferece a cooperação em matérias tão importantes como as petroleira e gasífera, a hidroenergia e a energia atômica, a construção de aviões e de helicópteros, as infraestruturas e, nos últimos tempos, também a biofarmácia e a tecnologia da informação.
De maneira reiterada, o chanceler, Serguei Lavrov, fez questão da importância de que se estabeleçam intercâmbios concretos entre as estruturas de integração da America Latina e o Caribe e a União Econômica Euro-asiática que em 1 de janeiro de 2015 fundarão oficialmente Bielorrússia, Cazaquistão e Rússia.
Espera-se que Armênia e Kirguistão se somem como membros de pleno direito, em decorrência do novo ano, a este mercado de mais de 180 milhões de habitantes.
Apesar da crise da economia global desde 2008, uma tendência crescente caracteriza o intercâmbio comercial entre Rússia e América Latina nos últimos anos. O movimento de mercadorias em uma e outra direções registrou um custo em 2012 superior aos 15 bilhões de dólares e em 2013 superou os 18 bilhões dessa moeda, segundo o vice chefe de departamento na chancelaria russa Alexandr Khokholikov.
Mas para além das cifras, uma análise qualitativa confirma que naves de fabricação russa propiciaram a reanimação da frota da linha comercial Cubana de Aviação a partir de 2006, quando a indústria aeronáutica de Moscou cumpria uma década sem exportar um desses aparelhos.
Nicarágua negocia na atualidade um projeto similar ao de Cuba para fomentar voos comerciais com aviões próprios, segundo fontes da chancelaria do país centro-americano.
A experiência exitosa da maior das Antilhas, também estimulou à mexicana Interjet a comprar 20 naves russas para voos regionais SuperJet-100 e, segundo seu serviço de imprensa, analisa a possibilidade de realizar novo pedido.
Outro exemplo de complementaridade, constitui a marcada presença de tecnologia russa em projetos de geração energética em diversos países latino-americanos e caribenhos e, inclusive, a valoração de criar empresas mistas no campo do uso pacífico do átomo com Brasil e Argentina, também fabricantes de centrais nucleares.
Uma opção confiável e eficaz em frente às tentativas de Estados Unidos de midiatizar a independência e a soberania dos povos latino-americanos mediante o boicote e até de possíveis agressões são os armamentos e outros meios militares de fabricação russa, cuja presença é notória em diversos países da região.
Diferentes ofertas da indústria espacial e o sistema russo de navegação e posicionamento do satélite Glonass abrem diversas possibilidades à zona que se estende do Rio Bravo à Patagônia, enquanto a Moscou lhe permite localizar nesse território pontos de recepção necessários para operar globalmente esse complexo.
No entanto, a complementaridade, não só econômica, mas também política entre Rússia e América Latina ficou evidenciada como resultado da onda de sanções impostas pelos Estados Unidos e seus aliados como represália ante a rejeição de Moscou ao golpe de estado promovido pelo Ocidente em Kiev em fevereiro de 2014.
Um decreto promulgado por Putin em 6 de agosto em resposta a sanções do Ocidente contra o setor agroindustrial nacional, vetou o rendimento de carnes, pescado, queijos, leite e produtos lácteos, bem como frutas e vegetais provenientes de Austrália, Canadá, Estados Unidos, União Europeia (UE) e Noruega.
A veda às importações de alimentos regerá por um ano e estará em dependência dos enfoques construtivos de parte dos estados ocidentais, segundo explicou o primeiro ministro, Dmitri Medvedev.
O Serviço russo de Controle Veterinário e Fitossanitário confirmou que de imediato começaram a chegar a Moscou as ofertas de centenas de empresas latino-americanas desejosas de incrementar suas vendas e ocupar este nicho de mercado.
Serguei Dankvert, máxima autoridade regulamentar em matéria de alimentos neste país, estimou em agosto as necessidades da Rússia neste setor em mais de 18 bilhões de dólares.
A União Europeia (UE), por sua vez, ignorou as regras da Organização Mundial do Comércio e tratou de pressionar às nações latino-americanas para que renunciassem a incrementar suas ofertas a Rússia.
Uma síntese da independência e soberania política que caracteriza aos povos da região na atualidade ficou refletida na declaração do presidente equatoriano, Rafael Correia, ao conhecer as tentativas intimidatórias da UE.
Equador não pedirá permissão a ninguém para vender alimentos a países amigos, advertiu o dignitário sul-americano.
Tal postura se evidência hoje na presença dos armazéns russos de maiores volumes de carnes, pescado, frutas, vinhos, grãos e outros alimentos procedentes de nações que vão desde México até Chile.
Segundo as estatísticas, Cazaquistão é o país de maior incremento no fornecimento de carne a Moscou (475%), seguido de Nicarágua com 173 unidades sobre 100, e Argentina com 146 pontos percentuais.
A NOVA IMAGEM DE CUBA
Dentro deste contexto, no começo de dezembro provocou uma grata acolhida entre os moscovitas a oferta mais atual de Cuba, como outra mostra das possibilidades de complementaridade entre as economias do estado euro-asiático e as dos países latino-americanos e caribenhos.
O seminário "Pesquisando o novo: os sucessos da medicina cubana para o mercado russo" centrou o interesse de dezenas de profissionais do setor na Feira Internacional Saúde-2014 no Centro de Exposições de Moscou.
Organizado pela Câmera de Comércio de Cuba e com a participação de especialistas de alta qualificação, o foro mostrou aos anfitriões projetos inovadores na indústria biotecnológica, a produção de vacinas, preparados naturais, medicina nuclear e serviços médicos.
De grande impacto resultou a exposição da doutora Carmen Deita, gerente regional de vendas na Comunidade de Estados Independentes de HeberBiotech SA, representante comercial exclusivo do Centro de Engenharia Genética e Biotecnologia (CIGB) de Havana.
Em sua conferência "Indústria farmacêutica cubana é virada para a saúde", Deita realçou a alta eficácia do produto Hebertprot-P na luta por evitar amputações no pé dos doentes de diabetes mellitus.
Segundo as estatísticas russas, por causa desta doença a cada ano sofrem amputação cerca de 30 mil pessoas, e a notícia de que 17 de fevereiro último foi registrado este medicamento em Moscou constitui uma verdadeira esperança para os aproximadamente 3 milhões de pacientes deste mau no estado euro-asiático.
Muito interesse provocaram também as propostas anticancerígenas do Centro de Imunologia Molecular (CIM) e da empresa Labiofam; bem como contribuição de especialistas da Agência de Energia Nuclear de Cuba em processos de diagnóstico e terapêuticos com membranas anti ulcerosas, equipes médicas laser e detectores de grande utilidade na cardiologia.
Laboratórios Dalmer SA apresentou sua faixa de produtos inovadores de impacto na melhoria da qualidade de vida, e perguntas e negociações originou uma conferência sobre o Centro de Histoterapia Placentaria, especializado em patologias da pele e o cabelo.
O seminário e a mostra de todos estes produtos durante uma semana em um estande de 30 metros quadrados na feira, permitiu entender a muitos por que uma pequena ilha do Caribe é capaz de enviar centenas de profissionais a lutar na África contra o Ébola.
* Correspondente de Imprensa Latina na Rússia.
Texto: / Postado em 01/01/2015 ás 12:38
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