EUA e Rússia concordam em deixar rolar a bola na Ucrânia
Conforme já escrevi no postado de ontem[1] - e diferente do que a imprensa-empresa está informando (que a reunião de cinco horas entre os ministros de Relações Exteriores da Rússia e dos EUA em Londres na 5ª-feira teria fracassado) - os dois diplomatas, sim, abriram uma via para negociações sérias.
O entendimento alcançado na reunião de Londres parece ser que o referendo na Crimeia prosseguirá, mas a Rússia adiará a decisão de responder ao resultado do referendo; e que Moscou e Washington manterão as consultas.
Por sua vez, os EUA e seus aliados podem vir a impor sanções contra a Rússia, além das sanções apenas cosméticas anunciadas antes.
Significativamente, foi o secretário de Estado dos EUA John Kerry quem telefonou ao ministro russo de Relações Exteriores Sergey Lavrov, no sábado. Isso apesar de já se saber que o referendo na Crimeia seria, sim, realizado no domingo, e da alta probabilidade de que o povo escolha unir-se à Rússia.
Já estava claro, de fato, desde quando Kerry informou o presidente Obama sobre o andamento dos entendimentos em Londres e retornou para retomar a conversação com Lavrov.
O Ministério de Relações Exteriores em Moscou revelou: "Lavrov e Kerry concordaram em manter os contatos em busca de solução para a situação na Ucrânia, com reforma constitucional a ser feita o mais depressa possível, acompanhada pela comunidade internacional de forma aceitável para todos, com o devido respeito aos interesses de todas as regiões da Ucrânia."
Sim, é importante passo adiante e bem obviamente foi ideia que Obama já adiantara.[2] De fato, a ideia pode ser que se deve encontrar meio pelo qual as reformas constitucionais na Ucrânia respeitem também os interesses vitais da Rússia.
O pensamento parece ser fixar fundamentos constitucionais que assegurem que o governo em Kiev não poderá impor decisões inaceitáveis para a Crimeia ou outras regiões do campo russo. Significa que nenhum maioritarismo pode prevalecer numa sociedade multicultural como é a Ucrânia.
O Ministério de Relações Exteriores da Rússia falou de um papel a ser desempenhado pela comunidade internacional "de forma aceitável para todos" - o que significa que a Rússia poderia estar diretamente envolvida de algum modo em qualquer processo que leve a mudanças constitucionais na Ucrânia.
A declaração do Ministério de Relações Exteriores da Rússia também dava a impressão de que Washington está sensível à profunda ansiedade que se vê em Moscou, ante a ascensão ao poder de grupos ucranianos ultranacionalistas.
Lavrov procurou a intervenção de Washington junto às autoridades em Kiev para pôr sob controle aqueles grupos radicais; e Kerry, parece, respondeu que os EUA estavam agindo e seus esforços dariam resultado. Lavrov e Kerry concordaram em manter futuros "encontros de trabalho" sobre a Ucrânia.
Notícias de Kiev sugerem que foi aberto o acesso a bases militares ucranianas e a instalações na Crimeia, para reabastecimento de suprimentos ao pessoal, nos dois casos. Deve-se pressupor que os ministros da Defesa de Rússia e Ucrânia estiveram em contato. Se foi assim, é mais um sinal de que as previsões catastrofistas da imprensa-empresa sobre as conversações de Londres e as recriminações retóricas estão comprovadamente erradas. *****
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[1] http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2014/03/15/us-russia-avoid-showdown-over-crimea/
[2] 13/3/2014, "Obama faz uma oferta no caso da Crimeia", MK Bhadrakumar, Indian Punchline, traduzido em http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2014/03/obama-faz-uma-oferta-no-caso-da-crimeia.html
16/3/2014, MK Bhadrakumar, Indian Punchline
http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2014/03/16/us-russia-kick-ukraine-can-down-the-road/