Colômbia envia clamores crescentes de esperança
A sociedade está farta dos recursos cruentos, detesta os espetáculos de sangue, os atentados que não conduzem a nada, o medo introjetado nas populações ameaçadas
Por Gabriel Ángel
Nos inícios desta semana se cumpriu o terceiro encontro entre dirigentes do partido Farc e os representantes de 30 das famílias que se tornaram vítimas do atentado ao clube El Nogal há 15 anos. A imprensa registrou a reunião, sem poder ocultar o caráter profundamente humano dela, caracterizada por profundos sentimentos compartilhados de dor, reconciliação e perdão.
Resultam comovedoras em sua grandeza de alma as declarações de vários representantes das vítimas, os quais reconhecem e agradecem o gesto dos antigos chefes guerrilheiros. Para eles, que sentiram no mais íntimo de seu ser, inclusive em seus corpos, as feridas de tão terrível fato, conhecer a verdade se converteu numa autêntica reparação.
Por isso reclamam a parte dela que corresponde ao governo da época e aos grupos paramilitares. Sentem e sabem que a Farc deu tudo de si. Puderam conversar, intercambiar, compreender as razões dos outros. E contra qualquer manifestação de ódio e retaliação outorgaram livre e espontaneamente seu perdão.
Não faltam os que tacham o encontro de representação teatral e síndrome de qualquer coisa. Nosso país é tristemente assim. Existem grupos e pessoas que não podem entender caminhos distintos aos do envenenamento e da matança. Cada vez que falam ou escrevem destilam um mesmo propósito, escandalizar, incendiar, semear e alimentar discórdia.
Mais que rechaço, creio que as permanentes incitações à vingança e ao emprego da força bruta geram em Colômbia uma verdadeira repugnância entre um número cada vez maior número de seus habitantes. Porque os discursos da extrema-direita, em qualquer de suas variantes, exalam odor de imundície.
E obviamente enojam a uma crescente porcentagem de compatriotas. É certo que existe o fundamentalismo mais grotesco. Basta ouvir por exemplo ao senhor Ordóñez ou ler a José Obdulio. Qualquer pessoa que expressa num twitter ou um estado seus afetos pela reconciliação é objeto imediato dos mais baixos impropérios. Há aqueles que gozam ao vilipendiar, ameaçar, insultar.
Há aqueles que se sentem importantes durante um minuto, porque conseguiram inventar a mais suja calúnia ou criar a mais desprezível das frases. Alguém se pergunta como serão em sua vida pessoal e social tais indivíduos. Facilmente compreende que personagens assim não podem estimular o afeto nem a solidariedade geral, por mais ruidosos que sejam. Vão a caminho da derrota.
Há limites que uma sociedade, por mais afetada que se encontre pelo consumismo e pela alienação midiática, não admite que se ultrapassem. A sensatez e o sentido comum jogam ao final um papel determinante. Ao fim e ao cabo todos temos filhos e filhas, mães, irmãos, vizinhos, amores. Não podemos conduzi-los ao caos por obra de nossa loucura.
Paradoxalmente, os mais agressivos, os mais hostis a qualquer forma de entendimento, os que só veem na violência o caminho, os pregadores da insídia e do apedrejamento, os mais propensos ao linchamento de seus adversários, são os que mais condimentam seu discurso com o medo do caos que nasceria do acesso dos pacifistas ao governo e ao poder.
Os que só veem na violência o caminho, são os que condimentam seu discurso com o medo do caos que nasceria do acesso dos pacifistas ao governo e ao poder.
Com independência das situações econômicas, sociais ou políticas em que se debatem sociedades como Cuba ou Venezuela, se torna da maior importância voltar os olhos ao caos em que se debate a sociedade colombiana hoje, com os assassinatos e a perseguição política, os graus da corrupção, o poder das máfias e as carências suportadas pelas grandes maiorias.
Ademais do perigoso nível de violência em suas mais diversas manifestações. Há delinquência desenfreada, insegurança, bandos de todo tipo, ao qual se quer acrescentar hoje a rixa e o enfrentamento por razões políticas. E, o que se torna mais desafortunado na hora, a insistência em seus ataques e atentados pelos resíduos de insurgência que persistem.
A sociedade colombiana se encontra farta dos recursos cruentos, detesta sobremaneira os espetáculos de sangue, os atentados que não conduzem a nada, o medo introjetado nas populações ameaçadas. Ninguém que se dedique a isso conseguirá seu carinho, por mais que em sua confusão mental o creia e apregoe. A única coisa que soma hoje é a busca da paz.
Por isso mesmo perdem seu tempo os fanáticos que em nome de umas supostas Farc, que só existem em suas cabeças delirantes, difundem pelas redes novos chamados à guerra, fundamentando-se nas mais ridículas imputações. Sua linguagem de meio século atrás não instiga mais que lástima.
Quem seja o que os inspira e os ergue só demonstra uma cegueira e uma demência absolutas.
Estamos com a Colômbia que sonha com um caminho distinto ao do rancor e da retaliação. Essa Colômbia que envia clamores crescentes de esperança, que avança sorridente contra a amargura e o terror.
Tradução > Joaquim Lisboa Neto