O dia seguinte

O Brasil começou o ano 2017 mais pobre politicamente. Os novos prefeitos das principais capitais brasileiras representam uma volta a um passado que o Brasil parecia já ter superado e provocam um sentimento de desalento entre aquelas pessoas que acreditam ainda que o posicionamento político de cada um deles deveria ser fator fundamental para sua escolha ou rejeição pelo eleitorado.

A primeira constatação, é que os principais partidos brasileiros, que disputavam a liderança política do País, foram substituídos por outros, dos quais a maioria dos eleitores certamente não tem a mínima ideia do significado de suas siglas.

Mesmo os eleitos por siglas mais tradicionais, em muito pouco representam as ideias que, em algum momento, sustentaram ideologicamente seus partidos.

Com o PT e o PMDB varridos da disputa eleitoral nas principais capitais, sobraram, dos partidos mais tradicionais, o PSDB, PSB e o DEM, mas mesmo eles buscaram candidatos que, de alguma maneira, se sustentaram em outros valores.

Em Salvador, ACM Neto foi reeleito pelo DEM, amparado pela imagem do avô, Antônio Carlos Magalhães, o lendário Toninho Malvadeza.

Em Recife, Geraldo Júlio, foi reeleito pelo PSB, partido que hoje é socialista apenas no nome, abençoado pela lembrança de Eduardo Campos, morto em acidente aviatório quando em campanha para presidente em 2014.

O PSDB, elegeu João Dória em São Paulo e Marchezan Júnior em Porto Alegre, com o tradicional discurso em favor do estado mínimo que o partido sempre fez e da defesa dos conceitos neoliberais, mas com estratégias de marketing que "venderam" um velho produto, com uma imagem recauchutada de novo. Ou seja, um caso clássico de propaganda enganosa.

Nas outras grandes capitais, chegaram à prefeitura, políticos que representam correntes religiosas das mais retrógradas, como Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro, com o seu esquecível Partido da República Brasileira; que representam apenas a paixão de torcedores por um time de futebol, como Alexandre Kalil, em Belo Horizonte, que concorreu pelo PHS, mas que poderia trocar a legenda pelo CAM (Clube Atlético Mineiro, do qual foi presidente até há pouco) ,ou que representam apenas a si mesmo, como Rafael Greca, em Curitiba, do PMN.

Como não têm compromissos maiores com a política, todos eles sabem que precisam estar continuamente se expondo aos olhos dos seus eleitores, como astros de um espetáculo de baixa categoria.

Nisso, João Dória parece ter mostrado o caminho, certamente se valendo da sua condição de personagem do mundo da televisão e das relações públicas. Sem qualquer pudor, se vestiu de gari e foi fingir que limpava uma praça de São Paulo, ao amanhecer de segunda-feira, junto com trabalhadores de verdade.

Marcelo Crivella buscou outro símbolo para marcar seu primeiro dia de Prefeito. Compareceu a um banco de sangue para fazer uma doação.

Marchezan se fez acompanhar de um jornalista da RBS (faz sentido) para acompanhá-lo durante o primeiro dia de trabalho.

Greca foi de ônibus para a sua diplomação e chegou atrasado.

Todos eles preocupados em criar factoides para chamar atenção sobre si.

Agora, vai se iludir quem pensar que eles são inofensivos. Ao se posicionar como não-políticos em suas ações, ao pousarem de jovens empreendedores que não querem repetir o que fizeram os velhos políticos, eles fazem o jogo ideológico da direita que sempre defendeu a ideia de que os temas políticos não devem fazer parte das discussões que interessam ao povo.

Aos Dórias, Crivelas, Marchezans, Grecas, ACMNetos e Júlios, o que o povo merece é apenas pão e circo. E, olhe lá.

Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS

 


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