O futuro das FARC convertidas em partido político (I)

As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia [FARC] concebem um futuro onde se veem convertidas de guerrilha esquerdista em partido político legal, num país com uma nova Constituição Política e um órgão eleitoral autônomo e independente.

Escrito por  Edelmiro Franco; 

Fonte: notimex.gob.mx

Na fase final de negociações de paz que iniciaram em novembro de 2012, o grupo guerrilheiro respondeu a um questionário da Agência de Notícias do Estado Mexicano, Notimex, e destacou que os conflitos econômicos, políticos e sociais que afligem ao país continuarão vivos, porém sem manifestar-se em forma armada.

O encarregado de responder foi o comandante Gabriel Angel, um advogado de 58 anos de idade egresso da Universidade Nacional de Colômbia, sobrevivente do movimento de esquerda União Patriótica [UP] e assessor político do chefe máximo das FARC, Rodrigo Londoño Echeverri, conhecido como Timoleón Jiménez ou Timochenko.

Depois de 52 anos, a guerra fratricida em Colômbia é o último conflito armado que sobrevive na América Latina, uma vez que foram superadas as guerras intestinas em El Salvador, Nicarágua e Guatemala que na década dos anos 80 incendiavam a América Central.

A seguir, as respostas das FARC às perguntas de Notimex.

NTX: Creem que existem condições políticas em Colômbia para uma nova Assembleia Constituinte? Não creem que seja um cenário perigoso que favoreça mais às direitas do país?

FARC: A Assembleia Nacional Constituinte com participação popular ampla e decisória, da qual surja uma nova Constituição Política que estruture um país muitíssimo melhor que o atual, continua e continuará sendo uma bandeira do movimento democrático e revolucionário para Colômbia. O que cremos que se converte numa possibilidade cada vez mais distante em nosso país é a convocatória e realização de uma ANC inspirada por parte da direita.

NTX: As FARC-EP em seu novo papel de partido político se manterá como força monolítica ou partido único? Manterão a sigla de FARC ou a mudarão?

FARC: Teremos que esperar as conclusões de nossa Décima Conferência Nacional. Porém quiséramos precisar-lhes algo: as FARC, por si mesmas, sempre fomos uma organização política, um partido comunista, porém que sempre manejou a ideia de conformar um movimento político muito amplo sobre a base de alguns postulados gerais fundamentais que aglutinem um imenso caudal de colombianos. Até agora não vemos a necessidade de mudar essa concepção. Haverá que ver a forma de realizá-lo na legalidade.

 

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NTX: Buscarão conformar uma frente ampla dos setores de esquerda e independentes e sobre que critérios? Em que faixa se situarão, esquerda ou social-democracia?


FARC: Em princípio poderíamos dizer que coincidimos com a primeira parte de sua pregunta. Os critérios poderiam ser a conversão de nosso país em território de paz, sobre a base da mais ampla democratização política, a substituição do acendrado neoliberalismo aplicado nos últimos 25 anos, a independência e a soberania nacional, a integração latino-americana e caribenha, a igualdade dos direitos da mulher e o fim de toda discriminação por motivo de gênero, a defesa do meio ambiente e da biodiversidade, entre outras palavras de ordem que não somente interessarão a setores tradicionais de esquerda como também até a parte de alguns que foram considerados de centro ou até de direita.
A denominação que leve isso não é tão importante como a advertência que nos legou Manuel Marulanda [Vélez], acerca de que o que conta é não ir adornar altares para que outros celebrem a missa.



NTX: O projeto político das FARC no pós conflito buscará alcançar os mais altos cargos de eleição popular? Em quanto tempo?

FARC: Não somos partidários de fixar prazos nessas questões. Porém o que podemos dizer é que não possuímos vocação de perdedores, nossa meta é organizar e mobilizar a população colombiana para arrebatar o poder político à classe que o vem detendo durante séculos, a fim de criar um país democrático, justo e próspero no termo mais curto possível.

NTX: Aceitarão cargos públicos e políticos uma vez se firmem os acordos de paz definitivos?

FARC: Até agora ninguém nos fez oferecimentos dessa natureza. Haveria que ver de que se trata e com que propósitos.

 

NTX: Que propostas têm para o projeto de um novo sistema eleitoral que seja mais equitativo e justo com todos os setores políticos e com as minorias?

FARC: Em primeiro lugar a criação de um organismo de caráter eleitoral absolutamente independente e autónomo, suficientemente dotado com um plantel de pessoal irrepreensível, e recursos econômicos e tecnológicos modernos, de maneira tal que se possa erradicar todas as formas fraudulentas que caracterizam o sistema atual. Haveria que pensar no voto eletrônico seguro, isto é, que não possa ser manipulado de nenhum modo. A oposição e as minorias devem estar justamente representadas nele. Haveria que reexaminar o relacionado com o financiamento das campanhas políticas, num país onde os dinheiros de máfias e do narcotráfico se apoderaram do trabalho de proselitismo político mediante as formas mais sujas de corrupção.

NTX: Como conseguir que as regiões tenham uma representação equilibrada no Congresso, no pós conflito, e que expectativa têm para as próximas eleições regionais e presidenciais? Apresentarão candidatos únicos ou em coalizão?

FARC: Insistimos em que preferimos falar sempre de pós acordos, o conflito econômico, social e político que aflige a Colômbia continuará vivo e certamente muito mais agitado, só que não vai se manifestar em sua forma armada.
Nos acordos se falou da criação de circunscrições eleitorais especiais para as zonas tradicionalmente em conflito. Mediante a organização, a mobilização e a luta democrática mais ampla trabalharemos por ampliar ao máximo tal representação. Ainda é cedo para falar da próxima participação em eleições, porém é óbvio que nossa aspiração é a de contribuir para a geração de um grande movimento político de caráter realmente alternativo e isso implica pensar em atuar muito mais além dos próprios espaços.

NTX: Corrupção, messianismo, nepotismo, populismo, são qualificativos que cruzaram aos líderes de diferentes setores da esquerda colombiana, nos últimos 25 anos; como se blindarão as FARC frente a estas realidades?

FARC: Os termos e o sentido dessa pergunta parecem elaborados para fazer-nos aparecer como acusadores da esquerda tradicional colombiana. Por isso não os compartimos. Você não tem ideia dos qualificativos com os quais a gente no poder em Colômbia, os grandes meios de comunicação a seu serviço e a camada cooptada por eles insultam e desprestigiam qualquer proposta de mudança. Talvez poderia aceitar-se que como em toda agrupação humana podem existir elementos infectados, porém jamais pregá-lo do conjunto de uma esquerda perseguida e vitimizada em Colômbia como poucas no mundo. Nós somos revolucionários, com ética e princípios de tais, saberemos como demonstrá-lo nos fatos. Porém desde já imaginamos as horrendas campanhas de difamação com as quais a partir dos setores do poder se intentará macular nossa imagem. 

NTX: Que propõem para evitar que as zonas dos cultivos ilícitos sejam retomadas por grupos armados ilegais vinculados com o negócio do narcotráfico?

FARC: Entendemos que se refere a grupos paramilitares e de algum modo descendentes destes. A propósito existe um acordo muito amplo e preciso com o governo nacional no sentido de que serão combatidos com todo o poder do Estado. Há pactuadas formas de seguimento a essa perseguição. Não se trata de que, desaparecidas as FARC do cenário armado, a pobre gente ficará indefesa e impotente. Ali estaremos nós também, fazendo política, organizando as comunidades, mobilizando-nos com elas em defesa de seus direitos e do cumprimento de alguns acordos muito estritos. Há que ler estes detidamente para deixar de fazer tanta observação alarmante.

NTX: Que proposta têm as FARC para a reconciliação em Colômbia?

  

FARC: Aí estão os acordos firmados. Se seu cumprimento se converte em realidade para a Colômbia, necessariamente terão que ser encurralados e extirpados os ódios e a violência no campo da política.

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Pravda.Ru Jornal