MPF-AM recorre à Justiça por cestas básicas e prorrogação do saque de auxílio para indígenas
Segundo o procurador da República Julio José Araújo Junior, o governo federal precisa garantir a segurança alimentar e evitar filas e aglomerações em lotéricas e bancos
O Ministério Público Federal do Amazonas ingressou com uma ação civil pública para exigir, do governo federal e dos ministérios e órgãos competentes, ações imediatas para garantir a segurança alimentar e a proteção dos povos indígenas do estado em meio à pandemia de Covid-19. Desde o início da crise do novo coronavírus no Brasil, organizações indígenas e o MP vêm alertando para a urgência na entrega de cestas básicas e no controle de filas e aglomerações que se formam para buscar o auxílio emergencial, benefício criado para trabalhadores informais.
Em 13 de abril, o MP-AM recomendou medidas diferenciadas para a distribuição de alimentos e itens de higiene, além da implementação do auxílio emergencial em favor dos povos indígenas do Rio Negro. O pedido não foi atendido. "O Ministério Público Federal do Amazonas propôs a Ação Civil Pública após constatar o descumprimento de recomendação apresentada para garantir formas ágeis e adequadas de atender povos indígenas. A velocidade da disseminação do vírus impõe como medida preventiva o isolamento social e se entendeu que adotar certas medidas seria fundamental para evitar que as pessoas se aglomerassem nas agências das cidades", afirmou o procurador da República, Julio José Araújo Junior.
Segundo ele, experiências como o Bolsa Família mostram que as dinâmicas de programas de transferência de renda podem prejudicar diversos grupos sociais, que são obrigados a se deslocar às cidades e sofrem pela longa permanência e pela burocracia. "A Ação vem justamente para tentar combater esse cenário e garantir que se prorrogue o prazo para sacar o benefício", hoje de 90 dias, disse o procurador. "Ela também pede para que se crie uma estratégia específica na entrega de alimentos e itens de primeira necessidade de maneira rápida e segura".
Programas como o auxílio emergencial são pensados de uma forma genérica, desconsiderando muitas vezes as realidades de cada estado, conforme suas populações e geografia. Em um momento de grave pandemia, o anúncio do benefício, em vez de contribuir para a proteção de povos indígenas do Brasil, gerou o efeito contrário: as comunidades precisam romper a quarentena e se arriscar para ter acesso ao dinheiro.
"A Ação vem para reforçar e reiterar um pedido de longa data para ajudas emergenciais e a renda básica, principalmente para nós da população indígena", comentou Marivelton Baré, presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn). "O governo e os ministérios precisam adotar medidas para construir um plano específico de pagamentos e acessos a esses benefícios, seguindo a especificidade dos territórios indígenas da Amazônia. Que não nos bote em risco de contágio. Se esse vírus chegar nos territórios, será o extermínio de muitos povos", alertou o líder indígena.
A Ação Civil Pública traz quatro principais recomendações:
1. Garantia da segurança alimentar, com a entrega imediata de cestas básicas aos povos indígenas.
2. Prorrogação dos prazos para o uso ou saque do auxílio emergencial, que atualmente é como o do Bolsa-Família, 90 dias. Também, reforça a sugestão de medidas alternativas, como um fundo e o repasse do dinheiro para organizações indígenas. Mas, sobretudo, recomenda que cada povo seja consultado sobre como quer receber os benefícios.
3. Suspensão dos prazos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com o depósito de aposentadorias e salários maternidade, por exemplo.
4. Criação de um Plano de Comunicação, no qual o Ministério da Cidadania apresente informações rápidas e simples sobre como indígenas podem ter acesso ao benefício.
Filas em São Gabriel da Cachoeira (AM)
A mobilizadora Dadá Baniwa alerta sobre distanciamento social em frente a fila formada na lotérica de São Gabriel da Cachoeira
Em São Gabriel da Cachoeira, no Noroeste do Amazonas, longas filas em frente à única lotérica da cidade começaram a se formar, levando muita preocupação para as autoridades locais. O Comitê de Enfrentamento e Combate ao Covid-19 no município imediatamente agiu no sentido de instruir a população, de maioria indígena, a manter o distanciamento social de dois metros e utilizar máscaras de proteção.
Na semana passada, com o registro dos primeiros casos positivos na cidade e o alerta de transmissão comunitária declarado, o uso de máscara passou a ser obrigatório por decreto municipal.
A Foirn, através da Rede Wayuri de comunicadores e com apoio do Instituto Socioambiental (ISA), vem fazendo o esforço de comunicar a população sobre a necessidade de fazer o isolamento social e o distanciamento em casos de extrema necessidade.
Um carro de som está circulando no município, assim como ações de mobilizadores sociais indígenas falando nas línguas cooficiais em frente à lotéricas e às agências bancárias. "Estamos informando para as pessoas que é preciso usar máscara, ficar distante e lavar bem as mãos. Sabemos que o vírus já está circulando e estamos todos com muito medo", disse Edineia Teles, do povo Arapaso, comunicadora da Foirn.
Juliana Radler e Marina Terra
ISA
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