Festival de Locarno começa com filme francês

O Festival de Cinema de Locarno, quarto dos mais importantes festivais internacionais, começa nesta noite sob um céu estrelado, com oito mil espectadores reunidos diante de um gigantesco telão de 300m2, numa praça de estilo lombardo, para ver o desemparo de uma família monoparental e de como Matilde, menina de oito anos, convive com sua mãe aflita e desesperada, graças à invenção ou intervenção da fantasia ou do fantástico no seu cotidiano. 

O filme é francês, Amanhã e Todos os Outros Dias, da realizadora Noemie Lvovsky, com outros filmes já premiados, e assinala uma presença marcante do cinema francês na cidade suíça de Locarno, entre cineastas, atrizes e atores, levantando a suspeita de uma reação européia aos blockbusters americanos, cujas receitas fantásticas já não são mais exclusivas.

Não há um tapete vermelho em Locarno, mas um pódio, sob refletores ao ar livre e quente do verão, onde desta vez se poderia hastear a bandeira francesa, pois haverá poucos stars e muitas etoiles, desmentindo as previsões pessimistas do advento de um monocultura cinematográfica americana. Ali vão estar Fanny Ardant, Vanessa Paradis, Nastassia Kinsky, Mathieu Kassovitz, Sabine Azema, Olivier Assayas, e tantos outros vindos da Galia.

Um pouco de história

Locarno, o segundo Festival mais antigo do mundo, foi precedido pelo Festival de Veneza, criado em 1932 por Mussolini, com o objetivo político de fazer propaganda do seu governo e do fascismo. Veneza, que se transformou, mais tarde, no grande festival da arte cinematográfica, teve suas horas menos gloriosas quando Hitler interferiu, em 1938, para que o Leão de Ouro fosse entregue ao filme nazista de Leni Riefenstahl, Os Deuses do Estádio, produzido pelo Terceiro Reich. 

Para fazer oposição a esse festival comprometido com as ideologias nazifascistas, a França ia criar em 1938, o Festival de Cannes. Porém, houve a invasão da Polônia, começou a II Guerra Mundial e o Festival de Cannes só surgiu em setembro de 1946, alguns dias depois de ter começado o Festival de Locarno, lançado no dia 23 de agosto. 
O Festival de Berlim, Berlinale, só foi criado cinco anos depois.

A vocação política, se assim podemos falar, de Locarno vem do seu inspirador, Filippo Sacchi, jornalista italiano de esquerda, exilado em Locarno, durante o fascismo italiano, que mobilizou suíços antifascistas e inclusive o centro de turismo local para se criar o festival. 

As projeções, em 1946, eram numa tela de 56m2, fixada na parede do Grande Hotel, para um pequeno público reunido no jardim do hotel. Nada a ver , portanto, com o telão atual de 300 m2, montado na Piazza Grande diante de 8 mil espectadores.
Ali estiveram a francesa Arletty, Marlene Dietrich, Gina Lollobrigida, Vittorio Gassman, Vitorio de Sicca com o Ladrão de Bicicleta.

Festival de descobertas, trouxeram seus filmes para Locarno Michelangelo Antonioni, Claude Chabrol, Eric Rohmer e, mais tarde, Abbas Kiarostami, Alexandre Sokourov, Todd Haynnes, Jim Jarmusch, Jafar Panahi, Spike Lee...e tantos outros.

Filme póstumo de Raúl Ruiz

A Telenovela Errante, filme chileno, sai do comum, por ser um filme que poderíamos chamar de póstumo. O grande cineasta chileno, Raúl Ruiz, que viveu desde a queda de Allende até morrer em Paris, autor de mais de cem filmes (um recorde!) tinha perdido as bobinas de um filme em sete episódios, que ia de segunda-feira a domingo. 

Não sei como isso de perder bobinas pôde acontecer mas aconteceu e, só no ano passado, sua viúva, Valeria Sarmiento, que também é cineasta encontrou essas bobinas numa universidade americana. Ela fez algumas filmagens que faltavam, montou, e o filme, está na competição internacional. 

Rui Martins, está em Locarno, convidado pelo Festival Internacional de Cinema.

 


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Pravda.Ru Jornal