Um mês após o rompimento da barragem da Samarco, ex-moradores voltam às ruas do distrito de Mariana (MG) que foram encobertas pela lama.
Por Guilherme Weiman/Brasil de Fato
De Mariana (MG)
"Era como se o mundo estivesse acabando. Eu sei que ninguém nunca ouviu o mundo acabando, mas foi essa sensação que a gente teve. Foi muito barulho e poeira", rememorou Renato José Martins.
O mundo não acabou nesse dia, mas as ruas do pequeno distrito de Mariana (MG) sumiram completamente do mapa. O relógio marcava 16 horas do dia 5 de novembro, quando 65 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério invadiram o horizonte dos moradores de Bento Rodrigues.
"Eu tinha ido conversar com um colega pra gente pescar às seis da tarde, mas quando eu cheguei à praça ouvi um barulho imenso. Olhei pra trás e vi uma onda de poeira e um barulho que só aumentava. Peguei minha bicicleta e fui atrás da minha esposa, que está grávida de quatro meses, e dos meus dois filhos", recordou Gleison de Souza.
Na véspera de completar um mês da tragédia anunciada, como comprovam os estudos feitos em 2013 pelo Instituto Prístino a pedido do Ministério Público Estadual que já alertava para os riscos de rompimento da barragem, Renato e Gleison voltaram aos escombros do que antes era Bento Rodrigues.Em menos de dez minutos, sem nenhum aviso ou alerta sonoro, a lama tomou conta de praticamente toda a comunidade. Ruas, casas, carros e uma quantidade incalculável de memórias foram soterrados pelo rompimento da barragem do Fundão, que era controlada pela Samarco - empresa de mineração que pertence à Vale e BHP Billiton.
Antes disso, Renato já havia tentado voltar ao local dois dias depois da remoção forçada, mas foi impedido pelo exército. "Um deles apontou a arma pra mim e me obrigou a sair correndo apressado da minha própria terra", afirmou Renato.
O atingido, que já trabalhou um ano e três meses como sinaleiro na Samarco entre 2013 e 2014, questiona a postura da empresa. "Eu tive a oportunidade de ver a barragem abrir uma trinca quando trabalhava na Samarco. Na ocasião, eles deixaram uma equipe dirigindo dois caminhões e uma máquina. Agora a pergunta que fica é: essas pessoas não eram importantes para passarem por esse risco?", questionou Gleison.Apesar de não terem sido reprimidos por nenhum órgão de segurança na visita da última sexta-feira (04), o sentimento de tristeza era mútuo. "Eu morava na Rua Dona Olinda, 243. Minha casa era bem simples, mas eu gostava muito. Eu me sinto bastante humilhado em voltar hoje aqui", admitiu Gleison.
Memórias
Durante a visita ao local, Renato conseguiu encontrar sua casa em meio ao mar de lama. Após alguns minutos de paralisia, o jovem avistou o que poderia ser parte da sua história.
Não foi preciso muito tempo de escavação para o troféu de truco e as medalhas de futebol despontarem dos rejeitos tóxicos. Como havia saído apenas com a roupa do corpo, esses objetos passaram a ser as lembranças mais antigas que Renato conseguiu resgatar.
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