Cátedra Olavo Setubal promove encontro sobre a cena teatral das periferias brasileiras
por Fernanda Rezende - publicado 10/10/2018 18:05 - última modificação 17/10/2018 15:17
A cena teatral das periferias do Brasil será tema do terceiro encontro do ciclo Centralidades Periféricas, organizado pela Cátedra Olavo Setubal de Arte, Cultura e Ciência, uma parceria entre o IEA e o Itaú Cultural.
No dia 22 de outubro, às 14h, no IEA, representantes de quatro coletivos teatrais de São Paulo, Bahia e Rio Grande do Norte, além de uma pesquisadora da área, discutirão o papel desta expressão artística nos grandes centros urbanos. A mediação será de Eliana Sousa Silva, titular da cátedra em 2018. A participação presencial requer inscrição. Haverá transmissão ao vivo pelo site do IEA, para a qual não é necessário se inscrever.
Os expositores serão os atores Cell Dantas, do Bando de Teatro Olodum, Bahia; Edson Paulo, do Buraco d'Oráculo, São Paulo; Fernando Yamamoto, do Clowns de Shakespeare, Rio Grande do Norte; Adriano Mauriz, do Pombas Urbanas, São Paulo; e a pesquisadora Carolina de Camargo Abreu, do Núcleo de Antropologia, Performance e Drama (Napedra) da USP.
Para Carolina, o teatro ajuda a educar e formar cidadãos de forma lúdica. "Engaja corpo, imaginação e pensamento crítico numa pedagogia que se realiza por encontros. Teatro não é exercício apenas intelectual, como o da escola com fileiras de carteiras", avalia. Ela explica que, nas periferias -- carentes de equipamentos públicos e eventos --, o teatro é o exercício de outros mundos possíveis. "Abre arena que desloca o centro, instaura a possibilidade de centralidades que não seja a do poder, do dinheiro, do trabalho, mas do conhecimento dos viajantes, da sabedoria do antigo, da comunidade de pertencimento, do riso subversivo", diz.
Mauriz, do Pombas Urbanas, conta que, desde o início do coletivo, ele se viu envolvido em um processo de formação em que cada um tinha que reconhecer capacidades e potencialidades e olhar o mundo com senso crítico. Segundo ele, o criador do grupo, o diretor peruano Lino Rojas, sempre priorizou formar uma linguagem de teatro popular. "A questão da rua era muito forte, assim como o encontro público com outros moradores do nosso território. Era importante levar temas que tivessem a ver com as nossas inquietudes como cidadãos e promover esse encontro e diálogo", conta.
O ator relembra a dificuldade que o grupo teve de se inserir na cidade. "Como um grupo de jovens da periferia, sem ter passado por uma escola, pode entrar na cena teatral querendo se profissionalizar?", era o que ouviam à época, diz Mauriz. Apesar da dificuldade, o coletivo conquistou espaço nos teatros do centro, mas, após certo período, decidiu voltar às origens e construir o Centro Cultural Arte em Construção, em Cidade Tiradentes. "Lá, começamos esse trabalho de multiplicação da nossa experiência, sempre pensando no jovem como protagonista".
O ciclo Centralidades Periféricas já promoveu discussões sobre a literatura produzida nas periferias e, mais recentemente, sobre arte urbana. A ideia é aproximar a universidade das periferias, por meio do diálogo entre seus moradores e docentes, técnicos, artistas, intelectuais e ativistas.
Sobre as companhias
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Bando de Teatro Olodum (BA)
O grupo foi criado em 17 de outubro de 1990, em Salvador, a partir de uma parceria entre o diretor Marcio Meirelles e o Grupo Cultural Olodum. É a companhia negra mais popular e de maior longevidade na história do teatro baiano e uma das mais conhecidas do país. A primeira peça encenada pelo Bando foi Essa É Nossa Praia, comandada por Marcio Meirelles e pela diretora francesa Chica Carelli (co-fundadora da companhia). 22 atores - todos negros - formaram o corpo desta primeira apresentação.
Além das palavras encenadas, a música e a dança são características marcantes das apresentações do grupo, principalmente após a incorporação do diretor de movimento Zebrinha, em 1993, e do diretor musical Jarbas Bittencourt, em 1996. A terceira peça do Bando, lançada em 1992, foi também uma das mais famosas: Ó, paí, Ó! A peça inspirou um filme homônimo, dirigido em 2007 por Monique Gardenberg, e um seriado exibido pela TV Globo em 2008 e 2009. Sempre com pitadas da vivência da população negra da Bahia, o grupo encenou grandes clássicos, como Sonho de uma Noite de Verão, de William Shakespeare e A Ópera de três Vinténs, de Bertolt Brecht.
Clowns de Shakespeare (RN)
Criado em 1993 em Natal, capital do Rio Grande do Norte, o grupo desenvolve uma investigação com foco na construção da presença cênica do ator, a musicalidade da cena e do corpo, teatro popular e comédia, sempre sob uma perspectiva colaborativa. Mesmo sem trabalhar diretamente com palhaço, a técnica do clown está presente na sua estética, seja na lógica subvertida do mundo, seja na relação direta e verdadeira com a plateia, seja no lirismo que compõe o universo desses seres.
No seu currículo, o grupo traz importantes conquistas que conferem uma posição de referência na cena potiguar e nordestina, passando por cerca de 80 de cidades brasileiras, além de Portugal, Espanha, Chile, Equador e Uruguai. O grupo mantém o seu espaço-sede, o Barracão Clowns, no qual realiza cotidianamente seus trabalhos de produção, treinamento e pesquisa, ministra cursos e oficinas, e recebe profissionais e espetáculos de diferentes estados e linguagens artísticas.
Buraco d'Oráculo (SP)
O grupo foi criado em 1998, com o intuito de fazer um teatro que discutisse o homem urbano contemporâneo e seus problemas. Desde sua fundação, a companhia de teatro se apresenta exclusivamente nas ruas, por ser a maneira mais efetiva de compartilhar momentos de reflexão e afetividade. O trabalho do grupo é calcado em três pontos fundamentais: a rua, como local fundamental para promover o encontro direto com o público; a cultura popular, como fonte inspiradora de criação; e o cômico, destacando-se a farsa e as relações com o denominado "realismo grotesco".
A atuação do grupo se focou, desde sempre, na zona leste de São Paulo, principalmente na região do bairro de São Miguel Paulista. A partir de 2005, apresentação passaram a ser feitas também em 18 unidades da Companhia Metropolitana de Habitação (Cohab) da zona leste da capital. Nos 20 anos de história, a grupo apresentou oito peças usando o popular, o cômico e a rua como determinação e alvo de crítica.
Pombas Urbanas (SP)
O Grupo Pombas Urbanas foi criado em 1989 a partir da participação no projeto "Semear Asas", concebido pelo diretor peruano Lino Rojas, que teve como objetivo formar atores e técnicos para o teatro com jovens de São Miguel Paulista, na Zona Leste de São Paulo. Ao longo de sua existência, o grupo realizou pesquisas sobre a formação do ator, linguagem e dramaturgia, formando um repertório de 15 espetáculos, em sua maioria textos de autoria de Rojas.
A pesquisa do grupo se caracteriza pelo estudo contínuo da cidade de São Paulo e seus habitantes e na construção de uma linguagem cênica que traz a poética do jovem brasileiro contemporâneo. Em 2002, através do trabalho do grupo, foi criado também o Instituto Pombas Urbanas, que tem por missão contribuir para o desenvolvimento de Cidade Tiradentes, bairro da Zona Leste de São Paulo, por meio da arte, suas raízes culturais e da capacidade transformadora do jovem.
Fotos: Divulgação
Colaborou: Victor Matioli
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