Brasil realiza a primeira revolta massiva contra Jair Bolsonaro
Nas concentrações, se destacaram os chamados à unidade dos sindicatos, agrupações e movimentos sociais, para reforçar a resistência em conjunto contra as medidas de ajuste do governo, como o corte de mais de 30% no orçamento da Educação Pública
Por Dario Pignotti
Créditos da foto: Manifestação contra os cortes na educação, no Rio de Janeiro (Reprodução)
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Estudantes e professores encabeçaram a primeira revolta massiva contra Jair Bolsonaro nos 27 estados brasileiros. Multidões que, por exemplo, ocuparam mais de seis quadras da Avenida Paulista, no centro de São Paulo, e outras tantas aglomerações em outras capitais e cidades do interior. Nas mobilizações, se destacaram os discursos a favor da unidade das organizações sindicais, agrupações, partidos político e movimentos social, visando uma maior unidade para reforçar a resistência em conjunto contra as medidas de ajuste do governo, a começar pelo ataque contra a Educação Pública, com um corte orçamentário de mais de 30%.
Uma das participantes mais celebradas em São Paulo foi uma professora aposentada, de 96 anos, que subiu no palco montado nas proximidades do MASP (Museu de Arte de São Paulo). O canto mais escutado na Avenida Paulista, e também no Centro do Rio de Janeiro, dizia: "Bolsonaro, que papelão grana pra milícia, mas não tem pra educação". Enquanto as marchas avançavam pelas avenidas do país, os noticiários também descobriam um novo escândalo vinculando um dos filhos do presidente com as "milícias" paramilitares. Entre trombones, carros de som e fogos artificiais, o país repudiava não só o corte do orçamento educacional mas também a reforma da Previdência impulsada pelo governo.
Pela manhã, foi realizada uma concentração na Universidade de São Paulo (USP), a más importante do país, que terminou com os participantes iniciando uma caminhada de 7 quilômetros até a Avenida Paulista, aos gritos de "livros sim, armas não" e "Fora Bolsonaro".
A marcha paulista convocou uma grande quantidade de pessoas na USP e na Unicamp, as mais importantes do sistema público no Estado de São Paulo, entre estudantes, professores e funcionários. Também contou com o apoio de parte da PUC (Pontifícia Universidade Católica), privada, com uma longa tradição de enfrentamento à ditadura militar brasileira (1964-1989).
No Rio de Janeiro o protesto se concentrou apesar da chuva persistente na Praça da Candelária, e de lá as colunas seguiram em direção à Central do Brasil.
O primeiro balanço indica que a maioria dos Estados brasileiros registrou paralisação das atividades nas universidades, escolas de ensino fundamental e médio, além de manifestações com alta participação. Não foi um dia de luta setorial, e sim de defesa da educação por parte de amplos setores, como ficou demonstrado com a presença de muitos pais de garotas e garotos das escolas primárias e secundárias.
A indignação popular começou a crescer na semana passada: no dia 6 de maio, um grupo de pais, professores e estudantes de colégios de ensino médio protestaram no Rio de Janeiro, em frente ao Colégio Militar, onde Bolsonaro fazia um discurso, prometendo abrir mais escolas daquele tipo, onde se defende um tipo de educação militarizada.
Nesta quarta, uma das primeiras concentrações aconteceu em Brasília, às 10 da manhã, com milhares se reunindo em torno da estrutura semiesférica do Museu de Arte, e partindo dali em direção ao edifício do Congresso Nacional.
"Esta marcha é uma vitória para os trabalhadores, porque é a primeira que se planta de frente a um governo debilitado pelos escândalos. Saímos fortalecidos para a greve geral do dia 14 de outubro", declarou Claudio Lorenzo, secretário-geral da Associação de professores da Universidade de Brasília.
"Este governo tem todas as características dos fascistas. O presidente e o ministro da Educação (Abraham Weintraub) são dois obscurantistas, estão contra o saber crítico, atacam os universitários por puro macartismo".
"Bolsonaro deu um tiro no pé fazendo essas provocações aos universitários, que terminaram unificando a esquerda e o centro. Temos aqui, ao nosso lado, até mesmo os professores que apoiaram o impeachment contra Dilma Rousseff, mas que agora estão apoiando o protesto contra a direita", analisou o professor Lorenzo.
A coluna onde havia bandeiras da União Nacional de Estudiantes, do PT e de outras forças de esquerda ocupou as seis pistas do Eixo Monumental, a avenida principal da capital brasileira, que passa ao lado do setor onde estão os ministérios.
"A ordem é para que ninguém fique parado em frente ao Ministério da Educação, porque lá estão as tropas de choque da polícia, sabemos que o governo quer reprimir e vai tentar infiltrar provocadores", explica sindicalista Lorenzo.
Bolsonaro e seu ministro da Justiça, Sérgio Moro, o célebre ex-juiz da Lava Jato, assinaram um decreto para mobilizar a Guarda Nacional de Segurança Pública, permitindo que esta ocupe o centro de Brasília em jornadas de manifestações, um dispositivo que foi inaugurado durante a manifestação dos povos indígenas, há três semanas atrás.
O capitão da reserva, e agora chefe de Estado, viajou ontem - pela segunda vez em menos de dois meses - aos Estados Unidos. Aterrissou em Dallas, pouco depois das 12h de Brasília, mais ou menos quando o jardim em frente ao parlamento brasileiro era ocupado por cerca de 50 mil manifestantes (segundo os sindicatos).
Em suas declarações, o mandatário atacou os estudantes e professores, com a mesma virulência mostrada há um mês, quando disse que as universidades não são lugares para albergar "militantes", e que faria o possível para que estes sejam expurgados.
Os que participaram do protesto, segundo ele, "são idiotas úteis, usados como massa de manobra por uma minoria", disse em Dallas, antes de participar de um encontro com o ex-presidente George W. Bush.
Bolsonaro optou por viajar a esta cidade texana, depois que um evento em sua homenagem foi adiado porque os organizadores não conseguiram sede em nenhum local em Nova Iorque, devido à pressão contra a presença do presidente brasileiro por parte de grupos ambientalistas e da comunidade LGBT.
Em Paris, cerca de 50 brasileiros e alguns estudantes franceses entregaram seu apoio aos brasileiros, no repúdio contra o regime de extrema direita. As vozes mais ativas do ato foram as dos bolsistas preocupados com a possibilidade de que o ajuste os deixe sem recursos para concluir seus doutorados, a maioria deles em ciências humanas, a área em a qual Bolsonaro aponta suas críticas mais desatinadas.
*Publicado originalmente em pagina12.com.ar | Tradução de Victor Farinelli
https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Movimentos-Sociais/Brasil-realiza-a-primeira-revolta-massiva-contra-Jair-Bolsonaro/2/44112