Não se reage a assalto. A frase, estampada na capa de alguns jornais nos últimos dias, não foi dita por alguma autoridade, policial ou especialista em segurança. É do assaltante reincidente Crispiniano Santos que atacou, esfaqueou e matou um marinheiro de 19 anos no último domingo (17), na Bahia.
Bene Barbosa*
Não é de hoje que afirmo e aponto para o perigo da simbologia do discurso do "nunca reaja" adotado pelo governo, por instituições policiais, por jornalistas e por outros tantos que no desespero de proteger a vítima de algo pior que um roubo adotaram o mantra de que a vítima deve fazer tudo que o bandido lhe ordena. Não deve tentar fugir, deve evitar gestos bruscos, não deve encarar o assaltante e nunca, em hipótese alguma, reagir.
Talvez isso fizesse algum sentido coisa de 30 anos atrás onde os criminosos, muito menos cruéis, buscavam apenas o bem material. Seja como for, o perfil criminal mudou muito. Hoje vemos diariamente notícias de pessoas que foram assassinadas sem esboçar qualquer reação. Isso, por si só, já seria motivo para se abandonar o fracassado discurso pseudo-protetivo que além de não garantir a segurança do cidadão, trás ao facínora a justificativa perfeita para seus hediondos atos.
Muitas coisas que são ditas quando o tema é segurança pública devem ser pensadas e olhadas não com a visão do trabalhador, do pai de família, do cidadão honesto. Devem sim ser olhadas pelo viés do criminoso. Oras, o que entende um assaltante quando ouve um delegado, um oficial da Polícia Militar, um secretário de segurança pública, afirmar que se o cidadão reagir o criminoso lhe matará? Óbvio que para o bandido isso soa como a mais pura justificativa para o assassinato. A fala do Crispiniano da Silva, assassino confesso, resume tudo isso. Não é o primeiro a invocar o "não reaja" em sua defesa e não será o último.
No mesmo patamar do perigoso simbolismo está a tal campanha de desarmamento que convida o cidadão ao desarme, mas que aos olhos dos bandidos apresenta-se como uma rendição da sociedade aos seus malfeitos. E é exatamente disso que decorre o fracasso total de descabida campanha.
Não, não estou pregando que o cidadão deva reagir! O que estou afirmando é que o discurso deve sumir, ser abandonado, ser substituído pela mensagem que o criminoso que mata sua vítima, seja lá por qual motivo, será perseguido, encontrado e punido. Ao cidadão, cabe tentar decidir qual a melhor opção para escapar ileso de um crime.
A dura realidade é que todos aqueles que um dia adotaram o discurso capitulacionista são responsáveis por mais essa morte. O discurso adotado por autoridades, oficiais, policiais, delegados e "especialistas", ao contrário do que afirmam, não garante a segurança do cidadão e justifica o assassino, o latrocida, o criminoso, que, apoiado por tantas autoridades, acaba acreditando que tem o direito de matar sua vítima que tenta de alguma forma escapar do ataque.
Ou se devolve ao cidadão o direito e as ferramentas necessárias para sua defesa ou continuaremos reféns dos monstros que seguem acreditando, e com razão, na impunidade.
*Bene Barbosa é especialista em segurança pública, palestrante, possui mais de 100 artigos publicados na imprensa nacional e internacional e é autor do livro Mentiram Para Mim Sobre o Desarmamento.