Um país à procura de um povo
O que é a democracia senão o direito e o dever da minoria
representativa de fiscalizar e cobrar a maioria no parlamento? No
entanto, o que vemos nesta terra desde Cabral é a maioria silenciando e cooptando a minoria e a minoria não buscando uma nova posição, não apresentando um novo projeto de país, um novo caminho. Não querem repensar o país, apresentar um programa de nação, mas sim um palanque e a chance de reivindicar os privilégios que não tem. Não legislam pela necessidade, mas pela conveniência.
Nossos grupos políticos não lutam por ideais, mas pela oportunidade de administrar verbas, distribuir cargos, aparelhar o Estado, acertar comissões. O caso das novas privatizações refletem bem essa realidade, tão ultrapassado quanto atual em nossa política, que rasteja seu terno surrado pelos corredores assombrados de nossa pobre vida diária. Está nos jornais, nas capas de revistas, enquanto a família brasileira assiste hipnotizada pela televisão a vida glamorosa que ela nunca terá.
Enquanto no primeiro mundo, com todos seus privilégios e conquistas sociais, o povo vai às ruas e protesta por uma política inclusiva e mais humanizada, nós nos escondemos em casa, guardados por Deus, voluntariamente refugiados. Alegam sermos um povo pacífico. Enquanto isso, explode nos centros urbanos uma guerra surda, uma violência desmedida, escancarada, de um povo fratricida. Em apenas um final de semana, produzimos mais vítimas fatais em todo território nacional que muitas guerras inteiras em países que vivem diariamente seus conflitos sociais, ideológicos e raciais. Aqui, até nossa violência é covarde.
Não podemos confundir paz com passividade. As greves, que deveriam ser um direito sagrado do trabalhador sem voz e sem vez, é usada, manipulada, para garantir votos e eleições. Não é a gestão para todos, mas para poucos. Governantes dizem com orgulho que não toleram malfeitos, já antevendo a próxima crise. É a culpa que condena. No entanto, aceitam como mérito o que não é feito. As instituições nacionais estão em frangalhos, falidas, divididas e repartidas. Não querem resolver os vários problemas, apenas administrá-los, tendo a certeza de saber os números exatos e planos complexos para a próxima campanha que já está sendo ensaiada. É a mão que sufoca o novo, enquanto escorrer a esperança e os sonhos dos brasileiros por entre os dedos.
Somos proprietários naturais das maiores reservas minerais do planeta. No entanto, estamos privados de viver dessas benesses. Temos autonomia em petróleo mas pagamos mais caro pela gasolina que países não produtores. Entregamos nossos minerais a preço de banana podre e depois compramos por muitas vezes mais o metal beneficiado, sem gerar um só emprego.
Aqui as forças não convergem para que dessa estrutura possa nascer um grande país. Mas divergem, cada uma apenas olhando para o melhor quinhão que lhe cabe. Por isso se faz justificável a criação de tantos órgão gestores e fiscalizadores, em uma triste constatação do dividir para concentrar. É a organização de pequenos grupos gerindo o todo, quando a Constituição proíbe a ação daquilo que é chamado de cartel.
Mais pela realização individualizada, desintegrada e dissociada da população que pela ação do governo, vamos colhendo frutos de um povo resignado e descomprometido, revelando que é capaz de produzir mas não de administrar. Somos os braçais da globalização. Essa é nossa triste realidade de um gigante adormecido, tendo seu berço esplêndido violado todos os dias, enquanto ele prefere sonhar a viver. Somos um grande país, mas ainda nos falta um grande povo.
Petrônio Souza Gonçalves é jornalista e escritor -
www.petroniogoncalves.blogspot.com