Gosto do blogueiro Dmitry Orlov, porque ele diz as coisas claramente, o que me ajuda muito, nessa minha idade, a ver através do fog da guerra na Ucrânia. Pena, só, que ele escreva tão raramente...
31/8/2014, MK Bhadrakumar, Indian Punchline
http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2014/08/31/obama-putin-neck-and-neck-on-ukraine/
Em recente postado em seu blog [já traduzido, distribuído ontem, hoje em redecastorphoto], Orlov lista dez sinais indisfarçáveis, incontestáveis, de mudança em solo no leste da Ucrânia, em termos militares, que todos veriam, se forças russas tivessem realmente invadido a região, como a narrativa ocidental insiste em repetir que teria acontecido, desde a semana passada, a partir da cúpula de Minsk na 2ª-feira, que se realizou entre bem-vindos sinais de que alguma paz começa a ser possível.
É impossível discordar de Dmitry, quando diz que nenhum daqueles sinais é visível no mundo real, pelo menos por enquanto. O que impõe uma grande pergunta: por que a narrativa 'da invasão', tão absolutamente sem provas, está sendo introduzida de modo tão rude pelos EUA, em todos os discursos que tenham a ver com a situação da Ucrânia?
Parece-me que os EUA fazem deliberadamente o que estão fazendo, porque, na 'mudança de regime' na Ucrânia, o presidente Barack Obama está liderando da frente, não da retaguarda como na Líbia ou Síria. Disso, não tenho dúvidas.
Quem duvide, passe os olhos pelo discurso da embaixadora Samantha Power dos EUA no Conselho de Segurança da ONU na 5ª-feira, quando tirou as luvas e sentou a pua. Até faz lembrar o famoso discurso do embaixador Adlai Stevenson dos EUA, na reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU dia 25/10/1962, nas sombras da crise dos mísseis em Cuba.
As trocas de farpas entre Power e o embaixador Vitaly Churkin parecem-se cada dia mais com as de Stevenson com o embaixador russo Valerian Zorin. É, sem tirar nem pôr, cena clássica de Guerra Fria. De diferente, claro, que as falas de Stevenson eram elegantes, bem redigidas, bem lidas, bem pensadas, inteligentes, para acalmar os ânimos; e Power fala aos guinchos, aos pulos, em tom de provocação, intolerante, como se estivesse nas trincheiras da extinta Iugoslávia.
Mas voltando à Ucrânia: o que explica a narrativa explosiva que o 'ocidente' está impondo? De fato, realmente não mostraram nem um fiapo de prova de que a tal 'invasão' russa teria acontecido. O que nos garante que, como no caso do conto do infeliz avião da Malaysian Airline abatido a tiros no leste da Ucrânia, toda a conversa sobre 'invasão' não seja, outra vez, mais subterfúgios? Claramente, ninguém no ocidente quer voltar, nem agora nem nunca, a falar sobre o avião malaio, sobretudo em Washington.
A parte mais perturbadora é que, ao lado da narrativa sobre a 'invasão' russa na Ucrânia, há movimentação frenética em solo, do lado da Organização do Tratado do Atlântico Norte, OTAN. Pior: para criar, num momento como o atual... uma Força Expedicionária da OTAN.
A intrusiva narrativa ocidental sobre a 'invasão' russa na Ucrânia, da qual não há provas, e que Dmitry Orlov demonstra que é completamente inverossímil, será de fato apenas 'sessão de esquenta' antes da reunião da OTAN que acontecerá em Gales, Grã-Bretanha, na 5ª-feira próxima? Pode muito bem ser. Considerem o seguinte.
Ao longo da semana passada, a liderança pró-ocidente em Kiev começou a clamar que dessem status de membro da OTAN à Ucrânia. O secretário-geral da aliança Anders Fogh Rasmussen respondeu imediatamente, como se estivesse à espera, na 6ª-feira: "Respeitamos integralmente as decisões da Ucrânia sobre a política de segurança da Ucrânia e o pedido de afiliação à aliança. Não interferirei nas discussões políticas na Ucrânia, mas permitam-me lembrá-los da decisão que a OTAN tomou na cúpula de Bucareste em 2008, segundo a qual a Ucrânia receberá status de membro, se, claro, a Ucrânia assim o desejar e a Ucrânia satisfizer os necessários critérios."
O que Rasmussen se esqueceu de registrar aí foi que, na cúpula de Bucareste, o governo de George W. Bush fazia de tudo para promover a expansão da OTAN e incluir a Ucrânia, mas a empreitada foi completamente barrada pela Alemanha; Berlin disse que não; que provocação pela aliança ocidental despacharia as relações entre Europa e Rússia para o fundo do poço.
Será que a Alemanha manterá a mesma posição, ante a narrativa ocidental pilotada de Washington, segundo a qual a Rússia teria 'invadido' a Ucrânia? Saberemos no próximo fim de semana, depois da cúpula da OTAN em Gales. O presidente da Ucrânia Petro Poroshenko foi convidado para a reunião da OTAN em Gales. (Mas a Rússia foi acintosamente excluída, mais uma vez, como tem sido prática desde meados dos anos 1990s.)
Há crescentes sinais de que a resistência alemã contra a associação da Ucrânia à OTAN está-se diluindo, numa guerra diplomática de atrito sustentado movida pelo governo Obama. A Grã-Bretanha, como sempre, estará obedecendo ao roteiro que o Pentágono passou-lhe, na cúpula no ninho de Gales, onde, como país anfitrião, tem força especial.
Enquanto isso, Rasmussen revelou que a aliança planeja instalar novas bases no leste da Europa. A ideia é que tropas de países OTAN como Canada façam estadias nessas bases, de vários meses de cada vez, de modo que Bruxelas não apenas economizará em custos de infraestrutura, como também poderá dizer que não está por ali em caráter permanente (o que seria violar os termos do ato assinado por OTAN-Rússia, em 1997). Cerca de mil soldados canadenses estão partindo para a Europa, com esse destino.
A Ucrânia forma um padrão na política doméstica canadense, por causa do 'banco de votos' da comunidade de emigrados. Ottawa, pois, está assumindo papel protagonista na Ucrânia. HMCS Toronto foi deslocado para o Mar Negro. A Infantaria de Alberta participou de exercícios militares na Polônia, com soldados dos EUA. Depois disso, unidades de infantaria de Ontario serviram na Polônia. Quatro jatos F-18 canadenses que participavam de 'treinamento' na Romênia, foram movidos para a Lituânia (onde há uma das maiores bases aéreas do período soviético).
Nem é preciso dizer que a retórica russofóbica ajudaria Washington a fazer pressão sobre a União Europeia (que está reunida hoje em Bruxelas) e sobre a OTAN para que ajam no sentido de isolar Moscou, o que se alinharia bem com a estratégia geral de contenção, dos EUA.
Não surpreende, portanto, que nos últimos quatro dias o presidente russo tenha falado por telefone com a chanceler alemã Angela Merkel, com o primeiro-ministro da Itália Matteo Renzi, com o presidente da Comissão Europeia José Manuel Barroso e com o presidente da França François Hollande. O assunto de todas essas conversas foi a reunião entre Putin e Poroshenko em Minsk, Bielorrússia, na 2ª-feira passada.
Interessante: todas essas conversas (exceto com Hollande) aconteceram por iniciativa europeia. Depois de conversar com os europeus, Putin falou por telefone com o presidente da Bielorrússia Alexander Lukashenko no sábado, sobre reunião em Minsk, do Grupo de Contato sobre a Ucrânia (que compreende a Organização de Segurança e Coordenação da Europa, a Rússia e representantes do leste da Ucrânia) e o governo ucraniano. Esperemos, agora, o contramovimento de Obama sobre o tabuleiro de xadrez. Semana que vem Obama visitará a Estônia e não viajaria até aquele vizinho mais próximo dos russos, de mãos vazias. *****