Chomksy: O Esquecido 11/9 Chileno, Incomparavelmente Pior que o Americano

O analista americano recorda o 50º aniversário do golpe chileno, observando o poder da propaganda americana sobre o imaginário global ao jogar no esquecimento o terror vivido no Chile durante a ditadura a partir de 1973, enquanto superdimensiona o 11/9 nos EUA, no centro das atenções históricas. “Washington foi a Al-Qaeda no Chile”, aponta o intelectual mais respeitado do mundo em conversa com Edu Montesanti

Este mês de setembro marca 50 anos do golpe militar no Chile, que instaurou o brutal regime do general Augusto Pinochet (1973-1990). Terrorismo de Estado arquitetado e financiado por outro Estado, o americano, que deixou como saldo 40 mil mortos e “desaparecidos”, além de mais de 200 mil exilados segundo dados oficiais.

Os 17 anos de ditadura deixaram graves consequências entre os chilenos, trazidas aos dias de hoje. Sem a devida memória em todo o mundo segundo suas reais dimensões, a não ser dentro do próprio Chile. E, marca registrada das “intervenções democráticas” e “humanitárias” dos EUA, sem justiça internacional até hoje.

A partir de 11 de setembro de 1973, quando as Forças Armadas chilenas supreendentemente cercaram e bombardearam o Palacio de la Moneda, casa presidencial do mandátario socialista Salvador Allende (1970-1973), o povo chileno viveu “uma guerra subterrânea” de quase duas décadas conforme mencionado no documentário Clandestino en Chile de 1985, dirigido por Miguel Littín.

O Golpe de 73

Salvador Allende, autoproclamado marxista e membro do Partido Socialista do Chile, havia prometido em campanha presidencial nacionalizar as empresas de cobre, de propriedade majoritariamente dos americanos, um grande negócio no Chile.

Em plena Guerra Fria e diante da socialista ilha de Cuba em permanente revolução contra o histórico imperialismo americano e as mazelas do sistema capitalista, Washington já manifestava preocupação com a ascensão de Allende no sul do hemisfério bem antes de este tomar posse como presidente de um dos países, historicamente, mais adiantados da região em termos educacionais.

Nos meses que antecederam as eleições chilenas de 4 de setembro de 1970, uma sexta-feira, vencidas por Allende, os EUA injetaram no país sul-americano milhões de dólares em uma “operação de destruição”, grande parte da qual era propaganda destinada a impedir que Allende tomasse o poder, e acirrasse a polarização politica entre os chilenos aumentando, assim, a tensão entre a sociedade no país sul-americano.

O general chileno René Schneider opôs-se a esta trama, e acabou assassinado em 23 de outubro de 1970. Sobre isto, o programa 60 Minutes da da rede americana de notícias CBS News relatou, em 9 de setembro de 2001:

No Chile, o assassinato do General Schneider continua sendo o equivalente histórico do assassinato de John F. Kennedy: um crime político cruel e chocante que abalou a nação. Nos Estados Unidos, o assassinato de Schneider tornou-se um dos estudos de caso mais renomados dos esforços da CIA para “neutralizar” um líder estrangeiro que se interpôs no caminho dos objetivos dos EUA.

 


Segundo relatório do Senado americano de 1975 intitulado Ação Secreta no Chile/1963-1973, os EUA gastaram 8 milhões de dólares em ações secretas apenas entre 1970 e o golpe de 1973. O jornal El Mecurio, maior do Chile e oposicionista a Allende, recebeu da CIA nada menos que 1,5 milhão de dólares.

O presidente americano Richard Nixon e Henry Kissinger, seu assistente para assuntos de segurança nacional, viam o novo presidente eleito democraticamente no Chile, como ameaça aos interesses dos EUA.

O regime de Washington tentou de tudo a fim de impedir que Allende tomasse posse. O presidente Richard Nixon reconheceu que havia dado instruções para “fazer qualquer coisa que não fosse uma ação do tipo dominicano” para impedir que o presidente democraticamente eleito do Chile assumisse o cargo, de acordo com um áudio da Casa Branca postada pelo Arquivo de Segurança Nacional.

Tudo isso em vão: em em 3 de novembro de 1970 o presidente socialista eleito assumiu o poder. “O Chile votou calmamente para ter um estado marxista-leninista, a primeira nação do mundo a fazer esta escolha livre e conscientemente”, relatou dramaticamente o embaixador dos EUA no Chile, Edward Korry, a Washington em um telegrama intitulado “Allende Vence” em 4 de setembro de 1970.

“Nós sofremos uma derrota dolorosa; as consequências serão nacionais e internacionais; as repercussões terão impacto imediato em alguns países, e efeito retardado em outros”, escreveu o diplomata americano.

A CIA, então, passou a promover encontros com militares chilenos a fim de provocar um golpe. O documento abaixo de 23 de outubro de 1973, desclassificado em 2000 nos Estados Unidos e publicado no sítio do NSA, comprova tal complô.

“A estação [Missão Diplomática americana em Santiago] tem feito um excelente trabalho guiando os chilenos ao ponto hoje onde a solução militar é pelo menos uma opção para eles”, é lido em um dos cabos secretos emitidos de Santiago, que menciona conversas entre oficias americanos e chilenos golpistas para a “solução militar”no Chile.

Um memorando secreto de 16 de novembro de 1973 enviado ao Secretário de Estado americano Henry Kissnger pelo embaixador dos EUA no Chile, Jack Kubisch, publicado no sitio do NSA (Department of State, Chilean Executions, role a tela), afirma que as execuções sumárias de cidadãos favoráveis a Allende nos dezanove dias que se seguiram ao golpe, já totalizaram 320 naquela data – mais de três vezes o número reconhecido publicamente.

Crimes de lesa-humanidade diante de postura muito além de silêncio conivente de Washington: ao mesmo tempo, Kubisch informa sobre a nova assistência econômica, recentemente autorizada pela administração de Nixon à ditadura chilena. O memorando fornece informações sobre a justificativa dos militares chilenos para a continuação das execuções.

Memorando secreto de 16 de novembro de 1973 enviado ao Secretário de Estado americano Henry Kissnger pelo embaixador dos EUA no Chile, Jack Kubisch, publicado no sitio do NSA (Department of State, Chilean Executions, role a tela), afirma que as execuções sumárias de cidadãos favoráveis a Allende nos dezanove dias que se seguiram ao golpe, já totalizaram 320 naquela data – mais de três vezes o número reconhecido publicamente.

Crimes de lesa-humanidade diante de postura muito além de silêncio conivente de Washington: ao mesmo tempo, Kubisch informa sobre a nova assistência econômica, recentemente autorizada pela administração de Nixon à ditadura chilena. O memorando fornece informações sobre a justificativa dos militares chilenos para a continuação das execuções.

Outra série de telegramas ultrassecretos emitidos em 1971 e 1972 pela Diplomacia americana em Santiago, liberados em julho de 2009, confirma ainda apoio próximo da ditadura militar brasileira quando o presidente era Emilio Garrastazú Médici, aos EUA no golpe chileno assim como em outros países da região.

“O regime [brasileiro] não hesitará em utilizar a ameaça de intervenção ou ferramentas de diplomacia, e ação secreta para se opor a regimes de esquerda, ou para manter governos amigos no poder”, relatou a CIA em determinado memorando de 1972.

Como resposta ao apoio brasileiro, segundo “determinado documento da CIA, o presidente Nixon prometeu” ajuda ao Brasil sempre e em tudo o que fosse possível.

O governamental Archivo Nacional de Chile registra que,

A partir de 11 de setembro de 1973, a ditadura civil-militar passou a aplicar à risca a Doutrina de Segurança Nacional, classificando os chilenos como inimigos internos, sujeitos perigosos, marxistas ou terroristas apenas por pensarem diferente. O exílio e o desenraizamento de milhares de compatriotas foi outra ferramenta do regime para violar sistematicamente os direitos humanos, e impor sua ‘Operação Limpeza’ em todo o país.

O sítio Memoria Chilena, da Biblioteca Nacional do Chile, relembra o mar de sangue que se tornou o Estádio Nacional de Santiago, desde os primeiros momentos após a derrubada de Allende:

Milhares de homens ficaram confinados no Estádio Nacional, enquanto suas mulheres e famílias se reuniram no exterior para saber em que condições se encontravam. No seu interior, os detidos foram sujeitos a torturas eléctricas e espancamentos, assédio psicológico, má alimentação e sobrelotação, situações que levaram à morte de várias dezenas deles. Os locais de detenção eram vestiários, salas de estar e banheiros. Os períodos de confinamento nas instalações variaram: alguns foram liberados após algumas semanas, outros foram transferidos para campos de concentração.

O Esquecido 11 de Setembro

O 11/9 do Chile perpetrado por Washington, acarretou consequências indesejadas aos chilenos. Procurado esta reportagem para comentar a aniversário do golpe militar no Chile, Noam Chomsky (imagem à direita) lamenta que o 11/9 chileno seja esquecido na região e ignorado em todo o mundo, enquanto grave terrorismo do Estado patrocinado por um governo estrangeiro. Isso, devido ao que o intelectual americano considera subproduto da imposição midiática americana, “quintal dos Estados Unidos” como se diz ao norte da América Latina. 

O docente estadunidense afirmou:

Neste ano, apresentei uma palestra [*] no Chile sobre o 50º aniversário do primeiro 11 de Setembro, em qualquer padrão que se possa levar em conta incomparavelmente pior do que Setembro de 2001. Não discutido isso, porque Washington foi a Al-Qaeda no Chile.
“[Para o Ocidente] houve apenas um 11 de Setembro: em 2001, em Nova Iorque. A ignorância ocidental sobre este assunto é fato bastante importante”, disse Noam Chomsky na palestra os chilenos em maio deste ano, pelo Zoom.

 
Para o intelectual estadunidense, autor de mais de cem livros, a propaganda dos EUA é tão poderosa que as sociedades globais não conseguem compreender que o “primeiro 11 de Setembro foi incomparavelmente pior que o 11 de Setembro americano”, desde que Pinochet (imagem à direita) tomou o poder no Chile.

“O segundo 11 de Setembro não derrubou o governo dos EUA, instalando uma ditadura cruel. O segundo 11 de Setembro não teve efeitos duradouros nos EUA”, observou Chomsky na palestra de maio. “O primeiro 11 de Setembro foi um ato de terrorismo e violência muito mais extremo do que tem sido reconhecido no Ocidente”, acescentou o intelectual. “Tudo isto foi apagado da história nos EUA, junto de muitas outras coisas semelhantes”.

O primeiro 11/9 há 50 anos, em setembro de 1973, foi incomparavelmente pior que 11 de Setembro americano. Isso é bem compreendido no Chile, é claro, onde se comemora o 50º aniversário do horror local, mas não em outros lugares, onde a propaganda dos Estados Unidos é tão poderosa que as pessoas não conseguem compreender isto. Incrível como isso foi suprimido da consciência coletiva. Uma evidência da eficácia do poder propagandístico americano.


Sob todos os aspectos que se possa considerar, o 11/9 chileno foi muito mais grave que o tão comentado 11/9 norte-americano. E existem evidências muito mais sólidas da participação de Washington – réu confesso – no financiamento do golpe chileno, do que sobre a frágil (para dizer o mínimo) versão oficial do 11/9 em território estadunidense que diz que, de uma caverna no Afeganistão entre sessões de hemidiálise, Osama bin Laden (quem repetidas vezes negou as acusações) orquestrou ataques aéreos nos locais mais seguros do planeta.

Além do mais, o Estado afegão propriamente jamais atacou os Estados Unidos, o que invalidaria a “resposta” de Washington através da “Operação Liberdade Duradoura” naquele pais centro-asiático.

No Chile, fruto da memória e incansável luta por verdade baseada no senso de dignidade do povo chileno, mais ex-ditadores foram condenados em junho deste ano: o general Santiago Sinclair de 92 anos foi sentenciado a 18 anos de prisão por ter participado da Caravana da Morte e coordenado o crime de 12 camponeses, além dos militares Juan Chiminelli de 86 anos, Pedro Espinoza de 90 e Emilio de la Mahotiere de 86, todos pela participação no referido massacre. Apesar das elevadas idades, os ex-ditadores foram levados à prisão.

Valendo recordar que o ex-ditador Augusto Pinochet morreu  em 2006 na cadeia, aos 91 anos de idade condenado à prisão domiciliar perpétua.

Jurisdição internacional

No dia 21 de setembro, um grupo de congressistas norte-americanos apresentou desculpas formais pelo comprovado papel de Washington no golpe militar no Chile que derrubou, em setembro de 1973, o presidente democraticamente eleito Salvador Allende, e pelos graves crimes cometidos durante ditatura militar que o seguiu, até seu fim em 1990.

Perguntado por esta reportagem sobre as possibilidades de se punir os EUA pelo golpe militar chileno e os graves crimes durante os 17 anos que o seguiram, Chomsky acredita que “não está claro se existe alguma estrutura estabelecida para processar os EUA por seus crimes, embora no caso de algum Estado inimigo as equipas jurídicas [norte- americanas] sejam capazes, sem dúvida, de inventar alguma”.

 
Há diversos tratados aprovados e aprimorados através das décadas desde a instauração do Tribunal de Nuremberg, marco no direito internacional que puniu os nazistas pós-Segunda Guerra Mundial. Neste sentido, Chomsky observa que existe um quadro jurídico estabelecido para apresentar acusações contra Estados por crimes: a Corte Internacional de Justiça (CIJ).

E cita como exemplo o caso em que exatamente um país latino-americano apresentou litígio internacional contra os Estados Unidos, ganhando a causa. 

A Nicarágua seguiu esse caminho na década de 1980, e ganhou o caso. A CIJ condenou os EUA pelo ‘uso ilegal da força’, e ordenou-lhes que pagassem reparações substanciais. Os EUA responderam intensificando o ataque criminoso enquanto a imprensa considerava a Corte um ‘fórum hostil’, tendo como prova disso o fato de ter ousado condenar os EUA.

A Nicarágua processou os Estados Unidos em 1984 por “atividades paramilitares em solo nicaraguense, e contra o Estado nicaraguense”, o famoso Irã-Contras que jogou o então presidente estadunidense Ronald Reagan na lama da história.

Vencendo a causa em junho de 1986 com base nos artigos de lei da Responsabilidade dos Estados por Atos Internacionalmente Ilícitos, regras do direito internacional que regulam a responsabilidade dos Estados, definindo que:

Um Estado viola o direito internacional quando comete “ato interno ilícito”, ou seja, violação de uma obrigação internacional pela qual o Estado esteve envolvido no momento em que o ato ocorreu. Um Estado deve agir de acordo com tratados internacionais que assinou [grifo nosso];
O artigo 36 estipula que “o Estado responsável por um ato internacionalmente ilícito, encontra-se obrigado a compensar os danos causados por isso”.

Os Estados Unidos são signatários deste tratado, bem como todos os países-membro da ONU. Enquanto o golpe militar no Chile há 50 anos foi um dos crimes mais violentos da história dos Estados latino-americanos, tanto quanto o terrorismo de Estado que duraria 17 anos, iniciado por Pinochet então.

Já em 1970 Roberto Ago, ex-jurista italiano da CIJ (1979-1995) e responsável por estabelecer a estrutura básica e a orientação do projeto de responsabilização dos Estado, afirmou no Yearbook of the International Law Commission da ONU, sobre tais artigos de lei:

Os princípios que regem a responsabilidade dos Estados por atos internacionalmente ilícitos, mantendo uma distinção estrita entre esta tarefa e a tarefa de definir as regras que impõem obrigações aos Estados, cuja violação pode gerar responsabilidade… Uma coisa é definir uma regra e o conteúdo da obrigação que aquela impõe, e outra coisa é determinar se esta obrigação foi violada, e quais devem ser as consequências da violação.


As questões trazidas por Chomsky retomam a discussão sobre o papel que os Estados Unidos desempenham, historicamente, na “democracia” latino-americana, e também levantam a tão indigesta quanto providencial pergunta: quais vidas valem mais?

***

Abaixo, transcrição da palestra apresentada em inglês por Nopam Chomsky aos chilenos em maio, via Zoom, traduzida ao português com exclusividade por esta reportagem:

Esta é a época dos aniversários. O 20º aniversário da invasão do Iraque pelos EUA, o 50º aniversário do acordo para acabar com a guerra no Vietnã, e o 50º aniversário do primeiro 11 de Setembro – o 11 de Setembro chileno.

Aprendemos muito sobre o provável futuro, perguntando-nos como estes acontecimentos são comemorados pelo país mais poderosos da história mundial, e seus aliados.

Vamos começar com o primeiro 11 de etembro. Se eu mencionasse isso nos EUA ou na maior parte do Ocidente, poucos teriam ideia do que estou falando. Houve apenas um 11 de Setembro, em 2001, em Nova Iorque. A ignorância ocidental sobre este assunto é fato bastante importante, de grande importância para os dias de hoje e para o futuro.

Seja como for, o primeiro 11 de Setembro foi um ato de terrorismo e violência muito mais extremo do que tem sido reconhecido no Ocidente. É claro que foi ato de terror: terrorismo de Estado. Os EUA foram fundamentais na preparação do golpe de Pinochet, regozijaram-se com o seu sucesso e ofereceram enorme apoio diplomático e material à ditadura imposta.

Passemos às comparações dos dois 11 de Setembros. A forma correta de comparar seu impacto é em termos per capita: a população dos EUA em 2001 era cerca de 30 vezes maior que a população chilena em 1973.

Suponhamos, então, que o número de vítimas nos EUA tenha sido comparável ao primeiro 11 de Setembro. Isso significaria 150 mil mortes, e praticamente um milhão de vítimas de tortura. O segundo 11 de Setembro foi bastante grave, mas nem de longe parecido com aquele outro.

Isto, considerando apenas números brutos. E havia muito mais do que isso. O segundo 11 de Setembro não derrubou o governo dos EUA, instalando uma ditadura cruel. O segundo 11 de Setembro não teve efeitos duradouros nos EUA. Teve efeitos importantes na região da Ásia Central e Médio Oriente, mas não efeitos atrativos, embora isso seja outra história.

Em contraste, os efeitos do primeiro 11 de Setembro foram drásticos. O Chile ainda está, agora, 50 anos depois, lutando para superar os efeitos da destruição da florescente democracia chilena, sendo desnecessário dizer que se trata de uma luta difícil.

Voltemos ao 50º aniversário do acordo de paz do Vietnã. Quatro anos mais tarde, em 1977, o Presidente Carter foi questionado em entrevista coletiva se os EUA tinham alguma dívida com o Vietnã pela matança, ruína e pelos destroços – que ainda persistem enquanto crianças morrem devido à guerra química massiva dos EUA no Vietn ãdo Sul, sempre o principal principal alvo do ataque dos EUA, o pior crime desde a Segunda Guerra Mundial. Carter respondeu dizendo que não temos “nenhuma dívida” com o Vietnã porque “a destruição foi mútua”. Recorde-se que Carter foi único entre os presidentes dos EUA na preocupação com os direitos humanos, e depois de deixar o cargo compilou um registo honroso, incomparável na história presidencial, ou na história de outros Estados imperialistas.

A reação de Carter aos crimes no Vietnã não suscitou abordagens na mídia predominante internacional, por boas razões. Era a norma na opinião liberal. No final da guerra, em 1975, os opositores mais extremos da guerra nos meios de comunicação dos EUA escreveram que a guerra começou com “esforços desajeitados para fazer o bem”, mas acabou sendo um erro porque os EUA não conseguiram levar democracia ao Vietnã, a um custo aceitável para si próprio. Não insultarei a inteligência coletiva, comparando este comentário com fatos muito bem documentados.

Voltemos ao terceiro aniversário, ao 20º aniversário da invasão do Iraque, o pior crime deste século. Houve uma entrevista com seu perpetrador, o presidente George W. Bush. No Washington Post, um dos dois principais jornais nacionais. Na seção Style ele foi retratado como um vovô adorável, brincando alegremente com os netos e exibindo retratos que pintou de pessoas famosas que conheceu.

Novamente nenhum comentário, exceto aqueles que o acham simplesmente adorável, como Michelle Obama, quem disse: “Eu o amo demais. Ele é um homem maravilhoso. Ele é um homem engraçado”.

Nem todo mundo no mundo ri.

O governo dos EUA comemorou oficialmente o 20º aniversário. Uma das atrocidades mais horrorosas da invasão foi o ataque assassino a Fallujah, destruindo uma das mais belas cidades do Iraque com números desconhecidos de mortes de civis: um agressor imperialista não se preocupa em calcular trivialidades, como o preço das suas depredações.

Para comemorar os crimes em Fallujah, a Marinha dos EUA encomendou o seu mais novo navio de ataque, batizando-o de USS Fallujah, com uma declaração eloquente sobre o heroísmo dos fuzileiros navais que levaram a cabo aquele “nobre esforço”.

Tais coisas não são noticiadas na grande mídia dos EUA, mas este é um país livre, de maneira que você apenas pode ler sobre isso nas margens dos noticiários, isso ainda se puder encontrá-las.Você também pode ler a reação dos iraquianos, que não acharam graça. O jornalista Nabil Salih escreve que “a selvageria dos EUA não terminou” com o massacre em massa de mulheres e crianças, e “regar Fallujah com urânio empobrecido e fósforo branco”. Vinte anos e incalculáveis defeitos congénitos depois, a Marinha dos EUA está nomeando um dos seus navios de guerra como USS Fallujah… É assim que o Império dos EUA continua a guerra contra os iraquianos. O nome de Fallujah, arrasado com fósforo branco implantado nos ventres das mães por várias gerações, é também um despojo de guerra… O que resta é a ausência assustadora de membros da família, casas bombardeadas até a destruição total e fotografias incineradas de rostos sorridentes.

Em vez disso, um sistema letalmente corrupto de camaradagem inter-sectária do roubo foi-nos legado pelos impunes criminosos de guerra de Downing Street e de Beltway, Londres e Washington, as primeiras grandes democracias ocidentais.

Podemos comparar tudo isso com a enxurrada de retórica enfurecida sobre Vladimir Putin, ao lado de Hitler como a figura mais perversa da história. Novamente, não insultarei sua inteligência comentando isso.

Por que a diferença de reação em todos esses casos? Isto foi explicado simplesmente pelo grande romancista e ativista indiano Arundhati Roy, comentando a reação na Índia aos pronunciamentos apaixonados do Ocidente sobre a luta cósmica entre a democracia e a autocracia na Ucrânia: “A Ucrânia certamente não é vista aqui como algo com uma clara história moral para contar. Quando pessoas pardas ou negras são bombardeadas ou ficam chocadas e pasmadas, isso não importa, mas com pessoas brancas isto deve ser diferente.”

Isto também é ininteligível nos círculos ocidentais civilizados, onde o racismo está tão profundamente enraizado que não pode ser notado. Refletindo sobre estas questões, aprendemos um pouco mais sobre as prováveis perspectivas do futuro.

Vejamos algumas outras lições instrutivas da história recente. Porque os EUA estavam tão empenhados em destruir a democracia chilena e instituir um horrível reinado de terror, celebrando-o depois com grandes elogios e apoio pródigo?

A resposta foi dada por Henry Kissinger, figura principal do crime – um dos muitos triunfos de um dos grandes assassinos em massa da história recente ,e o mais homenageado do Ocidente. Kissinger explicou que o Chile de Allende era um vírus que poderia infectar outros: o seu sucesso na concretização da social-democracia por meios parlamentares poderia encorajar outros, que enfrentam repressão semelhante, fazendo o mesmo, e o regime de dominação dos EUA poderia ser seriamente desgastado.

Kissinger não estava inventando nada de novo. Ele estava repetindo uma das principais doutrinas da violência imperialista. Os grandes estadistas da Europa tiveram a mesma preocupação em relação à revolução americana há 240 anos, para dar um exemplo. Outra, mais recente, é a decisão dos EUA de entrar em guerra com o Vietnã em 1950. Os registos internos revelam a mesma preocupação: um Vietnã independente, bem sucedido, seria um vírus que poderia infectar a região, minando a ordem neocolonial do pós-guerra que os EUA estavam, então, construindo.

Como lidar com um vírus que espalha o contágio? Simples. Você destrói o vírus e inocula vítimas em potencial. Esta é a verdadeira história da guerra dos EUA contra o Vietnã, que durou 25 anos. O ataque praticamente destruiu o vírus: o Vietnã sobreviveu, mas não como modelo de desenvolvimento independente bem-sucedido. A região foi vacinada com sucesso pela instalação de ditaduras cruéis. O sucesso final ocorreu na Indonésia, rica em recursos, que tinha sido um alvo importante da subversão dos EUA devido à sua independência.

Em 1965, o problema da Indonésia foi resolvido. O golpe de Suharto apoiado pelos EUA destruiu o governo parlamentar, assassinou centenas de milhares de pessoas, demoliu o principal partido político – um partido dos pobres –, abrindo o país à livre exploração pelo capital ocidental.

Em retrospectiva, o Conselheiro de Segurança Nacional Kennedy-Johnson, McGeorge Bundy, um dos principais arquitetos do massacre do Vietnã, refletiu que poderia ter sido sensato terminar a guerra em 1965, após o golpe de Suharto. O vírus já foi esmagado, e o círculo de ditaduras apoiadas pelos EUA evitou qualquer ameaça de propagação do vírus do desenvolvimento independente bem-sucedido. Os EUA alcançaram os seus principais objetivos de guerra. O que se seguiu, foi desnecessário.

Estas são mais observações corretas, mas incompreensíveis nas sociedades ocidentais “bem disciplinadas”. A visão padrão é que os EUA perderam a guerra – o que significa que apenas alcançaram os seus principais objetivos de guerra, mas não alcançaram nada como a conquista das Filipinas no início do século XX, ou muitas façanhas semelhantes.

Os chilenos estavam bem conscientes dos massacres indonésios. Talvez se lembrem das advertências de que “Jacarta está chegando”, enquanto o terreno estava sendo preparado para o golpe de Pinochet.

A mesma lógica se aplica ao caso do vírus Allende. O vírus foi destruído pelo golpe inspirado por Nixon e Kissinger, e as regiões vizinhas foram inoculadas pela imposição de Estados de Segurança Nacional ao estilo neonazi.

O golpe de Pinochet chegou tarde. O processo já estava em andamento, em reação a outro contágio disseminador de vírus: Cuba. Um ano após a libertação de Cuba, em janeiro de 1959, em março de 1960, a administração de Eisenhower decidiu secretamente derrubar o governo.

Houve motivos, os de sempre: a preocupação com o vírus. Uma das coisas boas dos Estados Unidos é que são uma sociedade muito livre e aberta, segundo padrões comparativos. Temos um rico registro documental de planejamento interno.

Ficamos sabendo, com isso, que a CIA informou a Casa Branca que a derrubada do regime de Castro “era a chave para toda a América Latina; se Cuba tiver sucesso, podemos esperar que a maior parte da América Latina caia”. O Conselho de Planejamento Político do Departamento de Estado rapidamente expandiu estas preocupações: “o principal perigo que enfrentamos em Castro”, concluiu, está “no impacto que a própria existência do seu regime tem sobre o movimento esquerdista em muitos países latino-americanos… O simples fato é que Castro representa um desafio bem-sucedido aos EUA, uma negação de toda a nossa política hemisférica de quase um século e meio” – isto é, de volta à Doutrina Monroe, que afirmava a intenção e o direito de Washington de dominar o hemisfério.

Outros planificadores de alto-grau também compreenderam, incluindo os torturadores do Chile. O Conselho de Segurança Nacional de Nixon alertou que se não conseguirmos controlar o nosso próprio quintal na América Latina, não seremos capazes de “alcançar uma ordem bem sucedida noutros lugares do mundo”: isto é, impor o nosso domínio sobre o mundo.

Henry Kissinger disse, ao expressar o seu apoio às guerras terroristas de Reagan na América Central: “se não conseguirmos controlar a América Central, será impossível convencer as nações ameaçadas no Golfo Pérsico e em outros lugares de que temos a capacidade de controlar o equilíbrio global; traduzindo para uma linguagem precisa, não seremos capazes de governar o mundo de forma eficaz – sempre para o bem da humanidade, por definição”.

As preocupações de Kissinger sobre o controle dos EUA nas regiões produtoras de energia do 

Oriente Médio ecoaram um velho refrão nos círculos políticos dos EUA. Quando a Segunda Guerra Mundial terminou e os EUA se prepararam-se para governar o mundo do pós-guerra, o Departamento de Estado descreveu estas regiões como um dos maiores prémios materiais da história mundial, a região estrategicamente mais importante do mundo. O controle destas regiões proporcionará a Washington “o controle substancial do mundo”, nas palavras do influente planeador A.A. Berle, uma figura proeminente na administração de Roosevelt e posteriormente nas administrações liberais.

Vale lembrar que os EUA são um império global. As políticas implementadas  em uma região são normalmente duplicadas noutras. Os EUA têm responsabilidades globais, como disse Kissinger; os aliados têm apenas responsabilidades regionais. Esse tem sido o papel de Washington desde que tomou a gestão global da Grã-Bretanha após a Segunda Guerra Mundial, embora em âmbito e com ambições muito maiores.

A administração de Kennedy respondeu imediatamente ao crime de Cuba de desafiar com sucesso a política imperialista dos EUA. O primeiro passo foi a invasão da Baía dos Porcos. Quando isso falhou, Kennedy lançou uma grande guerra terrorista para levar “os terrores da Terra” para Cuba, nas palavras do seu confidente e conselheiro para a América Latina, o historiador liberal Arthur Schlesinger. Kennedy também impôs um regime de sanções de uma selvageria sem precedentes, que ainda persiste.

Irrelevantemente, o regime de sanções é combatido por todo o mundo. Este fato é ilustrado todos os anos na votação anual sobre as sanções na Assembleia Geral da ONU. A oposição é unânime, com exceção dos EUA e de Israel, forçado a votar com seu protetor. Essa irrelevância quase não é noticiada e não preocupa a hegemonia imperial. Os aliados dos EUA que se opõem às sanções, no entanto, obedecem-nas. Não é sábio ofender o Padrinho.

Não deveria haver necessidade de rever os detalhes deste exercício de sadismo internacional.

Kennedy também compreendeu a lógica imperial padrão: quando existe um vírus que espalha o contágio, não se deve apenas destruir o vírus, mas também inocular as vítimas. Assim, em 1962, Kennedy mudou a missão das forças armadas latino-americanas de “defesa hemisférica”, para “segurança interna”.

É claro que os EUA foram capazes de determinar a missão das forças armadas latino-americanas, uma questão de rotina.

A defesa hemisférica era um anacronismo, um resquício da Segunda Guerra Mundial. A segurança interna, por outro lado, não é brincadeira. No contexto latino-americano, significa guerra contra a população civil. As consequências previsíveis foram descritas por Charles Maechling, que liderou a contra-insurgência e o planeamento da defesa interna dos EUA nas administrações Kennedy e Johnson.

A decisão de Kennedy em 1962, escreveu ele, mudou a posição dos EUA da tolerância “da rapacidade e da crueldade dos militares latino-americanos” para a “cumplicidade directa” nos seus crimes, para o apoio dos EUA aos “métodos dos esquadrões de extermínio de Heinrich Himmler”.

O primeiro grande alvo foi o Brasil. Em 1964, um golpe militar derrubou o governo parlamentar e estabeleceu a primeira das ditaduras assassinas que se espalharam pelo continente, com uma terrível praga de repressão. Todos foram fortemente apoiados, em alguns casos virtualmente criados, pelo governo dos EUA.

O golpe brasileiro foi elogiado pelo embaixador de Kennedy e Johnson, Lincoln Gordon, que o saudou como “a vitória mais decisiva para a liberdade em meados do século XX”. Foi, disse ele, uma “rebelião democrática” que ajudaria a “restringir os excessos da esquerda” e deveria “criar um clima muito melhor ao investimento privado”.

Gordon tornou-se presidente da John’s Hopkins, uma das grandes universidades dos EUA.

O padrão ressoou por todo o hemisfério. O Chile foi apenas mais uma vítima. A praga atingiu a América Central nos anos de  Reagan, terminando em 1989 com o assassinato de seis importantes intelectuais latino-americanos, padres jesuítas, pela brigada de elite Atlacatl, recém-saídos de um treinamento renovado pelas forças especiais dos EUA sob ordens diretas do Comando Militar Superior, que esteve sempre em contato próximo com a Embaixada dos EUA.

Poucos americanos sabem os nomes dos padres assassinados. Ou tenha alguma consciência do registro terrível. Este é mais um testemunho do sucesso da doutrinação profunda nas sociedades livres, o que por vezes é chamado de “lavagem cerebral sob liberdade”. É rotineiro, e com consequências graves.

O grande romancista americano e ativista anti-guerra, Mark Twain, escreveu há muito tempo: “

é pela bondade de Deus que, em nosso país, temos essas três coisas indescritivelmente preciosas: liberdade de expressão, liberdade de consciência e a prudência, nunca praticando nenhuma delas”.

É tudo parecido com a Inglaterra, a primeira grande democracia moderna. Na Inglaterra, escreveu George Orwell, “as ideias impopulares podem ser silenciadas e os fatos inconvenientes mantidos no escuro, sem necessidade de nenhuma proibição oficial”. Um dispositivo é uma “boa educação”, que inculca a compreensão de que há certas coisas que “não seria bom dizer” – nem sequer pensar.

Seu ensaio, que pretendia ser uma introdução de seu famoso livro Animal Farm, não foi publicado.

A América Latina tem agora, mais uma vez, uma oportunidade de escapar à sua história conturbada de violência e repressão internas e de subjugação ao poder externo. As recentes eleições no Chile, na Colômbia, na Argentina e, mais recentemente, no Brasil, oferecem uma esperança renovada. Renovado, porque antes houve esperanças que foram frustradas pelos demônios gêmeos da América Latina.

Há um ditado famoso no México sobre os demónios gémeos, as raízes da promessa falhada do país: o México está demasiado perto dos Estados Unidos e demasiado longe de Deus.

A primeira frase – demasiado próxima dos Estados Unidos – é autoexplicativa à luz da história. Podemos entender esta última frase – demasiado longe de Deus – como referindo-se à doença interna do México, da América Latina em geral. A doença é destacada pela comparação da América Latina com o Leste Asiático. Segundo medidas objectivas, a América Latina parece ter todas as vantagens sobre a Ásia Oriental: recursos naturais abundantes, ausência de inimigos externos, uma rica cultura intelectual.

Por que então as diferenças radicais no desenvolvimento nos últimos anos? Há meio século, a Coreia do Sul estava ao nível de um país africano pobre. Hoje é uma das principais potências industriais do mundo. Taiwan emergiu de uma dura repressão para se tornar não apenas uma democracia vibrante, mas também o líder mundial na produção de chips de computador que constituem o núcleo da economia moderna. O mesmo se aplica em toda a região – com a notável excepção das Filipinas, o único país que não se libertou do amargo legado da conquista assassina dos EUA há 120 anos.

A América Latina, apesar das suas vantagens, está muito atrás.

O paradoxo foi investigado por ilustres economistas internacionais. Eles identificam uma forma principal pela qual a América Latina está demasiado longe de Deus, metaforicamente falando: as suas elites escaparam ao controlo público e mostram pouca responsabilidade pelos seus países.

Na Ásia Oriental, as importações são bens de capital e o investimento estrangeiro é direcionado pelo planeamento nacional para objetivos de desenvolvimento específicos. Na América Latina, as importações são bens de luxo para os ricos e o investimento destina-se à extracção de recursos. Os ricos da América Latina exportam capital livremente. No Leste Asiático, foi proibido e poderá enfrentar penalidades severas. O capital é direcionado para o desenvolvimento econômico. Existem muitas divergências semelhantes.

Embora sejam pinceladas amplas, elas têm, no entanto, uma validade considerável.
No sistema global emergente, a América Latina tem a oportunidade de se libertar da proximidade excessiva dos Estados Unidos. Há movimentos em direcção a um sistema mais diversificado de ordem global, em direcção a uma espécie de multipolaridade. Durante os dois primeiros mandatos de Lula, o Brasil tornou-se um ator importante no cenário mundial, altamente considerado em grande parte do mundo por suas iniciativas. Há sinais precoces de que este estatuto poderá ser recuperado, juntamente com as iniciativas de cooperação e apoio mútuo entre os países da América Latina: entre eles a UNASUL, mais amplamente a CELAC, a próxima cimeira UE-CELAC, o reforço das relações comerciais e diplomáticas com a China.

Em outras partes do mundo também há indícios de difusão de centros de poder tradicionais. Um exemplo dramático recente é o acordo mediado pela China entre o Irão e a Arábia Saudita, anteriormente inimigos ferrenhos, um acordo que poderá pôr fim à horrível guerra por procuração no Iémen, uma das maiores catástrofes humanitárias dos últimos anos. É um movimento em direção à paz que afeta a política de longa-data dos EUA, suscitando muita preocupação nos altos escalões.

Internamente na América Latina, os desenvolvimentos recentes oferecem mais uma vez alguma esperança de lidar com as doenças que envenenaram o que deveriam ser sociedades prósperas e prósperas – embora não sem luta dedicada, como o povo do Chile sabe muito bem.


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Edu Montesanti