Chegamos ao Congresso a defender a paz, a vida, a democracia, os direitos humanos
Escrito por Administrador
A Força Alternativa Revolucionária do Comum é consciente do significado que tem para a vida política do país nossa presença no Congresso da República. De alguma maneira este fato sintetiza o novo que está acontecendo em Colômbia.
Chegamos a este cenário de debate político, depois de mais de meio século de dura confrontação político-militar com o Estado. Se contam por milhões as vítimas do conflito que teve sua origem na exclusão política e na expropriação violenta da terra dos campesinos e povos étnicos, por parte do latifúndio, amparado na histeria anticomunista que invadiu o hemisfério ocidental após a segunda guerra mundial e que encontrou eco nos salões do Congresso, através das vozes de alguns dos representantes dos partidos tradicionais, liberal e conservador.
Ninguém, nesse momento, pôde chegar a imaginar que a tragédia iniciada poderia chegar a se prolongar por tanto tempo e, menos ainda, que alcançaria os níveis dantescos que todos conhecemos; lição que deveriam ter presente aqueles que, como uma repetição irônica da história, hoje em dia se empenham em atiçar a fogueira dos ódios e dos desencontros.
São inumeráveis as consequências do conflito social e armado em termos de vidas perdidas, de despedaçamento social; de deslegitimação e distanciamento do Estado frente à base social e aos territórios, de perdas econômicas. De alguma maneira, todos os colombianos fomos vítimas neste drama.
Para nossa sorte e regozijo da comunidade internacional, a menos de dois anos de firmado o Acordo de Paz, são evidentes seus benefícios, Colômbia já não será a mesma, apesar do empenho com que trabalham alguns setores por conseguir a deformação do acordado e impedir sua implementação.
Ao tempo em que reconhecemos no presidente Juan Manuel Santos seu decidido aporte para alcançar o fim do enfrentamento armado, devemos assinalar que seguem pendentes desenvolvimentos normativos muito importantes do Acordo; ademais que, na sua passagem pelo Congresso da República e pela Corte Constitucional, foram introduzidas alterações substanciais que põem em dúvida o caráter de política de Estado em matéria tão importante para a sociedade como o é o direito à paz.
Não pode seguir sucedendo que interesses particulares se imponham acima do interesse geral dos colombianos. Corresponde ao conjunto da sociedade assumir a defesa do pactuado, como algo que é patrimônio de todos, frente aos embates dos setores mais retardatários do país, que veem na continuidade do conflito armado a possibilidade de perpetuar seus privilégios.
Não deixa de preocupar a anunciada intenção do presidente eleito de introduzir mudanças num tratado de paz que é norma constitucional, que à luz do Direito Internacional Humanitário tem caráter de Acordo Especial e que, em virtude de uma declaração unilateral de Estado, foi incorporado como documento oficial do Conselho de Segurança das Nações Unidas, numa resolução do dito Conselho.
Pretender aproveitar a circunstância temporária de algumas maiorias parlamentares para burlar os compromissos assumidos pelo Estado no Acordo de Paz não só reflete a mesquinhez daqueles que se opõem à sua consolidação como também, ademais, expõe o país ante a comunidade de nações, que certamente não entenderá que um Estado possa desconhecer compromissos assumidos sob a tutela das normas internacionais.
Combinamos com o Estado a composição de um Sistema Integral de Verdade, Justiça, Reparação e Não Repetição [SIVJRNR] que, até onde é possível em casos de conflitos como o colombiano, restabeleça os direitos às vítimas e fixe responsabilidades pelos fatos mais graves ocorridos no marco e no contexto do conflito, tendo como base a verdade, condição necessária para a reconciliação e a geração de novas condições de convivência pacífica.
Utilizar o nome das vítimas para escapar das próprias responsabilidades frente ao SIVJRNR, ademais de um ignóbil propósito, constitui uma afronta contra seus familiares e sua memória. Chamamos aos que pretendem desmantelar esta parte substancial dos acordos a desistirem de suas intenções, que são semente de futuros conflitos.
Não se pode conceber uma paz estável e duradoura sim a necessária segurança jurídica, que ponha fora do alcance do ódio e da vingança aos que, de boa-fé, deixaram as armas para transitarem ao caminho da luta política legal e aberta. Hoje, dois de nossos porta-vozes mais destacados na mesa de negociação, Iván Márquez e Jesús Santrich, signatários dos acordos e parlamentares eleitos, não poderão assumir como congressistas, como consequência da incerteza e das ciladas estendidas pelos que, dentro e fora da Colômbia, estão empenhados em impedir a consolidação do processo.
A acima dito se acrescenta a manifesta incapacidade do Estado e do governo para cumprirem seus compromissos em matéria de reincorporação socioeconômica dos ex-guerrilheiros e pôr em liberdade a totalidade dos prisioneiros da insurgência, apesar de que há mais de ano e meio foi sancionada a lei de anistia, todo o qual também afeta a confiança necessária neste tipo de processos.
Porém, que não caiba dúvida, com nossos representantes no Congresso da República seguiremos defendendo a paz como o bem mais precioso para todos os colombianos, a vida em todas as suas expressões e manifestações, a ampliação e o aprofundamento da democracia e dos direitos humanos, síntese da consciência universal, do dever ser, quanto a condições mínimas de existência digna para os povos.
Seguiremos lutando por materializar a Reforma Rural Integral e a substituição voluntária e combinada dos cultivos de uso ilícito; por tornar realidade as reformas política e eleitoral que acabem com a corrupção reinante; por plenas garantias para a mobilização e o protesto social; para que cesse a violência que ceifa a vida dos melhores homens e mulheres, que assumem liderança em suas comunidades; por melhorar as condições de vida material e espiritual dos milhões de colombianos excluídos; por uma paz completa e integral que ponha fim a toda expressão armada do conflito social e político, o que implica na culminação exitosa dos diálogos com o Exército de Libertação Nacional [ELN] e o acolhimento à justiça dos denominados bandos sucessores do paramilitarismo.
Tendo como bandeira estes objetivos, somados a nosso programa político, faremos utilização do direito a nos declarar oposição ao governo que inicia funções no próximo 7 de agosto, e alternativa de mudança frente ao sistema econômico e político que o presidente eleito representa.
A saída à crise econômica, política, social, ambiental e cultural, que afeta a sociedade colombiana e que golpeia duramente de maneira especial os milhões de colombianos do comum, não está no programa de governo neoliberal que apresentou em seu momento o candidato Iván Duque.
Nos reconhecemos como parte da Convergência da Esperança que agrupa as bancadas do Partido Aliança Verde, Polo Democrático Alternativo, Decentes, MAIS. Nossas cadeiras e todo o esforço político e organizativo da Força Alternativa Revolucionária do Comum estarão em função de consolidar esta convergência pela paz e a vida, materializada numa agenda legislativa comum e outras iniciativas que acordemos, sem detrimento de nossas próprias iniciativas e identidade.
Fiéis ao que tem sido nossa história, estaremos presentes em toda forma de resistência e mobilização de massas pela defesa dos interesses dos mais humildes.
Não podemos deixar de mencionar e agradecer o aporte decidido dos governos e dos povos de Cuba e Noruega, como garantidores do processo; de Venezuela e Chile, como acompanhantes; assim como à Organização das Nações Unidas e ao conjunto da comunidade internacional para que o processo de paz seja uma realidade.
Conselho Político Nacional, Força Alternativa Revolucionária do Comum, FARC.
20 de julho de 2018.
Tradução > Joaquim Lisboa Neto