EUA e Coreia do Sul estariam preparando uma "Primavera Árabe" na Coreia do Norte?
"Instabilidade", "mudança de regime" e "colapso" do sistema norte-coreano são discutidos por especialistas estadunidense e sul-coreanos
Eduardo Vasco, Pravda. Ru
Parece improvável que os EUA tentem atacar militarmente a Coreia do Norte e iniciar uma guerra convencional na Península Coreana, ainda mais após o recuo devido à posse de armas nucleares por parte de Pyongyang, o que é um mecanismo de dissuasão daquele país.
Mas, mesmo após a diminuição do tom agressivo na retórica do presidente estadunidense, Donald Trump, a Coreia do Norte continua atenta. Recentemente, o diário oficial Rodong Sinmun afirmou que "Washington ainda tem planos de ocupar a parte norte da Península Coreana com a ajuda de seus aliados, Japão e Coreia do Sul".
Também na última sexta-feira (5), o país acusou EUA e Coreia do Sul de planejarem um atentado terrorista contra o líder norte-coreano Kim Jong-un, a partir de uma ação orquestrada pelas agências de inteligência desses dois países dentro de território da Coreia do Norte que causaria seu assassinato com substâncias bioquímicas.
Certamente o governo norte-coreano, por meio de seu aparato de espionagem e contraespionagem, vigia os passos e as tramas de seus inimigos nesse sentido e acompanha as manobras dos EUA e aliados. O Ocidente também conta com projetos secretos e encobertos para tentar levar adiante seu objetivo público de derrubar o governo norte-coreano.
O establishment estadunidense vem estudando formas de alcançar essa meta há décadas, sem qualquer resultado contundente até o momento. Uma recente iniciativa busca encontrar fórmulas para concretizar tal desejo sem que seja necessária uma guerra convencional, mas sim utilizando meios mais sutis de agressão.
O NK Instability Project (Projeto de Instabilidade da Coreia do Norte), conduzido pelo Instituto EUA-Coreia da Escola de Estudos Internacionais Avançados da Universidade Johns Hopkins, em Washington, tem realizado uma série de workshops entre 2016 e 2017 para discutir as possibilidades de desestabilização e colapso do governo e do sistema político e econômico da Coreia do Norte.
O Instituto recebe apoio do governo da Coreia do Sul, da Carnegie Corporation, da MacArthur Fundation e de doadores sul-coreanos e estadunidenses. Membros do projeto também têm ligações com os governos de EUA e Coreia do Sul.
A partir dos workshops, os acadêmicos e pesquisadores têm produzido relatórios nos quais analisam minuciosamente cenários de "caos" e "mudança de regime" no país asiático.
Em um deles, intitulado "The Arab Spring and North Korea" (A Primavera Árabe e a Coreia do Norte), o autor, Dr. In Nam-sik, especialista sul-coreano em Oriente Médio, aborda a possibilidade de ocorrer uma revolta no norte da península coreana igual às que foram vistas nos países árabes recentemente, conhecidas como "Primavera Árabe".
Segundo o autor, uma "mudança de regime" na Coreia do Norte poderia ser semelhante às ocorridas na Tunísia, no Egito e na Líbia. No primeiro caso, o governo foi destituído e o país procura atualmente seguir uma linha democrática liberal ao estilo do Ocidente, embora com dificuldades; no segundo, o sistema pouco mudou e parece estar somente dando continuidade ao regime anterior; no terceiro, praticamente não existe mais governo e o país se transformou em um território dividido em tribos que lutam entre si para conquistar o poder, enquanto grupos terroristas como o ISIS têm forte presença no local.
Outros autores também comparam o possível futuro da Coreia do Norte com o de outras nações que experimentaram regimes semelhantes e que foram derrubados, como União Soviética, Alemanha Oriental, Romênia e Albânia.
Discutem a possibilidade da queda do governo por meio de pressões e sanções internacionais, o que vem ocorrendo há anos, causando dificuldades econômicas e humanitárias. A radicalização dessa estratégica, embora ainda não tenha surtido qualquer efeito contra os sucessivos governos de Pyongyang, poderia levar à insatisfação popular.
Conspirações dentro do exército e do partido no governo, assim como a repentina morte ou mesmo o assassinato de Kim Jong-un, também são levadas em conta para futuras "instabilidades", "mudanças de regime" ou "colapso" do país. Não é descartada a possibilidade de que, após isso, haja uma guerra civil ou uma invasão da Coreia do Norte pela Coreia do Sul e os EUA.
Contudo, esse último acontecimento é o mais improvável, segundo a visão geral dos autores. Mesmo o fortalecimento da sociedade civil que permita o nascimento de organizações contrárias ao governo é visto com dúvidas, analisando a história do país, que tem uma sociedade muito coesa e unida.
Apesar da dificuldade de encontrar uma brecha que lhe permita interferir diretamente no seio do governo e da sociedade norte-coreana, os EUA continuam em busca do controle de todo o território coreano sem que para isso seja necessária uma guerra aberta.
Analisando em retrospecto, as frequentes denúncias feitas por Pyongyang, que são ridicularizadas pela mídia internacional, não são nada fantasiosas. Justamente por isso a Coreia do Norte procura dar especial atenção ao seu sistema de segurança.