Mãos Ocidentais Manchadas de Sangue (também) no Iraque
Em 30 de outubro, um carro-bomba explodiu em um popular mercado de frutas e verduras no bairro xiita de Huriya, a noroeste de Bagdá, deixando dez mortos e 34 feridos. Tratou-se do quinto bombardeio apenas na capital iraquiana naquele dia. O autor de todos eles foi o Estado Islamita (EI), quem já havia executado, em julho deste ano, o mais mortal carro-bomba no Iraque desde a invasão norte-americana em 2003: o saldo foram mais de 300 mortos.
No Afeganistão, em dois meses cumpridos em 31 de outubro, mais de 300 escolas foram destruídas pelo Taliban, e apenas em 4 de novembro 30 civis foram assassinados "por equívoco" pelas forças militares norte-americanas, entre eles mulheres, crianças e bebês.
Quando mencionadas pelos tomadores de decisão e pela mídia predominante ocidental, o que raramente ocorre, tais vítimas são abordadas nada mais que como meros números. Política e linha editorial que, respectivamente, contraria de maneira gritante a abordagem quando se trata de vítimas do lado de cá do mundo, ainda que em número muito menor e diante de todos os crimes contra as leis internacionais por parte dos governos ocidentais no Oriente Médio, há quase dois séculos desde as frustradas tentativas do então Império britânico de colonizar o Afeganistão, na primeira metade do século XIX.
Banalizou-se o derramamento de sangue na região mais rica em petróleo do planeta, e as causas dos "conflitos" ali (i.e., invasões unilaterais e genocídio made in West), especialmente contemporâneos cujas mentiras e pretexto para maior alimentação da indústria bélica emergiram dos escombros das Torres Gêmeas do World Trade Center, ofuscadas pela densa cortina de fumaça que distraiu a atenção global como nenhum outro acontecimento deste século.
Mortos Esquecidos de um Genocídio sem Fim
Desde a Revolução Iraniana de 1979 que derrubou o xá Reza Pahlevi (entreguista pró-Ocidente) e nacionalizou o petróleo, raiz da "Guerra ao Terror" comandada pelos Estados Unidos, a história de "pacificação ocidental" tem se repetido, tragicamente, como farsa. Fracassadas as investidas da CIA na nação persa que, em 1953, havia derrubado o primeiro-ministro Mohammad Mosaddeq instalando seu fantoche Pahlevi no poder, Washington passou todos os anos de 1980 treinando e armando (inclusive com bombas químicas) os aliados iraquianos (entre eles Saddam Hussein) para combater os vizinhos iranianos: criou ferozes divisões sectárias (inexistentes até então) e alimentou disputas territoriais entre ambas as nações.
No final daquela década, em 1988 o saldo da guerra Irã-Iraque inclui estimativas que se aproximam de dois milhões de mortos. Mais sangrento confronto pós-Segunda Guerra Mundial que não deixou vencedor, além de prejuízo de cerca de 1,6 trilhão de dólares aos dois países.
Pouco depois, em menos de um mês a Guerra do Golfo (17 de janeiro de 1991 a 28 fevereiro de 1991) deixou cerca de 1,5 civis kuwaitianos mortos, e no lado iraquiano estima-se em torno de 3.5 mortos, apenas entre civis. Como punição por ter reivindicado soberania sobre terras kuwaitianas, ricas em petróleo, o embargo econômico norte-americano sobre o Iraque ao longo da década de 1990 causou mais de 200 mil mortes, em sua maioria crianças. O detalhe é que à vésperas da invasão de George H. W. Bush (pai) ao Iraque, a Casa Branca havia garantido a Hussein que não interviria pois, a seu ver, tratava-se de assunto interno de ambos os países.
Desde que baby Bush invadiu unilateralmente o Iraque em março de 2003 contrariando não "apenas" a ONU, as mais diversas nações ao redor do planeta e a grande maioria da própria sociedade local, como também as próprias evidências de que não havia bombas de destruição em massa no país e nada que ligasse Saddam Hussein à Al-Qaeda, o número de mortos em um dos berços da cultura mundial já chega a 1,5 milhão, entre civis e combatentes.
Guerra-Fantasia contra Al-Qaeda e Estado Islamita
Se não bastasse, o Iraque que à época de Hussein era Estado laico considerado mais livre do mundo árabe pela ONU, tornou-se caótico, entregue às disputas sectárias. Passou, então, a haver ataques com carro-bomba (inexistentes antes da invasão de 2003), a Al-Qaeda antes limitada ao Afeganistão entrou e espalhou-se pelo país, além do crescimento vertiginoso do EI ali em número de membros, e de ataques sanguinários.
A cidade de Mosul, maior base do EI hoje que abriga numerosas minorias - cristãos, yazidis, shabaks e curdos - têm sido constantes vítimas desta mais nova criação da CIA, acirrada como resposta às agressões dos Estados Unidos cujos tomadores de decisão sabem muito bem a revolta que gera entre nacionais suas invasões arbitrárias. Datado de 16 de agosto de 2002, o Plano P2OG (Counter-Terrorism Proactive Preemptive Operations Group) elaborado pelo então secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, destinou 3,3 bilhões de dólares para promover atentados terroristas em solo iraquiano. O
O objetivo era a "estimulação de reações" terroristas, registrado na parte sob o título de "Operações Proativas Agressivas, Preventivas", através de "ações encobertas, encobrimento e embuste". As qualificações necessárias para o P2OG foram detalhadas pelo então braço direito de Bush filho: "Pessoal altamente especializado com técnica única e perícia em [operações de] inteligência tais como operações de informação, PSYOP [operações psicológicas], redes de ataque, atividades encobertas, operações de embuste".
Em resumo, o Plano consistia em praticar atos de terror no Iraque a im de gerar reação na mesma proporção, "política" nada nova na história do único país que atacou com bombas atômicas na história, exatamente os Estados Unidos
Esta guerra, mais longa da história dos Estados Unidos, é de agressão e, portanto, contrária às leis internacionais. Não respeita regras, é fundamentada na intolerância e na discriminação (seria redundância dizer que se baseia na mentira, como toda guerra), que não se vê no dever de prestar contas e nem se vale de tribunais internacionais para julgar e punir supostos terroristas: invade territórios soberanos e faz sua própria justiça, assassinando sumariamente quando e como bem entende.
O Império de turno vale-se indiscriminadamente da indústria da guerra e da "política" (eufemismo para crimes) coercitivo-expansionista, tendo debaixo de si uma mídia completamente prostrada, de joelhos diante do Estado mais terrorista da história. Dias atrás, o jornal The New York Times, "Pentágono midiático", referiu-se às investidas militares norte-americanas no Iraque como "operações de sucesso".
Mohammed Muhsin, xeque da cidade de Hawija, província de Kirkuk, afirmou em um workshop na cidade de Arbil organizada pelo United States Institute of Peace e pela orhanização iraquiana Sanad for Peacebuilding, apontou três razões para a existência do EI: pobreza, injustiça e marginalização, pontos não apenas jamais combatidos por Washington, como promovidos por este. Hassan Nusaif, político árabe sunita, outro participante do workshop, disse: "Para ser honesto, o derramamento de sangue vai continuar. Esta é a realidade".
Mesmo diante disso tudo, os Estados Unidos insistem na mesma "estratégia" fracassada de todos estes anos de "Guerra ao Terror" iniciada nos anos 80, projetada para ser interminável mesmo antes dos atentados de 11 de setembro de 2001: o uso indiscriminado da força militar que apenas enriquece sua bilionária indústria bélica, e a de seu maior parceiro a nível militar e global, o também genocida Estado de Israel, silenciosamente por trás desta indústria das megamortes sistemáticas.
As causas da violência (injustificável de qualquer lado) não têm sido confrontadas pelo regime norte-americano, nem sido colocadas em discussão pela mídia de desinformação. E nada indica que este quadro se modificará, a fim de aumentar justamente o caos e, assim, sirva como pretexto para Washington perpetuar a permanência na região espalhando ainda mais bases militares, e, ali e onde mais puder, "terceirize" guerras contra seus rivais a nível global além de, é claro, pilhar recursos naturais de nações soberanas, especialmente petróleo.
Edu Montesanti
edumontesanti.skyrock.com