A Bolívia se prepara para pôr em marcha o referendo para a reeleição do presidente Evo Morales. O processo que se desenvolverá no próximo 21 de fevereiro contempla a reforma parcial da Constituição que busca prolongar por um mandato mais o governo do atual presidente, que termina em 2020.
Por Maximiliano Pedranzini*, Resumen Latinoamericano, 9 fevereiro 2016
Esta iniciativa é apoiada pelos movimentos sociais nucleados na Coordenadora Nacional pela Mudança [Conalcam, por suas siglas em espanhol], os quais respaldam ao governo de Evo Morales desde sua criação em 2007. Um referendo que, no entanto, não se propõe uma reeleição indefinida, tal como o expressaram dirigentes do MAS. A busca do "sim" para o governo de Evo Morales leva consigo um sentido que vai mais além de continuar com o processo político iniciado em 2006, cujo auge e consolidação é logrado com a sanção da nova Constituição em 2009 que refunda o país em todos os aspectos, dando nascimento ao Estado Plurinacional de Bolívia. Este ir "mais além" é o umbral cuja dimensão encarna seu papel preponderante na construção da Pátria Grande e na continuidade do processo bolivariano inaugurado pelo Comandante Hugo Chávez.
Este protagonismo, começa a alcançá-lo por vários fatores. Um deles é pela ausência de Chávez após sua morte em 2013 e a posterior crise política que a derrota nas eleições legislativas de 6 de dezembro e 2015 originou. E o outro, que o coloca numa conjuntura magnífica no cenário regional, em sua estabilidade tanto econômica [com um crescimento sustentável de mais de 5% ao ano] como política -apesar de tentativas destituintes por parte da oposição nos últimos anos-, que a tornou mais sólida para tolerar a deterioração que os governos populares sofrem.
Este marco coloca Evo Morales como o líder do processo bolivariano, já que nesta configuração de lideranças a não apresentação de Rafael Correa nas próximas eleições de 2017 no Equador fazem com que o presidente boliviano seja quem ocupe este lugar de relevância para nossa região frente ao que virá nos médio e longo prazo.
A Bolívia, frente ao estado crítico que afeta a Venezuela e a chegada de um governo claramente neoliberal na Argentina, tem a responsabilidade de pôr-se nos ombros o processo bolivariano. Ser o guia político neste projeto de libertação continental que atravessa momentos de pálida incerteza pelo acontece em outras nações irmãs.
A tarefa não é simples e requererá força e liderança regional, que Evo Morales tem de sobra, fruto de sua experiência como trabalhador cocalero e líder sindicalista.
O governo de Evo Morales antagonizou com os setores mais concentrados do poder em seu país, enfrentando vários intentos separatistas por parte das regiões mais ricas do país andino e intentonas golpistas que o puseram em xeque. Foi aqui onde Evo Morales sentiu o respaldo da UNASUL e da CELAC, em situações onde os patriciados secessionistas desafiavam com romper a unidade do país.
A Bolívia, antes da chegada de Evo Morales e Álvaro García Linera, era um dos países com maior desigualdade de todo o cone sul, e esta situação se reverteu consideravelmente numa década, rompendo com os dispositivos de subalternidade que marginalizaram durante séculos as comunidades indígenas que compõem mais de 60% de sua população. A sanção de uma nova Constituição permitiu cristalizar estas políticas de inclusão cujos eixos principais são a redistribuição da riqueza que reduziu a pobreza extrema de maneira significativa, o direito à propriedade da terra e a nacionalização dos recursos energéticos, fazendo -como afirmou o presidente na IV Cúpula da CELAC- com que os serviços básicos sejam um direito humano. Um projeto que está enquadrado no plano quinquenal de desenvolvimento [2016-2020], que busca aprofundar e ampliar as políticas de Estado levadas a cabo nesta última década.
A região ficou naufragando numa orfandade de liderança depois da morte de Chávez e esta ausência concreta deve ser suprida por um mandatário que soube resistir aos embates do neoliberalismo nada mais nada menos que aprofundando o projeto emancipatório em seu próprio território, e esse, sem dúvida, é Evo Morales.
As recentes derrotas eleitorais em Argentina e Venezuela mudaram drasticamente o tabuleiro político regional e internacional. O rumo de nossa história recente está virando de maneira brusca para uma nova restauração conservadora que volta a mirar no Atlântico como nos séculos anteriores, buscando desempoeirar os velhos pactos neocoloniais e atualizá-los com tratados de livre comércio.
O que fica claro neste caminho de recuperação é que o farol que deve guiar o processo bolivariano para não continuar perdendo terreno na luta contra as oligarquias locais e o imperialismo se chama Evo Morales.
A América do Sul, como precursora este processo iniciado em 1999 pelo Comandante Chávez, deve continuar com o trabalho de libertar a região.
Por esta razão, é impotante que se consagre democraticamente a possibilidade de que o presidente Evo Morales possa ser reeleito para continuar com as rédeas de um projeto político que recuperou a dignidade do povo boliviano e a dos povos latino-americanos.
A Bolívia é um orgulho para nós outros, como também o são Venezuela e Equador neste último tempo, que souberam reivindicar o princípio de soberania de nossas nações frente à permanente ingerência do imperialismo norte-americano.
A América Latina tem que sustentar de qualquer jeito este processo emancipatório. E, apesar dos tropeços deste último tempo, ainda guardamos a esperança desta época que nos toca viver, na qual acumulamos uma experiência de quase duas décadas e isso constitui um ponto de partida onde recomeçar.
A dicotomia nestas latitudes continua sendo a mesma: Pátria Grande ou pacto colonial, qualquer que seja sua nomenclatura.
Como no referendo de 2009 em Venezuela, onde o primeiro que felicitou a Chávez foi Fidel Castro, esperemos que esta ocasião tão transcendente volte a se repetir com um chamado do líder histórico da Revolução Cubana. Isso iluminaria o caminho do processo continental.
Um trinfo do "sim" não é uma vitória só para o povo boliviano, é para toda Nuestra América. Afirmando a positiva, se escreverá uma página histórica, tanto para a Bolívia como para o processo bolivariano. Uma página que depende unicamente do povo boliviano.
Como diria Chávez na noite de seu triunfo pelo "sim" que lhe permitiu ser reeleito: "Foi uma grande vitória! Aqui está o povo de Simón Bolívar levantando as bandeiras da dignidade!" Esperemos que estas sejam também as palavras de Evo e as do povo boliviano.
*Ensaista. Membro do Centro de Estudos Históricos, Políticos e Sociais "Felipe Varela", de Argentina.
Tradução de Joaquim Lisboa Neto