Mas mídia-empresa nos EUA erra, se supõe que Putin estaria derrotado
As conversações de paz para a Síria patrocinadas pela ONU, que começaram na 6ª-feira em Genebra, serão boicotadas pelo principal grupo de oposição síria, que insiste que a Rússia pare de bombardeá-los enquanto negociam.
Para avaliar o ridículo dessa 'exigência', é preciso imaginar cenário semelhante, acontecendo nos EUA.
Digamos por exemplo que Ammon Bundy, o líder pirado de uma milícia armada que tomou a sede de um santuário de vida selvagem, Malheur Wildlife Refuge, nos arredores de Burns, Oregon administrado pelo governo dos EUA, 'exigisse' que o FBI e demais agentes federais sumissem de lá, enquanto a ONU promovesse negociações entre os doidos e representantes do governo Obama, com vistas a organizar um governo de transição naquelas matas do Oregon, o qual derrubaria Obama da presidência em 18 meses, e reescreveria a Constituição dos EUA de modo que ela passasse a manifestar as convicções políticas de extrema direita política de Bundy e de seus seguidores amalucados no meio no mato.
Alguém aí consideraria razoável essa proposta?
Pois esse é o contexto em que se realizam as atuais "conversações de paz". Não surpreende que Moscou não leve a sério essa farsa: é piada, mesmo.
Em que país do planeta se permite que milícias armadas ocupem cidades, matem civis, destruam infraestrutura crítica, criem o mais absoluto inferno e ameacem derrubar o governo nacional eleito?
Nenhum. Pois mesmo assim a equipe de Obama supõe que seria modo de agir perfeitamente aceitável - e, até, elogiável e ajudável -, para cidadãos e não cidadãos (a maioria dos 'rebeldes' nem são sírios, mas mercenários estrangeiros ou jihadistas), desde que seus objetivos políticos coincidam com os de Washington. E, sim, coincidem.
Desde o início, o único objetivo de Washington foi derrubar o presidente Bashar al-Assad da Síria, para que, sem ele, os campos de petróleo e corredores de oleodutos pudessem sem entregues sem contestação às gigantes petroleiras ocidentais, para serem protegidas pelos soldados norte-americanos nas novas bases construídas naquela área. Esse sempre foi o plano básico de jogo dos EUA desde o primeiro dia, e é por isso que Obama & Co. tanto precisam deter a ofensiva comandada pelos russos. E, para isso, vale tudo.
Vale, até, inventar 'negociações' teatralizadas e sem qualquer significado, que não têm outro objetivo que não seja implementar um cessar-fogo que proteja os terroristas apoiados pelos EUA e lhes dê folga para se reagrupar e só voltar a lutar adiante, quando estiverem recompostos.
O presidente Vladimir Putin da Rússia vê, é claro, a farsa, mas, farsa e tudo, mandou diplomatas para Genebra, provavelmente para não ter de abrir uma frente de 'dissidência' num projeto que está sendo apresentado como da ONU.
Sim, mas... Quem supõe que os russos cedam algum tipo de 'cessar-fogo', de modo que os 'rebeldes' de Obama & Co. se rearmem para voltar à guerra? Quem acreditar nisso é tolo.
Fato é que os norte-americanos [e de brasileiros então, nem se fala! (NTs)] não sabem do que realmente se passa em campo, porque a mídia-empresa ativa dentro dos EUA está muda há meses. E há meses a coalizão organizada e comandada pelos russos (Exército Árabe Sírio, Forças Quds do Irã e o Hezbollah) avança em campo, lentamente, mas sem retrocessos; já passou pelas defesas norte-americanas-turcas-CIA-mercenárias-jihadistas e avança em todos os fronts, e todos os dias mais e mais posições inimigas caem.
Cidades chaves na província de Latakia e também ao longo da fronteira turca que foram usadas como fortalezas jihadistas estão caindo, uma depois da outra, sob o incansável bombardeio russo, ao mesmo tempo em que, por terra, territórios vão sendo libertados pelo exército do Estado sírio. Aleppo, a maior cidade do norte da Síria, foi cercada por forças legalistas, que cortaram as vias de suprimento até a Turquia, deixando grupos de combatentes salafistas como Ahrar al Sham, Jabhat al Nusra, Jaish al Islam, ISIS e os demais grupos associados à al-Qaeda forçados a se renderem ou a passar fome enquanto esperam o desesperado encontro final.
O momentum mudou a favor das forças do Estado sírio, que agora estão, claramente, no controle.
A mídia-empresa dentro dos EUA [e no Brasil, então, nem se fala! (NTs)] só faz chamar de "atoleiro sírio" o que é retumbante vitória da coalizão comandada pelos russos, que vai gradualmente recompondo a segurança em toda a Síria, ao mesmo tempo em que põe para correr os terroristas invasores 'selecionados' por Obama & Co. Eis o que diz aAgência Reuters:
"Três meses passados desde o início de sua ação militar na Síria, o presidente Vladimir Putin já alcançou o objetivo central de estabilizar o governo Obama e, a custos relativamente baixos, pode manter suas operações militares naquela região, no nível em que estão hoje, realmente, durante anos - dizem oficiais e analistas militares norte-americanos.
Essa avaliação foi tornada pública, apesar de o presidente Barack Obama e seus mais altos auxiliares não se cansarem de repetir que a ação de Putin em apoio ao 'ditador' sírio teria sido mal planejada, que não dará conta da luta e, "certamente" será derrotada (...).
Desde que a campanha começou, em 30 de setembro, a Rússia sofreu número mínimo de baixas e, apesar do que 'declaram' os especialistas norte-americanos, está pagando sem dificuldades os custos da própria movimentação militar - que analistas estimam em $1-2 bilhões/ano. A guerra russa é paga pelo orçamento anual regular do Estado russo, de cerca de $54 bilhões, como disse um funcionário da inteligência dos EUA (...).
"A tentativa de Rússia e Irã para defender Assad e tentar pacificar a população vai metê-los num atoleiro e não vai funcionar" - dizia Obama dia 2/10/2015. Dia 1/12/2015, atreveu-se mais: a Rússia estaria "atolando cada vez mais num conflito civil paralisante."
Altos funcionários do governo negaram que houvesse qualquer contradição entre o que Obama 'declara' e avaliações privadas, segundo as quais até o momento a campanha russa continuava bastante efetiva.
"Creio que o presidente quis dizer que (...) não vai dar certo no longo prazo" - explicou um assessor. Os russos "estão presos numa guerra civil, de modo que será extremamente difícil saírem daquilo" (...)
Vasily Kashin, analista que trabalha em Moscou, explicou que a guerra não está superestressando as finanças russas.
"Todos os dados que há mostram que o nível atual de esforço militar é completamente insignificante para a economia russa e o orçamento russo" - disse Kashin, do Center for Analyses of Strategies and Technologies. - "O esforço pode prosseguir exatamente no mesmo nível de intensidade, ano após ano" (U.S. sees bearable costs, key goals met for Rússia in Síria so far, Reuters).
Os norte-americanos estão tão condicionados a crer que qualquer intervenção militar acaba fatalmente em "atoleiro", que se surpreendem quando uma ação militar é bem-sucedida.
É compreensível, uma vez que os que antes se reconheciam como "os melhores militares do planeta" já não conseguem derrotar nem um bando desorganizado de pastores esfarrapados e mal armados, nem lutando por mais de 15 anos, como aconteceu no Afeganistão.
Não surpreende que os norte-americanos sem informação ou desinformados contem com o fracasso dos russos.
A questão é, porém, que Putin não tem nenhuma intenção de se deixar "atolar" na Síria por uma ou duas décadas. Seu plano é derrotar o inimigo e sair. Relatos recentes vindos das linhas de frente sugerem que isso, precisamente é o que os russos estão fazendo. Adiante, de um postado do blog Sic Semper Tyrannis:
"A queda de Salma"
As coisas começaram a mover-se depressa semana passada, quando o Exército Árabe Sírio, a Força Nacional de Defesa e milícias locais avançaram sobre Salma, a fortaleza dos rebeldes que foi chave para as posições defensivas no sul da Rodovia M4 que liga Latakia a Idlib. Depois de semanas de preparativos e de amaciar as defesas, R+6 finalmente entrou, e já não havia muito que os rebeldes pudessem fazer para deter ou reverter a tendência (...).
(...) Tão logo o ponto de penetração e alcançado, porém, o lado que avança usualmente leva a melhor, o que resulta em a posição do oponente ruir sob a pressão. Foi o que aconteceu com Salma, que era um resort de montanha no nordeste de Latakia (...). Quando R+6 fez o assalto final, Salma já não tinha como manter a posição. A perda de Salma significou que toda a linha defensiva ao sul da Rodovia M4 foi comprometida; e ambos, os avanços do Exército Árabe Sírio e a retirada "tática" dos rebeldes fez rápida correção na linha de frente na área (...).
Os avanços obtidos pelo Exército Árabe Sírio (...) mais uma vez provaram-se decisivos contra linha de frente dos rebeldes que já havia sido desestabilizada pela perda de Salma e pela perspectiva de ser separada de suas Linhas de Comunicação [orig. Lines of Communication, LOCs] com Jisr al-Shughur" (Rebel Defences Crumbling In Latakia Province, Sic Semper Tyrannis).
Estão entendendo? Os grupos jihadistas estão apanhando sem parar, confrontados com exército superior a eles, que está recapturando cidades criticamente importantes e território estratégico ao longo da fronteira turca e nas partes sul e leste do país. Como resultado, Assad não será derrubado, nem o país será convertido em 'principado jihadista salafista' governando por islamistas doidos, que governam pelo terror.
Não implica dizer que não haja vários obstáculos potenciais ainda pela frente. Há. De fato, há uma situação em andamento nesse momento que pode vir a explodir em conflito regional envolvendo Turquia, OTAN, EUA e Rússia.
A Rússia planeja usar seus aliados curdos no YPG para ocupar uma faixa de terra ao longo do lado sírio da fronteira com a Turquia, para restabelecer a soberania territorial síria e deter o fluxo de terroristas da Turquia para a Síria. O presidente Erdogan da Turquia ameaçou que, se o YPG insistir nesse curso, a Turquia invadirá; nesse caso, Putin defenderá os curdos.
Não há como prever como acabará tudo isso, mas não há dúvidas de que as próximas semanas serão extremamente tensas, com muito agitar de sabres entre todos os principais e disputa por posições, sempre muito próximas de conflagração generalizada. Prevalecerão as cabeças mais frias?
Isso, exatamente, não posso dizer. Mas posso dizer que Washington já recuou da campanha de "Assad tem de sair" e já passou para o Plano B, que implica ocupar território e construir bases no sudeste da Síria, onde os EUA planejam permanecer pelo mais longo tempo que possam. Vejam lá, na página South Front:
"Do Front Sul: Análises e inteligência previram há um mês que os aliados da OTAN trabalham em ritmo de urgência tentando implantar um novo plano para assegurar o controle de, pelo menos, o corredor norte de petróleo que vem do Iraque, e tentar tirar vantagem dessa oportunidade para envolver a Rússia numa guerra longa e cara. Esse plano emergencial inclui ocupação de infraestrutura crucial, inclusive campos de petróleo, pelo contingente da OTAN e estabelecer forças de um antigoverno - vale dizer, anti-Rússia e anti-Irã - em partes divididas da Síria.
Implementar esse plano pode facilmente levar a uma guerra mundial iniciada pela escalada militar em torno da crise síria. As apostas no impasse geopolítico global foram novamente aumentadas" (Escalation in Síria, South Front).
Implica dizer que, mesmo que Washington tenha sido derrotada e seu plano para derrubar Assad tenha sido neutralizado (pelo menos temporariamente), Washington já está aprofundando seu envolvimento no processo de criar um Sunistão.
Esse Sunistão seria um novo estado a ser inventado, formado do leste da Síria unido ao oeste do Iraque, controlado por clientes dos EUA. Assim, as petroleiras ocidentais gigantes conseguirão conectar-se à rede oleogasodutos, do Qatar até a Turquia, para substituírem a Rússia como maior fornecedor de gás natural para a União Europeia.
Tudo isso ainda é parte da estratégia imperial de "pivotear-se" para a Ásia, controlando recursos vitais e cuidando que não deixem de ser denominados em EUA-dólares. É plano ambicioso para governar o mundo.
Esse plano, precisamente, é que a Rússia está agora desafiando abertamente, como potência emergente que pode fazer descarrilar a mortífera máquina de guerra dos EUA e pôr fim à maligna ordem mundial unipolar.*****
29/1/2016, Mike Whitney, Counterpunch