NOVA IORQUE/ESTADOS UNIDOS - É o mais perto da meia-noite que o mundo esteve desde Guerra Fria, mas perigo agora são as mudanças climáticas. Integrantes do Boletim dos Cientistas Atômicos deram entrevista coletiva de imprensa sobre ajuste do relógio do fim do mundo, chamado de "O Relógio do Apocalipse".
Por ANTONIO CARLOS LACERDA
O fim do mundo está próximo! A depender do alerta emitido pelo Boletim de Cientistas Atômicos (BAS, na sigla em inglês) ao adiantar em dois minutos o "Relógio do Apocalipse", que agora marca três para meia-noite, vivemos uma situação tão perigosa quanto a da Guerra Fria.
A última vez em que a situação esteve tão crítica foi em 1984, num momento em que o recrudescimento das hostilidades entre os EUA e a então União Soviética ameaçavam a humanidade com uma guerra nuclear. Desta vez, a principal ameaça vem do clima.
"Isto é sobre o fim da civilização como nós a conhecemos", disse Kennette Benedict, diretora-executiva do BAS. "A probabilidade de uma catástrofe global é muito alta, e as ações necessárias para reduzir os riscos são urgentes. As condições são tão ameaçadoras que estamos adiantando o relógio em dois minutos. Agora faltam três para a meia-noite".
A emissão de dióxido de carbono e outros gases está transformando o clima do planeta de forma perigosa, alertou Kennette, o que deixa milhões de pessoas vulneráveis ao aumento do nível do mar e a tragédias climáticas. Em comunicado, o BAS faz duras críticas aos líderes globais, que "falharam em agir na velocidade ou escala requerida para proteger os cidadãos de uma potencial catástrofe".
O consultor e ambientalista Fabio Feldmann considera o alerta "bastante razoável" e destaca a falta de mobilização de governos e sociedades como o principal entrave.
"Se há um ano eu falasse sobre os riscos da crise hídrica em São Paulo, seria tachado de apocalíptico, mas veja a situação agora", disse Feldmann. "A realidade está superando as previsões científicas, mas não está colocando o tema na agenda. Esse é o drama".
Além da questão climática, o BAS alerta sobre a modernização dos arsenais nucleares, principalmente nos EUA e na Rússia, quando o movimento ideal seria o de redução no número de ogivas. Estimativas mostram a existência de 16.300 armas atômicas no mundo, sendo que apenas cem seriam suficientes para causar danos de longo prazo na atmosfera do planeta.
"O processo de desarmamento chegou a um impasse, com os EUA e a Rússia aplicando programas de modernização das ogivas - minando os tratados de armas nucleares - e outros detentores se unindo nesta loucura cara e perigosa", informou o BAS.
A organização pede que lideranças globais assumam o compromisso de limitar o aquecimento global a dois graus Celsius acima dos níveis pré-industriais e de reduzir os gastos com armamentos nucleares.
"Não estamos dizendo que é muito tarde, mas a janela para ações está se fechando rapidamente", alertou Kennette. "O mundo precisa acordar da atual letargia. Acreditamos que adiantar o relógio pode inspirar mudanças que ajudem nesse processo".
O BAS foi fundado em 1945 por cientistas da Universidade de Chicago (EUA) que participaram no desenvolvimento da primeira arma atômica, dentro do Projeto Manhattan. Dois anos depois, eles decidiram criar a iniciativa do relógio, para "prever" quão perto a humanidade estaria da aniquilação.
Na época, a principal preocupação era com o holocausto nuclear, mas, a partir de 2007, a questão climática passou a ser considerada pelo grupo. As decisões de ajustar ou não o relógio são tomadas com base em consultas a especialistas, incluindo 18 vencedores do Prêmio Nobel.
Desde a criação, o "Relógio do Apocalipse" foi ajustado apenas 22 vezes. O momento mais crítico aconteceu em 1953, com o horário marcando 23h58m, por causa dos testes soviéticos e americanos com a bomba de hidrogênio. A assinatura do Tratado de Redução de Armas Estratégicas, em 1991, fez o relógio marcar 17 minutos para a meia-noite, a situação mais confortável até hoje.
O último ajuste do relógio aconteceu em 2012, para 23h55m, com o BAS alertando sobre os riscos do uso de armas nucleares nos conflitos do Oriente Médio e o aumento na incidência de tragédias naturais.
ANTONIO CARLOS LACERDA é Correspondente Internacional do PRAVDA.RU