Obama foi recebido pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu na chegada a Israel ( Foto The New York Times)
A primeira visita oficial do presidente dos Estados Unidos Barack Obama a Israel, iniciada nesta quarta-feira (20), foi precedida de várias análises sobre a postura dos EUA com relação à guerra de Israel contra a Palestina e à sua postura beligerante com relação aos seus vizinhos. Mesmo assim, em seu primeiro discurso após a chegada, Obama reafirmou apenas o apoio incondicional a Israel.
Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho
Os Estados Unidos vêm tomando uma postura histórica de herdeiros tardios do Reino Unido, ao apoiar incondicionalmente um Estado de Israel governado por sionistas. Depois de contar principalmente com o apoio britânico colonialista para se estabelecer ilegal, imperial e criminosamente na Palestina, agora Israel tem os sucessivos presidentes estadunidenses como garantidores de continuidade impune da sua política agressiva.
O governo israelense acaba de ser composto, já que a reeleição de Benjamin Netanyahucomo primeiro-ministro em janeiro deu ao seu partido Likud (em coalizão antecipada com o partido Yisrael Beitenu) apenas 20 dos 120 assentos no parlamento (Knesset). Assim, Netanyahu teve grande dificuldade para angariar o apoio de outros partidos, o que conseguiu apenas no passado final de semana, após ter pedido a prorrogação do prazo que tinha para isso.
Obama desceu do avião presidencial em Israel nesta tarde para uma visita em que o objetivo principal, segundo oficiais do governo, é "ouvir" e "fortalecer laços" com os israelenses.
Como anúncio direto desta intenção, por tanto, uma das primeiras declarações do presidente foi, depois de uma série de referências históricas e religiosas demagógicas, a "identidade" entre os EUA e Israel:
Juntamo-nos a Israel porque dividimos uma história comum, [somos] patriotas determinados a 'ser um povo livre em nossa terra', pioneiros que forjaram uma nação, heróis que se sacrificaram para preservar nossa liberdade, e imigrantes de todos os cantos do mundo que renovaram constantemente nossas sociedades diversas (...). Estamos juntos porque somos democracias.
De certa forma, Obama pincelou um tanto por cima alguns pontos até reais sobre os judeus que fugiam de um antissemitismo ferrenho no século 19 e início do século 20 e que, por isso, foram habilmente manipulados para aceitar o sionismo, mesmo que em detrimento da expropriação, expulsão e violação dos direitos de um povo que não conheciam, ou que não queriam conhecer: o povo palestino.
Porém, além de ser inaceitável e ultrajante a tentativa de romantizar o que foi uma colonização e um imperialismo criminoso e extremamente opressivo (a construção gradual e o estabelecimento oficial do Estado de Israel), Obama ainda finaliza com um detalhe profundamente incorreto: a afirmação de que Israel é uma democracia.
O próprio jornalista israelense Gideon Levy disse, por exemplo, que Israel é um dos países mais racistas do mundo, "com paredes que separam territórios, uma política de apartheid; (Israel) trai os valores fundamentais do movimento de direitos civis que tornaram possível o milagre Obama", em alusão ao movimento civil de 2008 dos que apoiaram a eleição do primeiro presidente negro da história dos EUA.
"Laços inquebrantáveis" entre as duas nações
Obama desceu também dizendo algo já óbvio: "deixe-me dizer da forma mais clara que posso: Os Estados Unidos da América está ao lado de Israel porque é parte do nosso interesse nacional securitário fundamental estar com Israel."
Já é histórica e basilar para um círculo vicioso a ligação dos EUA com os sionistas, tanto interna (através do grupo de pressão judeu diretamente ligado a todos os âmbitos da política estadunidense, o Aipac) quanto externamente. Israel também serve aos EUA como uma base militar, uma frente avançada para a influência e a pressão que querem exercer no Oriente Médio. É bastante possível, assim, que a afirmação óbvia do presidente tenha sido ainda uma exigência do próprio Aipac, com quem Obama reuniu-se dias antes da sua visita.
Mas Obama continua neste mesmo tom, e disse que vê a visita "como uma oportunidade de reafirmar os laços inquebrantáveis entre as nossas nações, de declarar novamente o compromisso persistente da América com a segurança de Israel, e para falar diretamente com o povo de Israel e com seus vizinhos."
Também não é a primeira vez que Obama reafirma outra postura histórica dos EUA de colocar, tanto em discurso quanto na prática, a "segurança" de Israel acima de tudo, principalmente acima dos direitos repetidamente reconhecidos pela ONU à autodeterminação do povo palestino. Pior ainda, mesmo que a suposta "segurança" israelense, de acordo com as políticas nacionais, pressuponha necessariamente a violação diária, constante e repetida dos direitos humanos mais básicos de todo o povo palestino.
Os assentamentos israelenses em terras palestinas; as prisões arbitrárias já institucionalizadas legalmente através do mecanismo de uma "detenção administrativa", que permite a prisão de palestinos "suspeitos" de ações violentas (ou seja, que incluem grande parte das práticas de resistência desse povo) por períodos renováveis de seis meses sem julgamento; a destruição sistemática de casas e cultivos; a construção de estradas e muros de segregação; entre outras práticas diárias de humilhação têm recebido a conivência e a cumplicidade criminosa das maiores potências mundiais.
E é assim mesmo que Obama disse orgulhar-se de estar em Israel, do fato de que os EUA foram os primeiros a reconhecer este país, em 1948, mesmo que a violência em que este evento se desenvolveu já fosse conhecida então, embora sistematicamente silenciada (a estratégia de negar a existência de um povo especificamente palestino, por exemplo, foi bem estabelecida e generalizada até muito recente).
A visita de Obama deverá servir para abordar temas como o conflito armado interno na Síria, o programa nuclear iraniano, e de forma menos eficiente e mais retórica, segundo analistas políticos, as negociações de paz com os palestinos. Entretanto, está prevista a reunião com representantes da Palestina, de Israel e da vizinha Jordânia. Um oficial da Autoridade Palestina já havia dito, em fevereiro, que "se tem alguém que pode mudar a postura de Israel, é Obama".
Porém, a sensação generalizada de descrédito quanto ao compromisso de Obama com uma solução ao conflito tem dominado tanto a mídia regional quanto os próprios palestinos. As negociações para uma solução de "dois Estados", por exemplo, estão em estagnadas ao menos desde 2010. Mesmo assim, ela sempre foi retórica e vazia, uma vez que Israel já existe oficialmente e continua impedindo a concretização de um Estado da Palestina com sucessivas ocupações territoriais, por exemplo.
Ainda, outra justificativa para essa sensação de descrédito foi a conclusão do discurso, em que Obama disse, de forma um tanto piegas, que "a Estrela de David [símbolo religioso e nacional israelense] e nossas estrelas e faixas esvoaçam juntas neste dia. É por isso que estou confiante em declarar que a nossa aliança é eterna, é para sempre: lanetzach [eterna]".