Bjarne Melkevik, professor na tricentenária Universidade Laval, em Quebec (Canadá), na sua crítica à posmodernidade jurídica (“Postmodernisme, droit et adieu à la raison”, Colóquio Interdisciplinar da Sociedade Canadense de Filosofia Política e Direito, maio de 1994), afirma que ela nos conduz a um niilismo, onde não se distingue a legitimidade da ilegitimidade, a justiça da injustiça, a legalidade da ilegalidade, tornando inútil, senão vã, toda prática e sentido do direito.
E adiciona que a sociedade, assim instrumentalizada, acolhe indiferentemente tudo que se lhe apresenta, seja em normas ou em comportamentos, com o mesmo descaso e sem discernimento.
Tomaremos a Petrobrás, em breves traços da sua história, para exemplificar a acerba crítica do professor Melkevik.
Comecemos por sua criação, um movimento popular, envolvendo civis e militares, operários e profissionais liberais, em debate nas ruas, em clubes, associações, contra e a favor, que culminou, em 3 de outubro de 1953, com a Lei 2004, aprovada pelo Congresso Nacional.
Esta Lei dispunha, artigo 9º: “A Sociedade terá inicialmente o capital de Cr$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de cruzeiros), dividido em 20.000.000 (vinte milhões) de ações ordinárias, nominativas, do valor de Cr$ 200,00 (duzentos cruzeiros) cada uma” e este capital seria elevado até Cr$ 10.000.000.000,00 (dez bilhões de cruzeiros), com a transferência de recursos auferidos pela União, Estados e Municípios e, na forma de ações preferenciais, sem direito a voto, pelos proprietários de veículos automóveis, terrestres, aquáticos e aéreos, em contribuições anuais, até o exercício de 1957, com as quantias discriminadas na tabela anexa à Lei, recebendo, respeitado o disposto no art. l8, certificados que serão substituídos por ações preferenciais ou obrigações da sociedade, os quais conterão declaração expressa desse direito, assegurada a responsabilidade solidária da União, em qualquer hipótese, pelo valor nominal de tais títulos (Art. 15º).
Sem qualquer mobilização, que não seja aquela das finanças apátridas e das empresas estrangeiras, desejosas de espoliar os recursos naturais brasileiros, nem debate com civis, militares, petroleiros profissionais e operários, nem discussões em clubes, associações e nas ruas, o Congresso aprovou a Lei nº 9478, em 6/8/1997, que estabeleceu:
“Art. 21. Todos os direitos de exploração e produção de petróleo e gás natural em território nacional, nele compreendidos a parte terrestre, o mar territorial, a plataforma continental e a zona econômica exclusiva, pertencem à União, cabendo sua administração à Agência Nacional do Petróleo - ANP.
Art. 22. O acervo técnico constituído pelos dados e informações sobre as bacias sedimentares brasileiras é também considerado parte integrante dos recursos petrolíferos nacionais, cabendo à ANP sua coleta, manutenção e administração.
§ 1º A Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRÁS transferirá para a ANP as informações e dados de que dispuser sobre as bacias sedimentares brasileiras, assim como sobre as atividades de pesquisa, exploração e produção de petróleo ou gás natural, desenvolvidas em função da exclusividade do exercício do monopólio até a publicação desta Lei”.
Retira da empresa que, em 44 anos de atividades, deu ao Brasil a autossuficiência na produção de derivados do petróleo, atingiu a autossuficiência na produção de óleo cru e dispunha de tecnologia de ponta para todas as atividades petroleiras, a condução dos negócios do petróleo no País, entregando-a a autarquia de preenchimento de cargos políticos e sem concurso. A Petrobrás, depois da transferência para seus quadros dos profissionais do Conselho Nacional do Petróleo, passou a realizar processos seletivos e ministrar cursos para todos seus empregados.
Materializam-se as piores consequências, previstas pelo professor Melkevik, para o estado pós-moderno ou neoliberal: a ilegitimidade e a indiferença, em meio a mais profunda corrupção. Aqui com a transferência do poder e da capacidade conquistada e construída pelo povo brasileiro para agentes das finanças apátridas, unicamente voltados para obtenção do maior e mais rápido ganho e transferi-lo para os paraísos fiscais, onde estão seus verdadeiros donos.
Esta situação chega ao Brasil em 1990, com a eleição, por falsa campanha da imprensa verdadeiramente monopolista - o Sistema Globo, do “caçador de marajás”, aquele que verdadeiramente sempre foi um nababo na política brasileira.
Acaso a corrupção era inédita nos governos brasileiros? Claro que não. Ela começa com a colônia, prossegue com o império e com a república. Tal como ocorreu na Inglaterra, desde a chegada de Guilherme, o Conquistador, nos Estados Unidos da América (EUA), com as colônias independentes das quais 13 se unirão para o processo de independência da Inglaterra, na França de Carlos Martel, na Itália do Império Romano e assim por toda civilizada e ambiciosa Europa, e o Oriente dos paxás aos mandarins, houve e há corrupção.
A diferença no mundo liberal, pós-moderno, está na institucionalidade, o que, até então, era uma condição de caráter, que Confúcio, em “Os Analectos”, denominou “te”, a virtude que existe em cada um, diferente de “tao”, o caminho, o conhecimento, pelo qual se chega à verdade.
A doutrina do Estado Mínimo é compatível com a corrupção institucional, pois a este Estado faltarão instituições controladoras, auditoras, fiscalizadoras, que empregarão pessoas selecionadas em processos públicos, que estarão constantemente se aperfeiçoando para impedir aqueles que não se formaram com “te”, de agirem contra a sociedade.
E foi assim que a Petrobrás conseguiu, em 37 anos, ser um exemplo: seguiu seu “tao” com “te”. E provocou a ambição, a inveja, o desejo dos que não conseguiram idêntico sucesso.
Em plena era neoliberal, a Petrobrás consegue sucesso extraordinário, tanto na quantidade de petróleo encontrado quanto na complexidade tecnológica exigida para descoberta e para produção: atravessar a camada de sal de dois mil metros, a outros tantos metros de lâmina d’água, com perspectiva de reservatórios de petróleo a 8.000 metros da superfície do mar. E estes reservatórios, de acordo com os mais experientes exploracionistas, podem conter no mínimo 100 bilhões de barris de petróleo.
Esta descoberta, que se estende de Santa Catarina até o Ceará, aliada a da Bacia do Orinoco, na Venezuela, e com as expectativas do offshore da Guiana e do Suriname, trarão para a América do Sul o que hoje representa o Oriente Médio para o mundo da energia fóssil. E, ainda mais, a qualidade do petróleo do pré-sal é semelhante ao Árabe Leve saudita, acima dos 31º API, o mais desejado óleo cru.
Mas os governos brasileiros não procuraram reverter o desmonte da Petrobrás e a reestatização da energia fóssil nacional. Criaram outra empresa a Pré-Sal Petróleo S.A, pela Lei 12.304/2010, uma boquinha para usufruir dessa riqueza que não pode ser recomposta, reconstituída.
E os EUA, com seus instrumentos institucionais e não formais, agem no Brasil para transferir o controle desta imensa riqueza e capacidade para os capitais apátridas, que hoje representam. Surge a fraude da Operação Lava-Jato, uma versão não bélica da Operação Tempestade no Deserto que arruinou os países árabes tanto econômica quanto institucionalmente. A Lava-Jato agiu para o fim da engenharia brasileira, para golpe de estado e difundir as mais sórdidas mentiras sobre a Petrobrás, inclusive que estava falida, quebrada, mais uma vez com uso do Sistema Globo, monopólio midiático no Brasil.
Podemos afirmar convictos que neste século XXI não há esquerda nem direita, há globalista e nacionalistas, há rentistas e trabalhistas. Estas são as verdadeiras opções, o resto é plim, plim (apud Paulo Henrique Amorim).
Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.