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Senado decide não votar MP que altera Código Florestal

Senado decide não votar MP que altera Código Florestal

Senado decide não votar MP que altera Código Florestal

MP 867 precisa ser aprovada até a próxima segunda (3/6) ou perderá validade, mas chance de ser votada até lá é mínima. Governo promete enviar nova proposta ao Congresso

Reportagem atualizada às 10:30, de 30/5/2019.

O Senado resolveu jogar uma pá de cal na ofensiva ruralista para aprovar a Medida Provisória (MP) 867/2018, que altera o novo Código Florestal (Lei 12.651/2012).

Após dois dias de polêmicas e uma guerra de manobras regimentais promovida pela oposição para tentar impedir a votação do relatório sobre a medida, o plenário da Câmara aprovou-o, no início da noite desta quarta (29), com poucas alterações. O texto principal recebeu 243 votos favoráveis e 19 contrários - como a oposição fez obstrução, seus votos não são contabilizados.

Depois disso, a MP precisaria passar pelo Senado e a sanção presidencial para ser convertida em lei. Ainda antes do fim da votação na Câmara, porém, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), anunciou que, por um acordo de líderes partidários, a Casa resolveu não votar a MP nesta quinta (30). Com isso, é grande a chance dela caducar, já que seu prazo de validade expira na próxima segunda (3/6). Raramente, há sessões deliberativas às sextas e segundas no Congresso.

A redação original da medida apenas ampliava, até dezembro deste ano, o prazo de adesão dos produtores rurais aos Programas de Regularização Ambiental (PRAs). O relatório do deputado ruralista Sérgio Souza (MDB-PR), no entanto, incorporou 30 emendas sem relação direta com o assunto, os chamados "contrabandos legislativos" ou "jabutis", prática vedada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Entre outros pontos, o parecer de Souza extingue qualquer limite de tempo para o ingresso nos PRAs e no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Também anistia desmatamentos ilegais na Reserva Legal (RL) das propriedades rurais, no Cerrado, até 1989, e no Pampa, Caatinga e Pantanal, até o ano 2000 (saiba mais no box ao final da reportagem e clicando aqui).

A edição da Lei 12.651 é considerada um marco no enfraquecimento da legislação ambiental e um dos fatores responsáveis pela retomada do desmatamento no país. Para pesquisadores e ambientalistas, um novo perdão amplo para crimes ambientais tende a aumentar ainda mais o ritmo de destruição da vegetação nativa. Portanto, a perda de validade da MP 867 seria uma vitória importante do meio ambiente.

Ruralistas querem reverter decisão

O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Alceu Moreira (MDB-RS), foi ao plenário do Senado logo após o anúncio de Alcolumbre. Depois de não conseguir convencê-lo a mudar de ideia, saiu afirmando que a bancada ruralista trabalharia para mudar a decisão. "Nós ainda temos esta noite para conversar. As votações vão acontecer amanhã. Certamente, vamos tentar reverter esse fato", disse. Ele afirmou que a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, participaria do esforço.

A reportagem do ISA encontrou a ministra deixando a Câmara, após participar de um evento, já tarde da noite. Ela não quis gravar entrevista e informou que precisaria analisar a MP com mais calma para manifestar-se sobre ela. Rapidamente, defendeu que o relatório de Souza traz ajustes necessários à legislação, mas reconheceu que tem problemas.

A notícia ruim para os ambientalistas é que, confirmada a perda de validade da MP 867, a discussão do Código Florestal pode ser retomada e mesmo ampliada. O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), confirmou que o Planalto comprometeu-se a enviar ao Congresso uma nova MP ou um projeto de lei, em regime de urgência, com o texto aprovado pela Câmara. A ideia é que a proposta seja aprovada até o início do recesso legislativo, em meados de julho.

Descontentamento com prazos no Senado

De acordo com Alcolumbre, a decisão de não votar a MP 867 foi tomada em virtude da falta de consenso sobre seu conteúdo e de tempo para apreciar uma matéria tão polêmica. "É esse descontentamento em relação aos prazos", apontou. Ele negocia a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que definirá um período de até 30 dias para o Senado aprovar MPs após apreciação pela Câmara.

O acordo fechado pelos senadores é para que sejam votadas, nesta quinta, as MPs 871/2019 e 872/2019, que também vencem no dia 3 e tratam, respectivamente, de mecanismos para coibir fraudes previdenciárias e gratificações para servidores da Advocacia-Geral da União (AGU).

Um dos responsáveis pelo entendimento, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) relatou que a questão dos "contrabandos legislativos" também foi considerada nas negociações que praticamente selaram o destino da MP 867. "Poucas medidas provisórias tiveram tantos 'jabutis" quanto essa. Eles modificam o Código Florestal na essência", concluiu.

Além da irritação de parte dos senadores com a Câmara por deixar muitas MPs para ser apreciadas em cima da hora, contribuiu para decisão o clima beligerante entre Congresso e Planalto, acirrado com a votação a toque de caixa, na véspera, da MP 870, da reforma ministerial (saiba mais). Por isso, a resolução de não votar a MP 867 também pode ser considerada um gesto de afirmação da autonomia do Senado em meio aos desgastes com o governo.

Embates na Câmara

Ao longo de todo o dia de ontem, oposição e ruralistas seguiram digladiando-se em torno da MP no plenário da Câmara. Lançando mão de expedientes regimentais, os oposicionistas conseguiram ganhar tempo. Enquanto isso, aumentavam as pressões nas redes sociais para que os parlamentares rejeitassem o parecer de Souza e para que o próprio presidente da casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), interviesse na discussão em favor dos ambientalistas. Já tarde da noite, ele resolveu suspender os debates e convocar nova sessão para o dia seguinte, aumentando o risco da MP caducar.

Nesta quarta, foi a vez da bancada ruralista pressionar pela votação da MP, que começou no início da tarde. A maioria dos parlamentares do grupo continuou tentando negar a existência dos "contrabandos legislativos" no relatório. "Não há um único "jabuti" [no parecer]. Todas as alterações acatadas dizem respeito ao Código Florestal", repetiu o relator Sérgio Souza. O Ministério Público Federal (MPF) e mesmo a principal organização do agronegócio, a Confederação da Agricultura e da Pecuária do Brasil (CNA), já admitiram o problema e manifestaram-se contra o parecer.

"Quando se prorroga o prazo para o PRA é pra que não seja prejudicado o produtor rural. Não foi dado o prazo adequado para ele participar do programa. Não foi dado prazo e as condições pelo Estado para que ele fizesse seu CAR", continuou Souza.

O presidente da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Nilto Tatto (PT-SP), contrapôs que a imensa maioria dos produtores rurais já está cadastrada. "Esse relatório atende a um setor minoritário e mais atrasado do agronegócio. Temos aqui uma minoria dos grandes proprietários que não quer respeitar a lei e pode comprometer toda a agricultura brasileira", rebateu. De acordo com o Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar), os 5,8 milhões de imóveis rurais do país já foram cadastrados.

O relator também repetiu o argumento de que a legislação não explicitava a proteção do Cerrado, do Pampa, do Pantal e da Caatinga antes dos marcos temporais propostos por ele. Para os deputados ambientalistas, no entanto, várias leis já especificavam, antes disso, restrições ao corte da vegetação nesses biomas.

O que é a Reserva Legal (RL)?

É a área do imóvel rural que tem de ser preservada para assegurar o uso econômico sustentável, conservar os processos ecológicos, a fauna e flora nativas. Varia de 20% a 80% do imóvel, dependendo do bioma. Na Mata Atlântica, Pampa, Pantanal, Cerrado e nos "campos gerais" na Amazônia Legal: 20%; Cerrado na Amazônia Legal: 35%; floresta na Amazônia Legal: 80%.

O que é o Cadastro Ambiental Rural (CAR)?

Instituído pela Lei 12.651/2012, o CAR é um um registro de todos os imóveis rurais no país, integrando as informações ambientais das propriedades em uma base de dados para viabilizar a regularização ambiental e garantir o controle e monitoramento do desmatamento. O cadastro é autodeclaratório e inclui dados sobre as áreas desmatadas, de Reserva Legal (RL), Preservação Permanente (APPs), Uso Consolidado, de Uso Restrito e as que devem ser reflorestadas.

O que são os Programas de Regularização Ambiental (PRAs)?

O PRA também foi criado pelo novo Código Florestal e prevê um conjunto de ações que todo produtor rural deve realizar para regularizar ambientalmente sua propriedade, como a recuperação de áreas desmatadas ilegalmente. Os programas devem ser regulados e administrados pelos Estados.

Medida Provisória 867/2018

Oswaldo Braga de Souza

ISA

https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/senado-decide-nao-votar-mp-e-mudancas-no-codigo-florestal-ficam-por-um-fio

 


Author`s name
Timothy Bancroft-Hinchey