Vivemos hoje no Brasil num mundo de fantasias, com velhos corruptos se indignando com a corrupção dos outros, justiceiros sedentos de sangue, meios de comunicação, que só sobrevivem extorquindo verbas do Estado, mas que defendem o chamado Estado Mínimo e a população das grandes cidades elegendo aqueles que vão ser seus algozes, como o Dória, o Crivella e o Júnior, para depois poder reclamar.
Ao contrário da Roma antiga, onde a população era engambelada com pão e circo, aqui só o que se oferece à população é um circo mambembe, com palhaços sem graça, equilibristas que não se arriscam na corda bamba e leões desdentados.
Seu ápice é a chamada Operação Lava Jato, sustentada diariamente por uma mídia comprometida, que assim não precisa fazer referência ao grande assalto que se faz das riquezas nacionais, com a absurda transferência do que poderia ser empregado em atividades produtivas, para o mercado financeiro, a entrega da Petrobrás ao capital internacional e a destruição das grandes empresas brasileiras (Odebrecht, OAS, etc), que mesmo corruptas na sua essência (como é aliás são todas as grandes empresas no mundo inteiro) gerava obras importantes (rodovias, ferrovias, hidrelétricas e até mesmo estádios de futebol) e oferecia milhares de empregos.
Primeiro o chamado Mensalão (nunca esquecendo que sua possível existência foi denunciada por um corrupto assumido, o deputado Roberto Jefferson) e agora o Lava Jato puseram em evidência, julgadores de todos os tipos, que sem qualquer apreço e respeito pelos direitos dos acusados, se arrogam o poder de passar por cima do que numa democracia seria a coisa mais importante: a vontade da população.
Começou com um golpe parlamentar coordenado por alguém que depois de cumprir esse triste papel, foi rapidamente descartado, o deputado Eduardo Cunha.
Foi afastada uma Presidenta, que mesmo com todos seus erros, exercia o poder legítimo que foi lhe conferido pela maioria da população e agora tentam afastar o único candidato que não interessa aos novos donos do poder que ganhe as eleições de 2.018.
Para isso, se recorre a uma hipocrisia sem limites, que vem desde o Mensalão, quando se inventou aquela aberração jurídica - o domínio do fato - (mesmo que não tenhas feito nada de errado, devias saber que alguém estava fazendo) e continua com a Lava Jato, com pessoas mantidas como reféns até admitirem cumprir o papel de Judas e de Calabar, o de traidores.
E para que, tudo isso?
Para revelar o que todo mundo já sabia.
Primeiro, que sempre houve "caixa 2" em todas as campanhas políticas, desde que começaram as eleições mais livres (?) depois que os militares voltaram para os seus quartéis.
Segundo, que o poder econômico sempre se relacionou com o poder político, os governos, os parlamentos, os tribunais, da única forma que sabe fazer: financiando os agentes públicos, oferecendo vantagens indevidas, corrompendo.
Obviamente, os acusados, são obrigados a fazer parte desse jogo, negando o que todo mundo sabe que existe.
Veja-se o caso das propinas na Petrobrás.
No seu depoimento em Curitiba, Lula foi claro ao explicar como funcionou o processo no seu governo: para governar, precisou que seu partido o PT, fizesse alianças ao centro e até mesmo à direita (é outra história, se precisava chegar a tanto) com alguns partidos extremamente fisiológicos (admitindo que nem todos sejam). Esses partidos indicavam os nomes para as diretorias da empresa (que obviamente usariam os cargos em busca de vantagens pessoais e partidárias) e eles apenas chancelava, já que não poderia fazer diferente.
Quem sabe, se o deixarem ser candidato em 2018, ele possa se livrar dessas alianças, embora seja uma grande dose de ingenuidade,imaginar que isso possa ocorrer dentro do sistema capitalista.
Toda a montagem midiática para a audiência do Lula em Curitiba buscava comprovar que ele seria o dono de um apartamento em Guarujá oferecido pela OAS.
Já que a proposição era provar a existência desse negócio, Lula aderiu ao jogo e foi mais uma vez brilhante em jogar de acordo com as regras propostas e ganhar a disputa.
Ninguém é ingênuo, nem o Moro ou muito menos o Lula, para não saber que na vida real, as coisas não ocorrem como nas práticas jurídicas.
É possível que a OAS tenha querido dar o tal triplex para o Lula. Qual a empresa que não gostaria de dar um grande presente a um presidente que pode tudo, ou quase tudo? É possível que Lula tenha pensado em aceitar (o que não seria ilegal, mas certamente anti- ético), mas não aceitou no final, ou - o que dá no mesmo - não existem provas que tenha aceitado.
Lula ganhou muito dinheiro das empreiteiras?
Possivelmente, sim, na medida em que foram elas que pagaram regiamente suas conferências no mundo inteiro.
O que ele disse sobre isso, faz sentido - era para defender uma empresa nacional na disputa com multinacionais - mas mesmo que não fosse por isso, não é nada ilegal. No mundo inteiro - Clinton, Fernando Henrique e outros - vivem de conferências que fazem depois que deixaram o governo.
Diante de toda essa pantomima, como se comportam os intelectuais de esquerda, que deveriam ser os mais esclarecidos, porque mais informados.
A ler o que escrevem nas redes sociais, mal.
Entram no jogo dos que comandam o espetáculo, que pautam as discussões e aí discutem se o Lava Jato teria algo de bom em sua origem, se o fim da contribuição sindical é correto ou se é preciso purificar o PT dos seus maus elementos.
Enquanto discutem isso, o rolo compressor montado pelo grande empresariado, o capital internacional e a mídia vão destruindo todas as conquistas sociais do povo brasileiro.
A esquerda - com as devidas exceções - não propõe outros temas - discute o que lhe é proposto pela mídia.
O face book, com o seu grande potencial de comunicação, serve para comprovar essa análise, ainda que não se preste à discussões mais profundas.
Essa rede social é dominada pelas superficialidades, mas não se precisaria chegar a tanto.
Jornalista, com firma reconhecida de esquerda, propõe comparar o apartamento de Fernando Henrique em Paris com o tríplex que a Lava Jato diz ser do Lula.
Ou seja, se o Lula é corrupto, o FHC também é.
Quem diz isso, por exemplo, é o jornalista Moisés Mendes, que depois que saiu de Zero Hora (onde sempre foi um jornalista bem comportado e se tinha algo contra a linha do jornal, só manifestava isso em entrelinhas) virou guru - a levar em conta como seus pequenos textos são curtidos e compartilhados - das pessoas de esquerda.
Em espaços quase idênticos, outro jornalista, que nunca deixou de manifestar suas posições de direita, o Prévidi, faz o mesmo defendendo posições opostas ao Mendes.
Você torce pelo Mendes ou pelo Prévidi?
Talvez no caso, o melhor seja ficar com o poeta Paulo Waimberg, outro campeão de audiência no Face Book, que destila sua ironia pelos seus comentários, que pretendem não ser de direita, nem de esquerda, porque o Paulo possivelmente acha que esses distinções não fazem mais sentido.
Enquanto isso, "la nave va", todo mundo se diverte e como disse a Presidente Dilma, com uma precisão inesperada, os "candidatos de auditório" (pensava no Luciano Hulck) vão tomando conta do campinho.
Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS